Brighton
Batiam
as nove quando Alice chegou a Brighton. Stephen estava em casa. Viu
o Mercedes muito bem arrumado no canto direito da garagem, como de costume, deixando o
resto do espaço para ela.
“Geometricamente arrumado! É um maníaco! Ele e o carro!”, pensou. As horas que perde a dar-lhe brilho ou olhar para dentro do capot."
Estava acesa a luz no escritório. Estremeceu sem saber porquê. Arrumou o Aston
Martin de qualquer maneira, meio torto.
“Por que terei sempre medo?...”
Stephen intimidara-a desde o primeiro momento e não conseguira
libertar-se daquela sensação desagradável quando pensava que ele ia ficar
irritado.
Chuviscava e ouvia o murmúrio do mar. Sempre gostara de ali viver, mas agora o
ruído surdo que adivinhava ao longe assustava-a. Sentia o piar angustiado das
gaivotas e estremeceu.
“Por quê esta reacção depois de tantos anos? Como se dele me pudesse
vir mal!”
Entrou em casa e subiu as escadas a correr, enquanto pensava:
“O que estará a fazer a esta hora? Já devia ter
jantado...”
Foi direita ao escritório, abriu a porta bruscamente e entrou, sem dizer nada, querendo mostrar-se natural e segura de si. Tirou o casaco de peles, deitou-o para cima de uma cadeira, sacudiu a saia e foi sentar-se no sofá de couro preto, em frente da secretária, desafiando-o com o olhar.
Foi direita ao escritório, abriu a porta bruscamente e entrou, sem dizer nada, querendo mostrar-se natural e segura de si. Tirou o casaco de peles, deitou-o para cima de uma cadeira, sacudiu a saia e foi sentar-se no sofá de couro preto, em frente da secretária, desafiando-o com o olhar.
Por cima da mesa, estavam espalhadas folhas de papel. Pareceram-lhe cartas,
amarelecidas pelo tempo.
Stephen levantou os olhos, tirou os óculos e pousou-os ao lado, afastando
os papéis com a mão.
-Ah! Chegaste finalmente. Onde estiveste?
Perguntava, fingindo-se desinteressado.
-Estive em casa da Joan a tomar chá.
E pensou como era acolhedor o salão de Joan.
Lembrou as vezes que fora tomar chá com Abigail, a mãe de Joan, que morrera tão repentinamente. Era uma pessoa doce, poética. Por que morrera de modo violento?
E pensou como era acolhedor o salão de Joan.
Susan Ryder, Sala com bule de chá.
Lembrou as vezes que fora tomar chá com Abigail, a mãe de Joan, que morrera tão repentinamente. Era uma pessoa doce, poética. Por que morrera de modo violento?
- Como estava a Joan?
- Muito em baixo. Venho impressionada! Calcula tu que pensa...
Ele interrompeu-a:
Ele interrompeu-a:
- É natural que esteja em baixo, não devia estar à espera que a mãe
morresse. A Abigail era nova e não estava doente.
Sacudiu a cabeça e acrescentou, num ar convencido.
- Bem, afinal até estava. O paludismo é uma doença que mata...
Sacudiu a cabeça e acrescentou, num ar convencido.
- Bem, afinal até estava. O paludismo é uma doença que mata...
-Pois, aí é que está o problema. A Joan pensa que a mãe foi assassinada.
Não acredita na história do paludismo. E eu ouvi os argumentos dela, com muita
atenção.
- Que argumentos?!
- Impressionou-me tanto a conversa. Fiquei cheia de dúvidas...
-Dúvidas? Que dúvidas?
-Quase concordei com ela. Se não foi o paludismo que a matou ...terá
sido mesmo envenenada? Prometi ajudá-la a descobrir a verdade!
- A verdade, dizes tu. Qual?
Alice olhou para Stephen. Ele pegou na filofax preta e pô-la em cima dos papéis, como
se quisesse escondê-los. Parecia contrariado.
-Bem, acabei, por hoje.
E continuou:
-De que verdade estás a falar?
-Da única: o que aconteceu, realmente.
Alice ia pensando: “por que lhe pergunto tudo isto? Ele não se
interessa se não por si próprio ”.
-O que queres que eu pense? Envenenada! Acho que ela está é doida!
Paranóias!
Parou, desviou o olhar e continuou:
-O que não me admira nada! A Joan foi sempre um pouco louca...
