segunda-feira, 3 de abril de 2017

FALANDO DO INESQUECÍVEL INSPECTOR MORSE…

No passado dia 21 de Março, morreu o escritor policial Colin Dexter (*) e apeteceu-me falar dos livros que nunca li, confesso, e sobretudo do protagonista deles: o Inspector Morse. De facto, a partir dos livros de Dexter, a BBC criou, nas décadas de 80 e 90, a série televisiva intitulada “Morse”.

O actor que personifica o Chief Inspector Morse, do CID  de Oxford, é bem  mais conhecido do que o seu criador!
John Thaw, Kevin Whately e Colin Dexter

Trata-se de John Thaw. Penso que muita gente (como eu) terá esquecido este nome, apesar de ser, graças a ele, que a série é hoje lembrada (e amada) nos écrans da televisão. Foi, de facto, a personagem a que ele deu vida que me fascinou. E essa personagem existiu porque ele a fez ‘existir’!
Acontece isso quando grandes actores desempenham papéis que se lhes ‘colam’ à pele.


Lembro-me de outro actor com quem aconteceu algo semelhante: Jeremy Bretts, o extraordinário Sherlock Holmes (1933-1995) de outra série da Granada TV, entre 1984 e 1994. 
Contava o seu parceiro, o actor Edward Hardwicke (1932-2011) que era o Doutor Watson, quando Jeremy Bretts morreu, que ele chegava a ter pesadelos ligados à personagem. Sherlock era, para Bretts, ‘o inominável’. Quase a medo, referia-se a Holmes como "aquele que nós sabemos" ou apenas "Ele".



Morse, segundo alguns críticos, é uma personagem que, “em muitos aspectos tem algo de Sherlock Holmes, com um espírito orgulhoso e penetrante e, ao mesmo tempo, um feitio tranquilo. Ambos saem do 'écran' como pessoas vivas, com as quais podemos imaginar ir tomar um copo num 'pub'.

Quem era John Thaw? Um grande actor britânico! John Edward Thaw nasceu em 3 de Janeiro de 1942 e morreu em 21 de Fevereiro de 2002, com um cancro do esófago. 

Nascido em Manchester, na cinzenta e pobre Manchester, numa família de trabalhadores, com algumas dificuldades económicas, frequentou, a partir dos 16 anos, a Royal Academy of Dramatic Arts, em Londres. Depois de terminar, representou um pouco de tudo –e Shakespeare, evidentemente.

Actor de teatro e de cinema, entrou no filme “The loneliness of the long distance runner”, de Tony Richardson (1962), com Tom Courtney-de quem foi colega na Academia- no papel principal. E contracenou com Laurence Olivier, no filme “Semidetached” (1962). 

Nos anos 60, entrou num dos primeiros episódios da série ‘Os Vingadores’. Participou noutras séries da BBC como “Redcap” (1964-66), “Flying Squad” e “The Sweeney” (1975-78).

Era um dos actores preferidos de Sir Richard Attenborough e foi um dos actores do filme “Cry Freedom” (1987), com Denzel Washington.


Nos anos 70 e 80 trabalhou na Royal Shakespeare Company e no Royal National Theatre. Foi toda a vida um apoiante do Labour Party.

Em 1993, recebeu da Rainha Isabel II a medalha “Most Excellent Order of British Empire”.
Em 2006, ficou no 3º lugar da lista dos '50 melhores actores britânicos dos últimos 50'. Mas é com certeza a série “Morse” que o distingue e individualiza como “pessoa”.
O seu criador, Colin Dexter (1930-2017) foi professor em Oxford, e trabalhou sempre no campo da educação. Reformou-se cedo, em 1972,  por graves problemas de surdez. 
Num dia chuvoso, em férias no País de Gales, está a ler um livro policial e acha-o tão insípido que decide escrever ele um livro do género. Pensa: “Acho que posso fazer melhor!”
Em 1975, sai o livro “O último autocarro para Woodstock”, com a personagem do Inspector Morse e Dexter ficou conhecido pelo seu Inspector Morse, da Thames Valley Police, condado de Oxfordshire.
O sucesso vem logo e os livros sucedem-se uns aos outros: o Chief Inspector Morse, o Detective Sargeant Lewis, o Chief Superintendent Strange e a médica legista, Doctor  Russel - e outros  que vão entrando e saindo da história- prendem os leitores.
Depois do sucesso que teve a série “Morse”, escreve o guião para “Lewis” (2006-2015); em 2102, cria a personagem do jovem Morse, na série “Endeavour”. Morse  chamava-se de facto Endeavour Morse. Mas como sempre escondeu o seu ‘nome cristão’, que detestava, era chamado, pelos colegas de Oxford, “o Pagão”.
Colin Dexter teve a coragem de escolher um ‘herói’, sem fazer qualquer concessão ao que se considerava o ‘herói’: jovem, belo, agradável. Morse, pelo contrário, não era muito novo, tinha mau feitio, era resmungão, “esotérico e abstruso”. Estudante de Oxford, abandona os estudos no terceiro ano e, depois de dúvidas e hesitações, entra para a Polícia.
Morse que “nunca tinha tempo para relatórios”,  “era único” - segundo dizem os críticos ingleses - “quer nas páginas dos livros, quer na incarnação da personagem nas adaptações para televisão.”


