terça-feira, 31 de maio de 2011

Cole Porter e a canção "It was just one of those things. Canta Bryan Ferry





Just One of Those Things" é a popular canção criada pelo enorme e e único Cole Porter - em 1935- para um espectáculo musical: Jubilee.




"Just one of those Things" aparece frequentemente citada no American Song Book: quase todos os grandes cantores a interpretaram.


Primeiro: Ella Fitzgerald, Billie Holiday, Louis Amstrong, Sarah Vaughan.
Depois: Doris Day, Bing Crosby, Frank Sinatra.
Ainda: Lionel Hampton e Oscar Peterson e Sidney Bechet.
Mais tarde, ainda: Jamie Cullum e Brian Ferry...



Mais curiosidades sobre esta canção:

Aparece referida num episódio do "Get Smart", o agente especial...



Lembram-se de Holden Caufield - o jovem herói do livro de J. D. Salinger (The Catcher in the Rye)? Pois Caufield amava esta canção!

Era mesmo a sua canção preferida. Dizia ele que nem “aquela porcaria da banda que toca no hall do hotel” conseguia dar cabo dela.



Não me admiro nada que Caufield gostasse dela...Ele era um "miúdo" especial.


Deixo-vos a versão do Brian Ferry, porque tem uma voz alegre e gosto dele...

It was just one of those things




Just one of those crazy flings


One of those bells that now and then rings


Just one of those things


it was just one of those nights


Just one of those fabulous flights


A trip to the moon on gossamer wings


Just one of those things


If we'd thought a bit, of the end of it


When we started painting the town


We'd have been aware that our love affair


Was too hot, not to cool down


So goodbye, dear, and amen


Here's hoping we meet now and then


It was great fun


But it was just one of those things

Boa música: H.Hancock & M.Brecker interpretam "Just one of those things"


O Passaro Azul, filme de Walter Lang, com Shirley Temple

A propósito do Pássaro Azul ( neste filme é o "pássaro azul da felicidade"), descobri esta passagem do filme de Walter Lang, de 1940, e como tem imagens bonitas e fala de coisas belas, de sonhos, deixo para o dia de amanhã...
Aconteça o que acontecer amanhã, o Sonho Existe Sempre. E às vezes é azul...

A minha lenda do pássaro azul


pássaro azul, jóia de Jean-Schulamberger (internet)






Quem não gosta de contos de fadas? Eu gostei sempre e ainda gosto de os ler. A história d' O Pássaro Azul, o príncipe prisioneiro do próprio corpo, O Pássaro de Fogo, ardendo em liberdade, O Príncipe Encantado, ou a Princesa Adormecida no Bosque...


desenho de uma história russa, talvez o Pássaro de Fogo





Dos contos dos Irmãos Grimm a Hans Andersen, de Andersen a Selma Lagerloff e Oscar Wilde toda a minha vida girou à volta dos contos fantásticos, do maravilhoso, dos pássaros animais que falam e dos pássaros que pensam, das forças do bem e do mal em luta, do impossível, da justiça e da injustiça, dos encantamentos, dos deuses e das fadas e dos duendes...

             Ilka Gede, sem título


Hoje deixo-vos a minha história: "A lenda do pássaro azul e do milhafre negro"...



"A ave de rapina, negra e bela, voava em círculos altos, à roda das serranias, concentrando o olhar na presa, em baixo. Quase que as olhava com ternura.

Os olhos amarelos melancólicos, que sabiam ser ternos, tornavam-se de repente negros e faiscantes, lembrando o olhar dos lobos quando a lua cheia os faz uivar, desesperados e famintos.
As asas de penas negras de veludo, que sabiam abraçar o próprio corpo, podiam transformar-se de repente em lâminas cortantes ou em garras que dilaceravam até ao fundo a carne da sua presa.
Sabia disso o pássaro azul, lá no alto da sua árvore.


              salgueiros (wheeping willow) internet




Vira-o lutar com outro pássaro grande como ele, e matá-lo: gritos entre penas arrancadas e gotas de sangue, no azul do céu sereno e indiferente. Adivinhara o perigo, quando o vira passar, alto, descendo em círculos cada vez mais baixos, mais cerrados, aproximando-se do ninho onde se defendia, escondido, esperando que ele não o visse. 


Protegera o seu ninho com penas fofas e raminhos e bocados de musgo verde e suave, ainda húmido, que arrancava do tronco das árvores com o biquinho amarelo e forte, quando o pássaro negro andava por longe.





Tirara também a penugem do próprio colo azul - e com tudo isso se envolvia no seu canto. O ninho que pusera bem alto, demasiado alto, longe dos perigos.
Em baixo a floresta bem podia arder, o vento zunir e quebrar as árvores, os rios encherem e tudo levarem no seu caudal. O passarinho não temia a natureza.


