"O Outono está por toda a parte. Sempre. Na tristeza súbita que nos invade sem razão aparente. Na melancolia a olhar pela janela. Nas recordações que jorram do coração e nos fazem suspirar sem querer.
Tem morrido gente. Morre sempre gente no Outono. Gente jovem, gente velha. Gente que não resiste ao peso da vida, que já não espera. Que se cansou de viver. Ou gente que não tem saúde mas gostaria tanto de viver.
Munch, Quarto e morte
Tem morrido gente. Morre sempre gente no Outono. Gente jovem, gente velha. Gente que não resiste ao peso da vida, que já não espera. Que se cansou de viver. Ou gente que não tem saúde mas gostaria tanto de viver.
A Corredoura no Outono, Miguel Barrias
A vida é injusta e cruel e não é só Deus a
decidir dessa injustiça. É tanta coisa! A esperança e a desesperança, o encontro e o desencontro. A ambição do absoluto, um absoluto que talvez não exista. A impaciência, a pressa, a desconfiança. O amor e o desamor.
Culpa de Deus? Não, até porque Deus até talvez não exista. Mas querer ter um
deus evita-nos os medos de que ele talvez não exista. E se ele não existir, então? Quantas vezes choramos a
pedir-lhe coisas, a pedirmos que não aconteçam coisas. E Deus ouvia? Deus ouve?
Régio fala das "Encruzilhadas de Deus"...
Régio fala das "Encruzilhadas de Deus"...
Desencontros, sofrimentos, medo, desejo de ser amado, medo de não saber amar. Querer o infinito. Sempre.
O desencontro com a minha mãe que tanto amei. Será que ela o soube? Dele falo na minha história “Noite
na Serra”. Só nós duas sabíamos dessa 'falta' e do medo que talvez
tivéssemos de que não gostássemos uma da outra - como teríamos querido que fosse sempre. E o medo de não nos amarmos, afinal, como nos tempos em que nos tínhamos amado.
Dizia o meu amigo Agostinho Castro - um Poeta que morreu sem nunca saber como foi - que
era a história mais terrível das que lhe mostrei.
Marc Chagall, O Poeta e os pássaros
Falava da solidão e da coragem da minha mãe nos últimos anos. Como se sentia perdida nas noites de Inverno. Teria vontade de partir depressa?
Rembrandt e o Anjo
Nesse conto falava da minha vontade de lhe dizer o que nunca lhe disse. Do grito que não me saía dos lábios:"estou aqui!"
Para que servia a minha pena? De uma pessoa perdida no meio da serra e da solidão?
E o que fiz eu? Nada, creio. Não havia nada a fazer, e desculpei-me por estar longe, muito longe...
Um dia, pouco antes de morrer, disse-me: "Vem ver. Tão bonitas as árvores..."
Encostei-me ligeiramente ao ombro da minha mãe e não disse nada.
Quando chega o Outono tenho vontade de chorar..."
Um dia, pouco antes de morrer, disse-me: "Vem ver. Tão bonitas as árvores..."
Encostei-me ligeiramente ao ombro da minha mãe e não disse nada.
(Outono 2017)
Muito lindo!!! É assim... mães e filhas...
ResponderEliminarTexto lindo de mais - por muito sentido, por muito melancólico...
Posso entender-te, eu também estava muito longe quando os meus pais morreram, os dois nos braços da Toy. Fica uma espécie de frustração, que não de culpa. Agora é o "outono" do nosso descontentamento...
ResponderEliminarAnima-te, beijinhos
Um texto belíssimo e emocionante..
ResponderEliminarRecordando as mães, temos sempre episódios que desejamos
que acontecessem de forma diferente...
Tenho a certeza que ela sabia do seu amor incondicional
e hoje sabe de tudo.
~~~ MJ, o meu carinho num terno abraço ~~~
Acho-a muito triste e não gosto de a ver assim.
ResponderEliminarO texto é lindo. Nós não fazemos as coisas de propósito, e de certeza que cada uma sabia do amor da outra. As coisas que ficam por dizer pesam-nos sempre, mas os sentimentos existem...
Um beijinho grande e espero que se anime:)
Saudades...
Eu também não estava por perto quando minha mãe partiu. Telefonei para ela um dia antes, no final da tarde de um domingo. Ela não podia falar, porque estava gripada e descansando, no seu quarto. Nunca mais falou comigo.
ResponderEliminarMas em sonho, talvez sei lá, de que forma, ela se faz presente. E sabe como ela está mais perto de mim? Quando eu acordo e já arrasto os chinelos como ela fazia, quando as panelas ficam fumegantes e fico inebriada com os aromas, como ela ficava, em silêncio, ao lado do fogão. Quando eu ajeito no meu pescoço o echarpe, exatamente como ela enrolava.
A verdade é que as mães nunca morrem, nós (as filhas) demoramos para perceber. Por vezes, a presença é tão forte e tenho que responder ao que ela me pergunta!
As mães estão acima de todos os pensamentos que estão apegados em nossas mentes. As mães podem fazer chover, para que despertemos e limpemos os apegos da nossa mente, para depois tomar uma xícara de chá, apenas sentindo.