Chester
Bomar Himes nasce em Jefferson City, no Misssouri, em 1909 (29 de Julho) filho de um
pai negro e de uma mãe negra mas de pele clara. Netos de escravos. Os pais eram professores. O pai considerava-se um ‘peripatético’ (nómada,
viajante sem destino). Lembro-me de ouvir falar de Aristóteles como filósofo 'peripatético' - isso referia-se à sua mania de 'filosofar, andando sempre...
A mãe tivera estudos e ensinava no Scotia Seminary, escola criada depois da Guerra Civil para as jovens negras terem a possibilidade de aceder a outra coisa que não fosse a velha ‘profissão’ de criadas domésticas ou trabalhadoras da terra, na colheita do algodão, como os escravos de outra era.
Segundo a jornalista de Le Monde (7-8 de Agosto), Stéphanie Le Bars, num bom artigo intitulado “Himes, plume de bagnard”, o escritor poderia até nem ter imaginação nenhuma, porque a sua vida desorientada e a sua raiva bastariam para compor a sua obra.
tenda de nómadas
A mãe tivera estudos e ensinava no Scotia Seminary, escola criada depois da Guerra Civil para as jovens negras terem a possibilidade de aceder a outra coisa que não fosse a velha ‘profissão’ de criadas domésticas ou trabalhadoras da terra, na colheita do algodão, como os escravos de outra era.
Scotia Seminary
Rebelde e impulsivo, eterno inadaptado, Chester era um miúdo esperto. Criado na rua, um pouco ao deus-dará -apesar de os
pais pertencerem à classe ‘média’ negra-, acabou na prisão por pequenos furtos.
O primeiro grande choque da sua vida acontece quando o irmão mais novo tem um acidente, ao misturar explosivos na escola, e é atingido na cara. Quando chegam
às urgências do hospital de Jefferson City, os médicos recusam-se a deixar entrar esse jovem
negro, devido às leis raciais, ainda vigentes, as Leis de Jim Craw. O irmão perde um dos
olhos. Chester sente que essa injustiça era inaceitável!
1939, em Oklahoma, 'água' para negros
sala de espera para negros, 1940
Conta
na autobiografia, The Quality of Hurt:
“Esse momento da minha vida magoou-me mais do que todos os que os outros todos
que sofri depois”. Tinha 12 anos e descobre o problema racial.
“Adorava
o meu irmão Joseph, nunca tínhamos estado separados e quando aquilo aconteceu foi como se tivesse sido eu (…).”
Recorda, com raiva: “O meu pai chorava como uma criança. A minha mãe meteu a mão na mala para tirar um lenço e a verdade é que eu tive a esperança que ela tirasse uma arma.”
Ainda vem longe a marcha de Martin Luther King, em 1963, sobre Washington. E o sonho: "I have a dream"...
E só em Julho de 1964 o Presidente Lyndon Johnson assina o Civil Rights Act.
A família muda para Cleveland à procura de outros mundos melhores. É mais outra terra, onde eles, 'migrantes' eternos, tentam encontrar o 'seu' lugar, mas aqui, como ali, é sempre a mesma vida miserável dos 'negros'.
Tudo corre mal. Os pais separam-se. A vida de Chester é como um filme de terror: histórias de assaltos, roubos, gangs e prisão.
Revoltado, vai participando em assaltos cada vez audaciosos, com uma capacidade enorme de 'auto-destruição'. Como se nada lhe importasse. Vai parar à cadeia por pequenos roubos.
Quando consegue entrar para a Universidade, os sarilhos continuam. Um dia, há um assalto mais grave e o juiz Mac Mahon (cujo nome nunca mais esquecerá!) condena-o a vinte e cinco anos de trabalhos forçados. Um choque brutal: sabe que a sua vida está acabada. Tem 19 anos.
O que será, ele, Chester, depois de 25 anos numa penitenciária americana - a do Ohio- construída para 1500 presos e onde estão, de facto, 5000?
Como descreverá nos seus livros: os muros altos de tijolos, os beliches empilhados até ao alto, onde se encontra a janela gradeada. A violência física, os abusos, as condições mal-sãs, a comida nojenta, os ratos?
Nessa prisão, super-povoada a abarrotar de delinquentes, onde se vive nas condições mais primitivas e, depois noutras prisões, vai viver sete anos. A pena é comutada para sete anos.
Quando sai, dificilmente se recompõe do choque. "Nunca mais ninguém na vida me fará o mal que ele me fez com esta condenação!", escreverá.
Recompor-se, como? É na prisão que passa da adolescência à idade adulta. É detrás das grades que vai encontrar a realidade dos seu livros.
Tudo corre mal. Os pais separam-se. A vida de Chester é como um filme de terror: histórias de assaltos, roubos, gangs e prisão.
Penitenciária do Missouri
E, sempre, a consciência da brecha descomunal de oportunidades entre a "raça negra" e a chamada "raça caucásica", ou "raça branca". O tratamento bem diferente entre uns e outros, as leis raciais e a segregação racial existente. Revoltado, vai participando em assaltos cada vez audaciosos, com uma capacidade enorme de 'auto-destruição'. Como se nada lhe importasse. Vai parar à cadeia por pequenos roubos.
