Desta vez,
levei-os de passeio até Porto Covo!
Tinha de ser... Não
me atrevi a deixá-los em casa depois do desgosto que tiveram da última vez...
Lá
fomos todos então!
Andámos à procura
da Ponte Vasco da Gama mais de duas horas. Era um domingo e havia uma corrida
de ciclistas junto ao mar, perto do Cais do Sodré. Tivemos que voltar para trás até Alcântara.
Voltas e mais voltas, perdemo-nos: nem o GPS ajudou!
Andámos perdidos até chegar a Chelas! Sabem onde é Chelas? Eu não sabia. Mas foi um senhor em Chelas que finalmente nos indicou o caminho para a ponte!
E lá
estava a ponte na sua elegância e na sua delicadeza: como um sonho quase, a
atravessar o Tejo, por quilómetros e quilómetros (dezassete kms e tal), juntinha às águas do rio.
Estrada do
Alentejo fora, lá fomos. Desta vez não para Portalegre, ou Marvão, no interior
escaldante, mas para o litoral, à procura do mar alentejano!
Paisagens de
pinhais, campos de sobreiros, a serem descascados, alguns já com metade do
tronco em carne viva.
Não havia, claro,
no Verão não há, se não tinha ido buscar umas para o Ratinho e para o
Ouricinho provarem.
Ah! o que eu
gostava das bolotas que a Florinda nos assava na braseira! O cheiro
maravilhoso, o gosto adocicado que elas tinham. Inesquecível tudo isso!
Continuámos estrada fora.
Havia, isso sim,
enormes rolos de palha amarela, para o gado, a lembrar os quadros de Van Gogh! O céu azul e o sol a queimar.
E a paisagem ia
mudando. O Ratinho empoleirado na parte interior, junto ao vidro, olhava para
tudo de olhos bem abertos. O Ouricinho, esse, tinha adormecido, talvez por
causa do fresquinho do ar condicionado.
Campos sem
culturas desfilavam agora ao nosso lado. A verdura das veredas junto à estrada,
contrastava com a secura dos campos.
À medida que nos aproximávamos do mar,
surgiam os cactus, os figos da Índia , sem figos maduros ainda, as colinas suaves dum
lado da estrada, o mar a correr lá ao fundo, do outro lado.
- Isto é o
Alentejo?, espantou-se o Ratinho. Com mar?!
E repetiu:
- “Isto”, com mar, é
o Alentejo? Não dizias que são “campos, campos, campos” a perder de vista, como
no poema? Aqui há pinhais, areia, estevas, cactos...
- Ó Ratinho, o
Alentejo estende-se por aqui abaixo, esta é a costa que vai até ao Algarve. O
Alentejo não é só campos, tem mar, em pescadores...
- Essa é a maior!
Imaginava ir ver as searas loiras, como tu nos contavas, as ceifeiras a ceifar com
seus lenços cruzados e atados atrás do pescoço, por causa do sol ardente!
Afinal...
O Ouricinho
espertara com a conversa e já se empinara no braço da poltrona, e trepou por
ali acima, até chegar ao lado do Poeta.
- O quê? O quê? Não
ouvi tudo... Onde é que estão as ceifeiras?
- Não estão... Nem os ceifeiros do Van Gogh, a dormir a sesta..., ironizou.
- O quê? Não há
ceifeiras? No Alentejo e no Verão? Devia haver, não é?
E o Ouricinho
virava-se para o Ratinho, à espera que ele explicasse tudo. Tinha muita
confiança no amigo, achava que ele sabia muita coisa, e respeitava-o.
O Ouricinho Dan
estava entusiasmado.
- Pois é,
acrescentou o Ratinho. É toda a parte que está abaixo do rio Tejo até ao Sado,
não é?
Ri-me. Ele não
esperara a minha resposta e já estava a ver a paisagem.
- Que lindo porto!
O que é?
- Sines...
Parecia-me tão
diferente das outras vezes. Estava a marginal em obras, máquinas por toda a parte e poeira, tanta
poeira...
- Não gostas?
O Ratinho
observara a minha expressão de tristeza.
- Gosto muito! Só
que me parece mais feio hoje...
- É das obras! Mas
o mar é lindo! E tem belos barcos! Já viste? ...
- Pois é,
confirmou o Ratinho, obras, e tudo estragado. Pó, barulho...
- Obras são assim,
não é? Bem, é normal, estão a arranjar o porto, não é? Mas vai ficar como novo!
Não é?
O Ouricinho
espreitava por detrás do amigo e já não largava a conversa, com o seu “não é?” que descobrira
há pouco.
Tivemos que voltar
a subir até Sines, procurar outro caminho...Porto Covo já não estava longe,
passáramos São Torpes e agora era seguir sempre em frente, fora as curvas, claro, até à vila.
- Que lindo este
mar! Abre um bocadinho a janela, para cheirar o mar.
O Poeta respirou profundamente
e disse, entusiasmado:
- Cheira a
maresia! Ah! Há mar e mar... e eu cá gosto muito deste!
O Ouricinho
repetiu:
- Mar e mar...Que
mar maravilhoso! O Manuel não vê?, perguntou-me baixinho. Nunca olha e vai tão
calado...
- Vai a guiar! Era
o Poeta que explicava. Não se pode contemplar a paisagem, quando se vai a
guiar...
- Mar e campo,
campo e mar... Lindo!
Era o Poeta. Mas o
Ouricinho não lhe ficou atrás, e repetiu...
- Sim, é a charneca!
Entrámos na vila
branca, com as suas fitas azuis pintadas sobre a cal branca, a bordejar as
esquinas, as janelas, as portas.
Chegámos a o hotel
e as exclamações do Ouricinho não paravam.
- Oh! Que giro é
isto aqui! Que giro mesmo!
O Ouricinho
apreciava tudo...
- E tens uma
mini-cozinha! É uma casinha em ponto pequeno...Que giro! E as janelas com ripas de madeira!
O Ratinho olhava o
mar ao fundo, pensativo.
O Ratinho quis
experimentar, mas percebi que não se sentia à vontade naquelas alturas. O
amigo, pelo contrário, era um autêntico malabarista!
- Bem, disse eu.
Agora vamos descansar um bocadinho!
Já estavam os dois
em cima da cama, a dormir...