Inesquecível com as suas manias, a cerveja Bentley Maw, o seu velho Jaguar vermelho, as ‘palavras-cruzadas’ de que é mestre, e a sua cultura literária e musical. 

Grande apreciador de música clássica e muito especialmente de ópera e, sobretudo, Wagner, é por vezes sarcástico, aparentemente frio com os que o rodeiam, egocêntrico e desprendido.
É, porém, uma alma sensível que se esconde e que vive solitário depois de uma história amorosa com uma certa Wendy - que de vez em quando é referida pelos antigos colegas - e é um sentimental. Por vezes, encanta-se  com mulheres interessantes que o deixam e seguem outros caminhos. E Morse fica sozinho, com a sua cerveja. Muitas vezes, é o sargento Lewis que o não sabe – ou não pode- acompanhar.

Quando Morse o convida para uma ida ao 'pub', Lewis que, aliás, só bebe sumo de laranja, diz que tem de ir para casa.  Está lá a mulher e os filhos... "You know?" é uma das suas frases preferidas quando não se sente à vontade com um assunto.

Morse invariavelmente pergunta: “Vai fazer de baby-sitter outra vez?" E Lewis, laconicamente, responde: "Ya." 
Morse vai para casa, liga o seu pick-up especial, põe um long play,  e adormece no sofá, com um copo de whisky ao lado. De manhã acorda rabugento, vai trabalhar e implica com o sargento Lewis. Lewis às vezes amua. 

Mas adora o chefe. Quando lhe perguntam se o chefe é bom, responde convencido: "É o melhor de todos!" 
Quando, em 1999, Dexter decide acabar com a vida do seu herói, os leitores e o público manifestam-se com enorme desagrado. 
Recebe milhares de cartas de protesto: “Como pôde fazer isto”? “Não tem vergonha?” “Que crueldade!” ou: “Que tristeza!”
Talvez por isso, Dexter tenha recomeçado a escrever agora com a personagem de Lewis – o actor Kevin Whately - que subira de grau e era Inspector. 



Mais tarde ainda, escreve sobre a juventude de Morse, Endeavour – com o actor Shaun Evan- e os seus começos na Polícia Criminal de Oxford…


Morse-John Thaw- morre, realmente, em 2002, na sua casa de campo,  em Luckington, pouco tempo depois de ter assinado um novo contrato para a TV. Tinha 60 anos. 
Luckington

St. Martin-in- the-Fields

Foi cremado e, meses mais tarde, em Setembro, realizou-se uma cerimónia fúnebre na Igreja St Martin-in- the-Fields, perto de Trafalgar Square

Mais de 800 pessoas estão presentes nessa cerimónia, entre elas o Príncipe Carlos, o realizador Richard Attenborough, o amigo Tom Courtenay e, entre muitas outras figuras, a mulher de Tony Blair, então Primeiro Ministro. Para além dos anónimos admiradores de John Thaw...
 (*) O escritor Colin Dexter recebeu vários prémios pelos serviços prestados à literatura.
Em 2000, a medalha de mérito (OBE). Em 2001, o prémio de Liberdade da Cidade de Oxford – cidade onde se passam todos os episódios de Morse. Recebe também o Diamond Dagger – “Adaga de diamante”, a recompensa mais notória para um autor de livros policiais.

4 comentários:

  1. gosto desse "universo" das séries policiais britânicas
    uma boa dose de decadentismo, algum cinismo e ... excelentes interpretações.

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  2. Gosto muito das três séries, Morse, Lewis e Endeavour.
    Ainda não um livro do escritor.

    um beijinho

    Gábi

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  3. E ontem começou na FoxCrime uma nova temporada de Endeavour.

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  4. Ao tempo que ando afastada de policiais...
    Dias felizes.~
    Beijinhos.
    ~~~~~

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