Quando consegue entrar para a Universidade, os sarilhos continuam. Um dia, há um assalto mais grave e o juiz Mac Mahon (cujo nome nunca mais esquecerá!) condena-o a vinte e cinco anos de trabalhos forçados. Um choque brutal: sabe que a sua vida está acabada. Tem 19 anos.
Penitenciária do Ohio (1931)
Como descreverá nos seus livros: os muros altos de tijolos, os beliches empilhados até ao alto, onde se encontra a janela gradeada. A violência física, os abusos, as condições mal-sãs, a comida nojenta, os ratos?
Nessa prisão, super-povoada a abarrotar de delinquentes, onde se vive nas condições mais primitivas e, depois noutras prisões, vai viver sete anos. A pena é comutada para sete anos.
Quando sai, dificilmente se recompõe do choque. "Nunca mais ninguém na vida me fará o mal que ele me fez com esta condenação!", escreverá.
Recompor-se, como? É na prisão que passa da adolescência à idade adulta. É detrás das grades que vai encontrar a realidade dos seu livros.
“Uma obra negra, atormentada,
marcada pela violência social, e pela violência física, impregnada do racismo
da América, anterior à conquista dos ‘direitos civis’, impregnada do ‘absurdo’ do
destino humano, que descobrira ainda muito jovem. Uma obra atravessada também
por um humor inesperado. Celebrado como o pai do romance policial
afro-americano, este neto de escravos vai buscar na sua história para pintar os
cenários e as personagens à deriva que povoam a sua obra.”
Obra dura, negra -em toda a acepção da palavra. O dia a dia descreve-o no livro "Yesterday will make you cry".
Os primeiros contos, escritos na prisão, são publicados na revista Esquire, uma revista para homens. Em 1931, publica The Bronzeman e, em 1934, To What Red Hell.
É nesse ano que é transferido para outra prisão, a London Prison Farm. Em 1936, sai em liberdade condicionada, sob a custódia da mãe. Arranja trabalhos diferentes em part-time e vai escrevendo.
Sobre o herói de "Yesterday will make you cry, escreve Stéphanie Le Bars: "Jimmy Monroe, o protagonista é o 'alter-ego' branco do jovem Himes, é uma pintura social e psicológica preciosa, sobre a violência moral e a proximidade da morte que rondava sempre."
Retrato precioso até porque o escritor, nas suas auto-biografias, poucas linhas dedica a esses anos.
Em 1950, vai viver para França. Tem sucesso. Em 1958, ganha o prémio francês de romances policiais, o Prix de Littérature Policière. Era o momento dos grandes autores policiais franceses: Auguste Le Breton, Albert Simonin, etc
Vários livros de Himes foram adaptados ao cinema; organiza guiões; escreve uma série policial para a televisão americana, Detective em Harlem.
Morre em 12 de Novembro de 1984, em Espanha, em Moraira, na Costa Blanca, para onde se retirara algum tempo antes.
London Prison Farm
É nesse ano que é transferido para outra prisão, a London Prison Farm. Em 1936, sai em liberdade condicionada, sob a custódia da mãe. Arranja trabalhos diferentes em part-time e vai escrevendo.
Sobre o herói de "Yesterday will make you cry, escreve Stéphanie Le Bars: "Jimmy Monroe, o protagonista é o 'alter-ego' branco do jovem Himes, é uma pintura social e psicológica preciosa, sobre a violência moral e a proximidade da morte que rondava sempre."
Retrato precioso até porque o escritor, nas suas auto-biografias, poucas linhas dedica a esses anos.
Langston Hughes
Nas suas deambulações por editoras e jornais, encontra o escritor e activista -poeta de jazz também- Langston Hughes que o inicia no mundo literário para ele, até então, desconhecido. Em 1950, vai viver para França. Tem sucesso. Em 1958, ganha o prémio francês de romances policiais, o Prix de Littérature Policière. Era o momento dos grandes autores policiais franceses: Auguste Le Breton, Albert Simonin, etc
Vários livros de Himes foram adaptados ao cinema; organiza guiões; escreve uma série policial para a televisão americana, Detective em Harlem.
1958
conhecendo alguns de seus livros não conhecia os detalhes da sua vida. é sempre bom passar aqui.
ResponderEliminarabraço
Não conheço o autor, porque também não leio muitos policiais, mas vou ver se compro alguma coisa.
ResponderEliminarComprei agora na Feira do Livro e das Artes da Figueira, um montinho de livros por bom preço. Alguns já os recomendou aqui. Havia muitos policiais antigos (colecção Vampiro). Vou ver se ainda me arranjam algum deste autor.
Um beijinho grande:)
Obrigada, Isabel, pelas tuas palavras! Não sei se encontrarás este Himes, eu li-o sobretudo em francês, era um autor muito publicado nas colecções 'série noire'. É um bocado violento, compra antes do Simenon que existe na Vampiro! Beijinhos
EliminarHá apenas um livro dele, em português, no Wook e da Rachel Queiroz (que também me deixou curiosa) só há um título disponível, em português do Brasil. Acho que vou pedi-los.
EliminarUm beijinho grande.