José Régio teria hoje - impossível, claro - 117 anos...
Nasceu
em Vila do Conde em 17 de Setembro de 1901 e em Vila do Conde morreu em 22 de
Dezembro de 1969, em consequência de um enfarto.
Em Portalegre viveu e ali o encontrei. Foi meu professor e amigo e conhecê-lo “marcou-me”, indicou-me os “marcos” de que falou na “Carta a um Juvenil Individualista” que assinalam a nossa passagem pela vida, o fazer isto e não aquilo, o escolher do modo que é o nosso e que é, para nós, o justo, o bem, o belo da vida...
Dele aprendi que a Literatura deve "espelhar" a verdade de cada um, a ingenuidade criadora, original porque "sua". Deve ser Literatura Viva, como escreveu no 1º número da Revista 'presença' (10 de Março de 1927).
Em Portalegre viveu e ali o encontrei. Foi meu professor e amigo e conhecê-lo “marcou-me”, indicou-me os “marcos” de que falou na “Carta a um Juvenil Individualista” que assinalam a nossa passagem pela vida, o fazer isto e não aquilo, o escolher do modo que é o nosso e que é, para nós, o justo, o bem, o belo da vida...
Dele aprendi que a Literatura deve "espelhar" a verdade de cada um, a ingenuidade criadora, original porque "sua". Deve ser Literatura Viva, como escreveu no 1º número da Revista 'presença' (10 de Março de 1927).
“Quando
leio José Régio, sinto uma comoção especial. No ritmo e na força dos seus versos, parece-me ouvir, na lonjura da memória, a voz pausada e nítida.
Posso
imaginá-lo a passear na sala de aula, para trás e para diante, enquanto nos
ditava uma retroversão para francês, cheia de construções difíceis. Conheço
alunos que tiveram medo dele, que o achavam impertinente, superior, altivo, no
contacto. Não foi essa a minha impressão nunca.
José
Régio ‘viveu’ muito próximo de mim, não fisicamente porque a rua dos
Canastreiros ficava longe da Boavista, mas ele não era apenas o meu professor
do liceu, o Dr. Reis Pereira: era o amigo do meu pai desde há longos anos.
Portalegre
E
eu “cruzava-me” com ele não só nas aulas, ou nas imediações do liceu, mas
também nos cafés, nas esplanadas de Verão, nos “saraus” musicais que havia em nossa
casa, nos sábados, para ouvir música clássica.”
Capa de Júlio, "Poemas de Deus e do Diabo"
Os seus versos de "Poemas de Deus e do Diabo"- que releio sempre com a mesma angústia- trazem-me aos olhos os seus "Cristos exangues", de "carne humana" e a Dor do "Homem que mais perto esteve de Deus" - como dizia - e quase me fazem sofrer.
Sandro Botticelli, "Cristo Morto"
O seu Cristo da "Quinta Feira Santa", um dos poemas que mais amo, O Cristo triste, humilhado e ausente, a caminho do fim, abandonado, dá-me sempre vontade de chorar.
"Mas o que eu amo em ti, Cristo exangue,
É o que em ti é Dor, e assim a nós te irmana:
Teu sonho louco, o teu suor de sangue,
E a tua carne humana."
("Poemas de Deus e do Diabo" poema intitulado "Quinta Feira Santa", p.49)
E penso: o que terá sofrido o meu Amigo na sua solidão procurada?Tanto querer, tanta inquietação e tanta insatisfação! Ele o escreve: "Sou um desejo/que não tem satisfação."
O Cristo da Paixão, um desenho de Régio
Escolho, ao caso, alguns versos desse seu primeiro livro. Este desenho a lápis de José Régio foi feito, numa das primeiras páginas em branco, do exemplar que ofereceu ao meu pai, em 1950.
***
"...Quem me não deixa ser eu?
«Viver
«É, para mim, duvidar,
«Desvairar,
«Interrogar,
«Procurar-me,
«Torturar-me,
«Agarrar fumo nas mãos,
«E acenar a uns irmãos
«Que eu sinto por perto, e não vejo
«Por causa da multidão..."
(poema intitulado "Na Praça Pública", "Poemas de Deus e do Diabo", 1ª edição, página 72)
***
III
"Terra do chão, tapa-me a boca!
- Terra do chão que eu piso aos pés...
Areias do deserto,
Areias que subis no ar turbilhonando,
Cegai-me!
Prostrai-me,
Ventos que ides passando assobiando...
Ondas do mar que desabais
(Ah! o mar...)
Levai-me!
Estou fartinho de lutar,
Não posso dar mais."
***
"Menino doido, olhei em roda, e vi-me
Fechado e só na grande sala escura.
(Abrir a porta, além de ser um crime,
Era impossível para a minha altura).
Como passar o tempo? E eu diverti-me
Pegando em mim, rasguei-me, abri, parti-me,
Desfiz trapos, arames, serradura...
Ah! meu menino histérico e precoce!
Tu, sim, que tens mãos trágicas de posse,
E tens a inquietação da descoberta!
O menino, por fim, tomba cansado,
O seu boneco aí jaz esfarelado,
E eu acho, nem sei como, a porta aberta!"
(ibidem, "Libertação", p. 75)
Marc Chagall, Le jongleur
Muito bem, adorei este post e a recordação de alguém que realmente vale. Obrigado.
ResponderEliminarMais um grande post e uma boa leitura:))
ResponderEliminarBeijinhos e uma boa semana:))
José Régio teve a força dos grandes pensadores ao expor as suas dúvidas e as incongruências da vida e da fé dos homens.
ResponderEliminarAntero de Quental era muito frontal e adoeceu.
Fernando Pessoa escondeu-se na personagem de Bernardo Soares, para escrever o Livro do Desassossego (o que prova que tinha intenções de publicar a sua obra).
Gosto do modo como fala do seu Amigo
Uma semana muito agradável e serena.
Beijinhos.
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