sábado, 17 de dezembro de 2016

Carnet de viagem a Trieste - III


E a viagem continua, para Trieste. Voltar a Trieste e ao deslumbramento de outras vezes?
"O comboio vai velocíssimo, as paisagens deslizam, como posso fixar as imagens?
As fotografias apareciam-me confusas quando as via, acabadas de tirar. Pouco me importava, o que eu queria era fixar o momento, a passagem. Ora essa é infixável.

De tal modo isso é verdade que elas se volatilizaram bem depressa Duraram o tempo de as enviar para os amigos, de pôr algumas no meu blog. Mas, no momento exacto em que quis fixá-las ‘para sempre’ no computador, elas eclipsaram-se. 
Sono volate via, svanite nel nulla.” Por isso este meu post não vai ter as imagens que esperava pôr.
O comboio corre na  tarde...
Monfalcone - a minha cidade de adopção- ficou para trás também. "Com o seu estaleiro e as suas indústrias. E as belas arcadas da estação! Mais atrás, ainda, ficara Veneza e a laguna e as muitas ilhas por ela esparsas. Deixámos o Golfo de Veneza, a terraferma de Mestre, Jesollo e outras cidades do Comune di Venezia."
Veneza, visão

'Terraferma' é o nome dado ao território não-lagunar administrado pela Câmara de Veneza.
Para essa terraferma foram viver dezenas de milhares de venezianos a fugir dos turistas e dos preços excessivos das casas e de tudo, na cidade lagunar.

Portogruaro (net)
Devagar, começamos a aproximar-nos do Golfo de Trieste. Passara a estação de Porto Gruaro-Caorle com as belas as praias de Caorle, de que fala o guia.  
Porto Gruaro-Caorle (net)
Vamos em direcção a Cervignano Aquileia Grado, onde na bifurcação do Bivio d'Aurison podíamos seguir por outra linha para Viena! Mas o nosso destino é outro claro.

estação Bivio d'Aurison (net)

 Leio no meu caderno:
"Pelo caminho, mais terras, frias e cinzentas. Um ar muito diferente de Veneza. O azul do céu esbate-se, as imagens de água desapareceram. Aproximamo-nos do Norte e nota-se."
Alpes (net)

No guia de Trieste, leio, a propósito das entradas na cidade: 

“A ferrovia Venezia-Trieste é uma linha principal do nordeste italiano que corre, em grande parte, paralela ao golfo de Veneza. Sai do Veneto e termina no Friuli-Veneza Giulia, em Trieste. Muitos anos antes, o governo austro-húngaro dera precedência à linha que partisse de Viena para Trieste e Veneza”.

Para trás, ficou a planície veneto-friulana que vai até Monfalcone. Continuamos na linha que é comum à ferrovia Udine-Trieste até passarmos no Bivio D’ Aurisina.

Dirigimo-nos para para leste, pois, sempre paralelos ao Carso, e a linha do comboio sobe pela montanha da zona triestina. A cadeia dos Alpes Giulia? Vem-me à memória Slataper e "Il mio Carso". Scipio Slataper tão cedo desaparecido na Iª Guerra. 


E associo-lhe o nome de outro jovem escritor triestino, Carlo Stuparich, igualmente morto nessa Guerra (1916), cujo centenário passou agora e tantas vidas jovens ceifou.

O "Carso" -para mim montanha misteriosa (pois o tão esperado little train para Opicina continua parado!) - tem sempre um pouco do que ele escreveu. É uma imagem 'poética', de locais e de gentes imaginárias que não se concretiza nunca no tempo. E se sonha apenas.
Neste momento, as malas de rodinhas, que não colocámos nas redes porque não podíamos com o peso que tinham, escorregam para o outro lado da carruagem, na subida do comboio. 
Levanto-me para as ir buscar, uma a uma. Agora o comboio  desce e lá vão as malas em sentido inverso, numa correria doida a descer também. As malas parecem estar numa montanha russa de brincadeira. Rio-me. O que hei-de fazer? Prendo-as no meio das poltronas azuis, entaladas nos lugares onde não vai ninguém.
"Perco-me nos mapas. Quero perceber onde estou, por onde vou. No meio de árvores altas que agora aparecem do lado do mar. Porque o Adriático anda por ali e porque o Golfo de Trieste vai aparecer dum momento para o outro".
Lá está ele, em baixo, brilhando nas cores do sol da tarde. Florestas de pinheiros, de abetos e, sempre, de repente o vermelho de algum ácer, um plátano do norte. 
O Castelo de Duíno imponente que - de tão em baixo- mal se vê, e, mais adiante, o branco Castelo de Miramar que dizem estar enfeitiçado, e onde vivem os 'fantasmas' dos que lá viveram ou morreram tragicamente, ali ou noutros lugares.
Mais uma descida, agora suave, e pouco a pouco vêem-se os contornos da cidade desenhados na curva do golfo.


Sim, Trieste. E o aproximar da estação, velhos prédios que parecem enormes fábricas abandonadas. Distraio-me um momento e... chegámos à Estação Central!  
Um táxi, rápido, e daqui a pouco estaremos na via Armando Diaz, na  "Liberty"!

3 comentários:

  1. É tão interessante a sua escrita, que as fotos perdidas nem fazem falta!
    Gostei muito da leitura e das fotos que restaram:)
    Beijinhos e bom domingo:)

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  2. São memórias muito queridas e inesquecíveis.
    É muito interessante eu aprender um pouco sobre essa interessante zona do mar Adriático e sobre a impressionante
    história da cidade de Trieste.
    ~~~ Beijinhos gratos, MJ ~~~

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