O perigo vinha de outro lado. Do meio do arvoredo de onde vinha o pássaro de olhos aveludados luzentes como brasas a arder, furando os ares à procura, nunca satisfeito, olhos que o atraíam e amedrontavam.
                  milhafre negro (internet)


Contra o pássaro negro nem o ninho alto oferecia protecção. As cegonhas tinham passado, antes do Outono, em direcção aos países quentes do Sul, como todos os anos.E tinham-no avisado


- Tem cuidado, pássaro azul. O pássaro de asas negras ronda por perto...

A cegonha mais velha, à frente do bando, dissera-lhe mesmo:

- Vem connosco! Acompanhamos-te até lá o fundo do vale. Há árvores tão altas como a tua, lindos choupos junto ao rio.

- Vem com o nosso grupo..., insistiram as jovens cegonhas, curiosas da viagem, a desafiá-la.

in internet, bosque de bétulas


O pássaro azul sabia como eram belas as bétulas do vale e como o céu era azul junto ao ribeirinho, mas, na sua árvore empoleirada no cimo do monte escarpado, no seu velho e amdo eucalipto de tronco descascado e folhas longas e ainda perfumadas, não quis. Aquele era o seu lugar.



- Não vou, não vou...

A velha cegonha abanou as asas esticadas - e insistiu:

- Vem agora, antes que seja tarde. Anda para o vale connosco. Olha que um dia destes ele vem e leva-te!

- Não quero deixar a minha árvore. Eu gosto de morar cá em cima, de ver o céu perto de mim, de sentir as nuvens voar sobre a minha cabeça. Gosto de contemplar as montanhas e de ouvir o vento zunir, quando a tempestade envolve o meu ninho.


Riu e disse ainda, um pouco nervosa:

- Gosto de sonhar e pensar nas neves eternas que devem estar para lá do horizonte...- Então, adeus, pássaro azul. Tu lá sabes...

Mas no fundo pensava que o pássaro azul não percebia nada da vida.

- Adeus, cegonhas.


Pensava com os seus botões:

Eu sei que um dia vai chegar aquilo que chamam de destino. Seja ele o pássaro negro ou outra coisa.”

Lembrava o voo do pássaro que, tempos antes, passara ferido de morte, logo que a caça abrira.

O corpinho cheio de chumbo, sangrando um fiozinho, os olhos já meio vidrados, o pássaro cinzento cor de camurça, ia caindo devagar, voando com uma asas só, a outra arrastando-se pesada de morte.

- Adeus pássaro azul, vou morrer!, dissera-lhe com voz triste.
- Quem te feriu? Por quê?!
- Oh... que importa? Chegou a minha hora...

Sentiu o farfalhar das asas, como seda, arrastando-se pela mata. O voo terminara.

Um dia também a minha hora vai chegar. Para quê partir? Fugir para quê? Ninguém me obriga a deixar o meu canto! A minha árvore, a minha vista até ao infinito...”
Amava o sol, o céu azul, as nuvens branquinhas ou cinzentas e cerradas dos dias de trovoada, o riscar em brasa dos raios, o barulho dos trovões. Aquilo era o seu mundo!

Sentiu aproximar-se o voo do milhafre. Escondeu-se no fundo do ninho, onde se sentia mais protegido.

- Não, milhafre, não é ainda a minha hora!, murmurou baixinho.

Apertava as asinhas de encontro ao corpo frágil e as patinhas arranhavam o chão de raminhos secos, com medo. Fizesse o que fizesse, sabia que a ave negra havia de vir um dia. Tremia. Fazia-lhe medo aquela ideia!

Sabia que um dia, quando voasse desprevenido, ou quando repousasse, julgando-se seguro, com o biquinho sobre o peito, quase a dormir, o milhafre havia de chegar.

Sim. Sabia que o caçador de olhos agudos chegaria, cruel, negro e impiedoso, egoísta e indiferente, e que as garras dele lhe iriam direitas ao coração.

Mas enquanto tivesse vida, o pássaro azul queria escolher a liberdade de ficar!"

E aqui está a minha história do pássaro azul...

(as fotografias que não estão legendadas são minhas)


segunda-feira, 30 de maio de 2011

A ópera "Dido e Eneias", de Henry Purcell, no TMG da Guarda

Sebastien Bourdon, Dido



A ópera de Henry Purcell "Dido e Eneias" vai ser apresentada no Teatro Municipal da Guarda. A estreia é no dia 2 de Junho, no Grande Auditório.

No dia 4 a ópera vai estar no Teatro Cultural Vila Flor, em Guimarães, e nos dias 8 e 9 de Junho no Teatro Viriato, em Viseu.

Guérin, "Eneias conta a Dido a sua história e a destruição de Tróia" (Louvre)


Eneias foge de Tróia, incendiada, com o velho pai, Anquises, às costas



Trautmann, "O incêndio de Tróia"

Andrea Sacchi, Dido e os barcos de Eneias no horizonte






Não sei se viram esta série da BBC, "Vanity Fair" (1998), tirada do romance homónimo (fantástico, inesquecível, romance!) do escritor inglês William Makepeace Thackeray.

