




Era impossível não vir lembrar Tolstoi, nesta data.
Tudo já foi dito sobre ele, não vou de certeza acrescentar nada. É apenas a minha homenagem de leitora a um escritor que me ajudou a crescer, que me fez bem e me acompanhou na vida.
Tudo já foi dito sobre ele, não vou de certeza acrescentar nada. É apenas a minha homenagem de leitora a um escritor que me ajudou a crescer, que me fez bem e me acompanhou na vida.

Foi com certeza o escritor que mais apreciei -e “Guerra e Paz”, o livro que mais amei. Basta ouvir este nome para, do nada, surgirem imagens, sentimentos, a beleza da natureza em todo o seu esplendor, a vida e a morte...
Muito cedo me deslumbrou. Era tão estranho descobrir um livro assim! As personagens pareciam ter vida, eu seguia-as como se as conhecesse, não as largava, ia atrás delas, perdida e encantada, durante tardes inteiras, procurando os cantos mais escondidos da casa para não me virem interromper.
Os Rostov, antes de mais. A loucura das brincadeiras dos filhos adolescentes, as corridas pelos salões, os risos, a inconsciência e a imprevidência deles eram para mim reais.
Muito cedo me deslumbrou. Era tão estranho descobrir um livro assim! As personagens pareciam ter vida, eu seguia-as como se as conhecesse, não as largava, ia atrás delas, perdida e encantada, durante tardes inteiras, procurando os cantos mais escondidos da casa para não me virem interromper.
Os Rostov, antes de mais. A loucura das brincadeiras dos filhos adolescentes, as corridas pelos salões, os risos, a inconsciência e a imprevidência deles eram para mim reais.
Chegava a rir-me deles. Ou com eles. Tínhamos a mesma idade, podiam ser amigos...
E, nesse décor, desponta a figura atrevida de Natasha, ainda criança, como uma estrela que conduz os outros, brilhante, irreverente e egoísta. E Sónia - a parente pobre- que a segue, rendida, sem lhe poder resistir.
Vem, a seguir, o príncipe André Bolkonski, taciturno, reservado fechado no seu mundo interior. E a jovem Lise, a primeira mulher, figura apagada, suavemente queixosa. O seu parto doloroso e o sofrimento inútil.
Vem, a seguir, o príncipe André Bolkonski, taciturno, reservado fechado no seu mundo interior. E a jovem Lise, a primeira mulher, figura apagada, suavemente queixosa. O seu parto doloroso e o sofrimento inútil.
A princesa Maria Bolkonskaya e o velho príncipe Bolkonski tão severos, recatados -tão diferentes daqueles “loucos” da família Rostov- e a generosidade de Maria e a sua dedicação ao pai.
Mais tarde, é a bondade de Pedro Bezukhov e a ingenuidade e credulidade que me enternecem. Pedro, quase a antítese de André, é expansivo, comunicativo, mas tímido. Interessa-se por tudo o que o rodeia, mas de modo quase infantil, desajeitado, infeliz.
Assim de repente, é o que recordo dessa primeira leitura. Sei que “saltei” praticamente toda a “guerra”...
Anos depois, senti a necessidade de ler o livro. Desta vez a sério. E, mais tarde ainda, voltei a lê-lo.
Anos depois, senti a necessidade de ler o livro. Desta vez a sério. E, mais tarde ainda, voltei a lê-lo.
E penso ainda voltar a ler esse maravilhoso livro!
Achei engraçado ler no último “Magazine Littéraire” (que lhe dedica um “dossier” de várias páginas) o que escreve a filósofa Catherine Clément quando afirma “sentir necessidade de ler esse romance todos os anos”.
Talvez seja um exagero, mas posso compreender tão bem o que ela diz...
O que se descobre na “releitura” da obra é tão importante! Pequenas coisas, aparentemente insignificantes, ganham outro sentido lendo-as sob outras perspectivas, ou outra idade, enriquecem a nossa procura, ajudam-nos nas nossas dúvidas. Enriquecem-nos.
Clément acrescenta ainda: “é um livro “terapêutico”, que faz bem, dá vida, dá força aos que perderam a alma.”
Talvez seja um exagero, mas posso compreender tão bem o que ela diz...
O que se descobre na “releitura” da obra é tão importante! Pequenas coisas, aparentemente insignificantes, ganham outro sentido lendo-as sob outras perspectivas, ou outra idade, enriquecem a nossa procura, ajudam-nos nas nossas dúvidas. Enriquecem-nos.
Clément acrescenta ainda: “é um livro “terapêutico”, que faz bem, dá vida, dá força aos que perderam a alma.”
Mais adiante: “(...) ninguém falou tão bem da alternância entre a alegria de viver e a angústia, ninguém falou tão bem do medo da morte, tão difícil de descrever.”
Cito estas opiniões porque me sinto de acordo com elas e não saberia expressá-las melhor.
o general Kutuzov, no campo de batalha de Borodin, onde ficam caídos tantos jovens russos...
Da segunda leitura –ou talvez da terceira- foi a guerra que me atraiu pelas descrições maravilhosas; pela figura do grande general Kutuzov, na batalha de Borodine, contra Napoleão; pelo sofrimento “verdadeiro” dos soldados, “carne para canhão”, que hoje continuam a sê-lo.
Tão evidente e presente no nosso quotidiano: as cenas de violência, de guerras sangrentas, de tumultos, de catástrofes perseguem-nos, tornaram-se lugares-comuns, em imagens cada vez mais delirantes e chocantes. Cada vez menos “sentidas” por quem as vê. Numa certa forma de indiferença...