- A Joan é uma mulher normal! Uma mulher que pensa.
- Conversas! Levou a vida a fugir dum sítio para outro, de um
curso para outro. Não parava em lado nenhum. Tens que concordar que não é muito
certa...
- E não concordo contigo! Não é louca, inconstante, sim, talvez. Aliás, é ainda uma miúda! Tinha tempo para ver a vida negra...e afinal viu-a assim de repente.
Lembrava-se dela quando voltava do internato, a passar férias em casa. Séria, interiorizada, pensativa. Falando pouco.
Teimosamente, insistiu:
Teimosamente, insistiu:
-O que ela diz tem sentido! A Abigail sofria de paludismo há anos, ninguém se preocupava com as crises dela. E, sem mais nem menos, morre de
paludismo! É absurdo, tens de concordar.
-Concordar, por quê? Queres dizer que é menos absurdo ser envenenada?
Achas mais normal, mais comum, não?...
Contente da sua segurança, teve um sorriso irónico:
-Assassínios acontecem todos os dias. Andam para aí assassinos a
toda a hora a envenenar as pessoas!
-Ela lá tem as suas razões! Desconfia...
Stephen interrompeu-a, agora seco:
-Também não pareces estar a regular bem da cabeça! Já participas
nas loucuras dela? Tens é que te ocupar com coisas sérias, coisas concretas! Só
filosofias e literatura não dá para nada. Se fosse nas tuas filosofias, estava
bem arranjado! Eu tenho que trabalhar...
Assentou as palmas das mãos com força em cima da secretária e levantou-se, endireitando bem as costas:
Assentou as palmas das mãos com força em cima da secretária e levantou-se, endireitando bem as costas:
-Pensar faz-te mal, já to disse várias vezes...
-Faz mal pensar?! Já que levas a conversa para esse lado, então
digo-te que não fui só eu a dar-lhe. A Emily e a Helen também concordaram!
Stephen riu, sarcástico.
Stephen riu, sarcástico.
-Outras doidas! Uma divorciada e uma solteirona. Ora, deixa-te
disso! Vamos para a sala, eu já comi.
-Uma divorciada e uma solteirona? Como podes ser tão frio? Só te
preocupa a tua pessoa! A Emily é uma óptima médica e o facto de não ter casado
não diminui a inteligência de ninguém, que eu saiba. Antes pelo contrário, talvez.
Sentia-se irritada, mas acrescentara a última frase num tom mais baixo. Depois, acrescentou:
-E a Helen é a pessoa mais lógica, mais tudo que eu conheço! E tem os pés bem assentes na terra, e não me parece nenhuma parva!
Pensava nas duas irmãs, Emily e Helen que viviam as duas juntas desde que Helen se separara do marido.
-E a Helen é a pessoa mais lógica, mais tudo que eu conheço! E tem os pés bem assentes na terra, e não me parece nenhuma parva!
Pensava nas duas irmãs, Emily e Helen que viviam as duas juntas desde que Helen se separara do marido.
Ele olhava para ela, com uma ironia crescente, vendo-a esbracejar e enervar-se. Levantou-se e disse:
-Está na hora do noticiário...
-Está na hora do noticiário...
-És horrível, Stephen! Não quero saber do “teu” noticiário! Vou ver o que há para comer
na cozinha. E vou-me deitar! Dás-me cabo dos nervos!
Passou pela entrada e olhou para a mesa com o dióspiro que lhe tinham oferecido. A caminho da cozinha disse, irritada:
- Cínico!"
O falcão de jade, os olhos de jade ...asas que não voam, olhos que não veem. Dava para uma análise psicológica, hahaha. A escolha dos nomes também é curiosa.
ResponderEliminar"Cínico" é pouco, que homem tão machista!!!
Escreves muito bem. Um beijinho grande
Tu e as tuas "psicologias"...Tinha de ser uma personagem muito antipática, com coisas que detesto. Será o assassino? Não digo...
EliminarMuito interessante.
ResponderEliminarGosto do que escreve. A Maria João escreve muito bem.
Beijinhos e um bom fim-de-semana:)
Obrigada Isabel querida!
EliminarFoi um prazer ler este excerto...
ResponderEliminarVai ficar uma história muito bem contada e apelativa.
Confie no sucesso, MJ.
Beijinhos
~~~~
Que machista! Há tantos... quem será o assassino? Gostei!
ResponderEliminaradorei.....beijinhos
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