Encontrei
no jornal Le Monde de 23 de Junho uma notícia sobre o “desaparecimento” de
Agustina Bessa Luís.
Gladys
Marivat, colaboradora do jornal – que escreve no suplemento “Monde des
Livres”- assinava o artigo intitulado
“Agustina Bessa-Luis, écrivaine portugaise”, uma homenagem verdadeira à nossa escritora.
E
começa assim:
“Era
uma imensa romancista, distinguida em 2004 pelo prestigioso Prémio Camões de
língua portuguesa. A vida de Agustina Bessa-Luis, quase praticamente consagrada
à escrita desde os seus começos em 1948, acabou no dia 3 de Junho, no Porto.
A
sua morte com 96 anos suscitou uma vaga de emoção no seu país, se bem que ela
se encontrasse afastada da vida pública desde a aparição da sua Autobiografia,
em 2002 (O Livro de Agustina, ainda não traduzido para francês).
Mais
adiante:
“Em
Paris, a sua editora Anne-Marie Métailié recorda uma 'mulher divertida, irónica, cáustica. (...) Era um privilégio excepcional poder editar Agustina Bessa-Luis.'
Admiradora
de Sthendal e da vida e obra do escritor português Camilo Castelo Branco
(1825-1890), em quem se inspirou para o seu livro “Fanny Owen” (Actes Sud,
1988), comparada a James e a Balzac, Agustina Bessa-Luis nunca parou de perscrutar
a sociedade portuguesa, as suas crenças, a sua história e as suas mutações, em
cerca de cinquenta romances, assim como livros para a juventude, biografias,
peças de teatro, crónicas e novelas das quais apenas uma pequena parte foi
traduzida em francês.”
Gladys
Marivat considera-a uma escritora inclassificável, impossível de incluir num qualquer
grupo de escritores. Ela escapa a uma classificação normal, de facto.
“Os
seus aforismos, as intervenções na narrativa, o estilo clássico e moderno
conferem à escrita de Agustina
Bessa-Luis um carácter singular, radicalmente inclassificável. Um exemplo, na “Ronda
da noite” (Métailié, 2008):
“Como Proust,
Martinho Dias Nabasco tinha crescido entre duas mulheres que o amavam; com um
amor sujeito às mudanças, é certo, como todas as coisas da vida”.
E refere que, em
1988, Agustina confiara a Patrick Kéchichian, jornalista do “Monde dês livres”, durante
um encontro em sua casa, no Porto:
“Já
não existem obras em que haja esta qualidade aforística, esta frase que cria o
prestígio de um escritor... Não encontramos já essa vontade de fazer a
definição total de um sentimento, de uma experiência”.
E o jornalista partira com a impressão de ter encontrado uma romancista que “cultiva tranquilamente o paradoxo”(...)”entre
conservadorismo e não conformismo.”
Depois, descreve a biografia da escritora desaparecida:
"Nascida
em 15 de Outubro de 1922, numa família burguesa do Norte de Portugal
enriquecida no Brasil, com origens espanholas pelo lado de sua mãe, Agustina
Bessa-Luis cultiva muito cedo a paixão dos livros na biblioteca do avô.
Vai
estudar para o Porto em 1932 depois, em 1945, instala-se com o marido Alberto
Luís em Coimbra, pulmão universitário do país.
A
jovem mulher tinha já ganho um concurso literário com 20 anos, com o nome de
Alberto Luís, que escreverá à máquina todos os livros da mulher. Mas só em 1948
vai publicar, sob a sua verdadeira
identidade, a recolha de novelas “Mundo Fechado”.
A obra-prima que a faz ter sucesso:
"O
sucesso chega em 1954 com o romance “A Sibila”, considerado como a sua
obra-prima. “La Sybille” (Gallimard, 1982) relata o destino de uma dessas “estranhas
mulheres” que Bessa-Luis tanto amava: Quina, pobre camponesa hábil e lúcida, é
depressa admirada pela alta sociedade que a recebe no seu seio.
Paralelamente
à escrita, Agustina Bessa-Luis dirigiu um jornal no Porto e, depois, o Teatro Nacional
Dona Maria II, em Lisboa.
A
escritora constrói a sua vida num companheirismo artístico com o realizador Manoel
de Oliveira, estando na origem de oito filmes do realizador português,
desaparecido em 2015.
E outros dos seus textos serão adaptados por Oliveira que não hesita em pedir-lhe que escreva uma nova versão de “Madame Bovary”: vai ser o filme “Vale Abraão” que ele leva ao cinema em 1993.
Há
alguns anos que Agustina Bessa-Luis não publicava nada. O tempo nos dirá se ela
teria continuado a escrever, ela que confiava no incipit do “Princípio da Incerteza”:
“Escrever
a propósito do que há de mais profundo num sentimento, sem ter em conta o tempo
que passou nem os costumes que mudaram, sempre me fascinou.”
GLADYS
MARIVAT (COLLABORATRICE
DU“MONDE
DES LIVRES")
Ainda não li nada dela, que livro deveria escolher para começar a conhecer a sua obra?
ResponderEliminarGábi, eu começaria pela 'Fanny Owen' (a partir de uma história verdadeira, de Camilo Castelo Branco). No entanto, eu gostei muito da 'A Sibila' (um dos primeiros),e 'Os Incuráveis'. Depois confesso que também tenho poucas leituras dela - ela escreveu um "mar de livros"!beijinhos
ResponderEliminarNos últimos anos comprei vários livros dela, mas ainda não li. Tenho muita vontade de ler alguns.
ResponderEliminarGostei muito do post!
Beijinhos e bom fim-de-semana:))
Por muito que tudo mude, uma obra prima com séculos de existência nunca ficará antiquada, sempre haverá muito em comum na condição humana de todos os tempos. Esperemos!
ResponderEliminarEssa viagem às Américas que perto está já!!!Que seja um mes estupendo, beijos grandes.
Como gostei de saber!!
ResponderEliminarUma escritora única - mesmo que não se tenha gostado de algumas das suas foras de ser e de estar...