uma imagem da 1ª edição de "Guerra e Paz", em russoCito estas opiniões porque me sinto de acordo com elas e não saberia expressá-las melhor.

Da segunda leitura –ou talvez da terceira- foi a guerra que me atraiu pelas descrições maravilhosas; pela figura do grande general Kutuzov, na batalha de Borodine, contra Napoleão; pelo sofrimento “verdadeiro” dos soldados, “carne para canhão”, que hoje continuam a sê-lo.
Tão evidente e presente no nosso quotidiano: as cenas de violência, de guerras sangrentas, de tumultos, de catástrofes perseguem-nos, tornaram-se lugares-comuns, em imagens cada vez mais delirantes e chocantes. Cada vez menos “sentidas” por quem as vê. Numa certa forma de indiferença...

Lembro o príncipe André Bolkonski, ferido na batalha, o que ele pensa (“amo a vida!”-Ia ljublio gizna ) e o que vê no céu acima dele. "tão sereno", como dizia Camões...
Indiferente.
Indiferente.
Há ainda a “figura” do célebre castanheiro que acompanha a vida dos personagens e que o autor descreve, nas diversas estações, e vai seguindo, observador silencioso, o desenrolar do romance, entre a alegria de viver e a angústia e a morte...
De tal modo Tolstoi marcou o seu tempo que o escritor russo Ivan Tourgueniev (*) lhe vai escrever, no leito de morte:
“Sinto-me feliz por ter sido seu contemporâneo, porque o senhor é o maior escritor da terra russa.”
De tal modo Tolstoi marcou o seu tempo que o escritor russo Ivan Tourgueniev (*) lhe vai escrever, no leito de morte:
“Sinto-me feliz por ter sido seu contemporâneo, porque o senhor é o maior escritor da terra russa.”
Thekhov e Gorki, Bunin, admiram-no e visitam-no, no retiro de Iasnaya Polyana.

Ao longo da vida, Tolstoi procurara um sentido para a vida. Tentara “compreender e formular a aspiração ao bem e à perfeição, dignificando a sua vida. É essa a atitude de alguns dos seus personagens: o pequeno Nicolenka, de “Infância”, ou Pedro Bezukhov, André Bolkonski: foi essa igualmente a sua aspiração.

Nos últimos anos, parece ter encontrado uma solução. Na procura de um ideal de não-violência, de justiça social...
Corresponde-se com Gandhi que o procura e o respeita. Vai ser o "seu mentor" - e o de outros "pacifistas", como Luther King que o seguiram na sua forma de "resistência" pacífica.
“Guerra e Paz” é com certeza a sua obra-prima. É um fresco que se estende por várias décadas de vida de algumas famílias da aristocracia russa. Iniciada a sua escrita em 1864, é publicada em 1869.
Nos últimos anos, procura seguir um ideal de não-violência, de justiça social, que procura aplicar nas suas terras.
Há, ainda, a reacção do grande escritor francês, Flaubert, que, ao ler “Guerra e Paz”, não resiste e vai exclamando:
Nos últimos anos, procura seguir um ideal de não-violência, de justiça social, que procura aplicar nas suas terras.
Há, ainda, a reacção do grande escritor francês, Flaubert, que, ao ler “Guerra e Paz”, não resiste e vai exclamando:
“Esta é de primeira ordem! Que pintor e que psicólogo!”
Creio que é o alternar entre o pintor e o psicólogo que marcam a sua diferença e grandeza ...
Quando Leão Tolstoi morre, no Outono de 1910 de há cem anos, o seu enterro atrai uma multidão, que chora e se lamenta, e entra pela propriedade do escritor, em Iasnaya Polyana, para lhe prestar uma homenagem. Não ao escritor, que desconheciam, mas à pessoa que ele foi.
Que merece ser homenageada, com certeza, mas muito mais o escritor que foi!
(*) Ivan Tourgueniev, romancista russo, autor de "Primeiro Amor" (de que existe uma tradução portuguesa); "Pais e Filhos"; "Histórias Moscovitas".
Grande amigo de Flaubert e Georges Sand, passa grandes temporadas em casa dela, ou de Flaubert, vivendo a maior parte do tempo em Paris.
NOTA:
Vai sair em breve o filme realizado (dia 24 de Novembro) por Michael Hoffman, “O último Outono”, sobre os últimos dias de Tolstoi. É uma co-produção internacional onde participa a actriz inglesa Helen Mirren e Christopher Plummer.
Outras obras de Leão Tolstoi, em português:
"Anna Karénina"
Muitos outros títulos de obras de Tolstoi -e as lindíssimas capas dos livros da Editorial Inquérito- podem ir vê-las neste site da "Livraria Lumière" onde tudo se encontra, com paciência: http://livrarialumiere.blogspot.com/ e com certeza se poderá comprar!
Só que é no Porto. Mas podem encomendar! Foi no Catálogo da livraria online que encontrei e "roubei" esta bela capa de outra "Ana Karenine", o livro por onde a li e que perdi com o passar dos tempos...
Ora vejam se não era bonita:

A nova edição, de "Anna Karénina", 2009, da Qetzal

"Guerra e Paz", 2005, editora Presença


"Sonata a Kreutzer"

No Brasil, há várias traduções, além da de Guerra e Paz que referi acima.
"A Morte de Ivan Ilitch", por exemplo.
Nota sobre as traduções em língua portuguesa:

"Em português, entre o Brasil e Portugal, temos Nina Guerra e Filipe Guerra, Boris Schnaiderman no Brasil, todos traduzindo directamente do russo; Gustavo Nonnenberg (via versão francesa), Oscar Mendes e João Gaspar Simões, esta última agora reeditada em 4 volumes." (in blog: "talqualmente")
O seu post prima pela excelência entre a imagem e o texto.
ResponderEliminarObrigada pela sua visita e simpatia.
Um beijo.
Um Homem que escreveu sobre a Guerra, lutande pela Paz.
ResponderEliminarUm homem que lutou contra o preconceito escrevendo sobre o amor.
Um homem que defendeu a vida escrevedo sobre a morte.
Um HOMEM... Lev Tolstoi. Grande. Incomparável.
thank you for comments i ilke your blog also.
ResponderEliminarMy post was YEATS not Keats.
xx