Pensei que era interessante ouvir, com as belas imagens do filme, esta interpretação do "Lamento de Dido", abandonada por Eneias ("When I' am laid in earth").


Aqui, Becky - a terrível Becky do romance- interpreta o "pranto" de Dido.

A tragédia, contada por Vergílio, na "Eneida", narra as peripécias da fuga de Eneias, da Tróia destruída pelos Gregos, onde morrera o grande, o justo Heitor, o herói troiano por excelência, vencido por Aquiles, o grego.

Luca Giordano, "Eneias combate"

Deixando tudo atrás de si, foge com os seus por mar e o barco leva-o a Cartago (hoje Túnes) onde encontra a Rainha Dido que o acolhe.



óleo de Turner, "Dido funda Cartago"


A Rainha apaixona-se pelo herói, mas ele tem uma missão a cumprir (segundo a lenda, irá fundar a cidade de Roma), e parte.

Ao ver os barcos de Eneias afastarem-se no horizonte, Dido desespera e mata-se.

Joshua Reynolds, Morte de Dido

A conhecida obra de Henry Purcell (“o maior génio que jamais houve”, dizem alguns) desta vez encenada pela Companhia francesa do "Théâtre de la Mezzanine", com encenação de Denis Chabrouillet, direcção musical de Jean-Marie Puissant e cenografia de Michel Lagarde.



Uma visão "contemporânea" do clássico Purcell, em que o impacto visual parece ser imenso...
imagem tirada do site da Companhia Théâtre de la Mezzanine, no facebook


"Este grupo, criado em 1979 na “banlieue” de Paris, começou por pôr em cena textos do repertório contemporâneo (entre iutros autores, Garcia Lorca).

Denis Chabrouillet –o director- dedica-se, em seguida, à adaptação de romances (“O Bom Soldado Schweik”); mais tarde, escreve ele próprio os textos que são adaptados por autores dramáticos.

Tenta, ainda, ele próprio, a escritura dramática, substituindo-a depois por um certo aproveitamento da gramática teatral – usando sobretudo a matéria, o som, as imagens como vocabulário ao serviço dos seus devaneios alucinatórios e de uma sua propensão à cólera e à indignação.

Denis Chabrouillet e o seu grupo criam mundos sem palavras onde o Sentido e o Homem lutam pela sobrevivência.”

http://www.theatredelamezzanine.com/site.html




Sobre a Companhia "Théâtre de la Mezzanine", no Facebook, encontrei mais isto:


“A companhia Théâtre de La Mezzanine, reconhecida pelos espectáculos imponentes e extravagantes, reinventa a Ópera com Dido e Eneias. Inspirando-se na obra barroca de Henry Purcell, o encenador Denis Chabroullet imagina uma nova Cartago, assente numa fábrica em ruínas, inundada por canos de água desordenados.



É neste cenário fantasmagórico, que espelha o caos do mundo e a beleza trágica do amor, que Dido e Eneias vivem os tormentos da paixão antes de serem capturados pelo destino.
Henry Purcell, pintado por John Closterman



Quem foi Henry Purcell ? (nasce em 1658 ou 1659 – morre em Novembro de 1695)


O maior génio entre nós todos” – diz, por ocasião da sua morte em 1695, um dos seus contemporâneos.


Mais de trezentos anos depois, Purcell é ainda considerado como um dos mais finos compositores britânicos.

O pai dele foi músico na corte de Charles II nos anos 1660.

Não há registo de nascimento de Henry que deve ter nascido em 1658 ou 1659, pois refere-se a si próprio, em 1683, como tendo 24 anos e na Abadia de Westminster assinalam que morreu em Novembro de 1695 com 37 anos.

Menino de coro na Capela Real até 1673, depois assistente do organista John Hingeston, de tempos a tempos era chamado para copiar músicas de outros compositores.

Em 1677, entra no grupo musical da Corte, “Os Vinte e Quatro Violinos”.

Por volta de 1679, torna-se organista da Abadia.de Westminster.

Escreve, então, as suas obras.

Ainda mais músicas: The Beatles e a canção "Michelle"


The Beatles - Yesterday


Boa semana, amigos! The Beatles - "Help"


sábado, 28 de maio de 2011

A minha primeira viagem a Lisboa

Devia ter onze anos quando fui a Lisboa, pela primeira vez.



Vejo-me numa fotografia com essa idade mais ou menos, a sorrir, um pouco atrevida, desafiando a minha mãe que me olhava pela lente...


Ia ser operada às amígdalas.

Foi o meu primeiro contacto com a dor física, e o choque continua presente, e volta à primeira nova dor.

A sensação de amargura que hoje posso ter ao pensar “por quê eu?”, tive-a muito forte durante esses momentos, que coincidiram com a minha primeira viagem a Lisboa...
Com certeza terei ido lá mais do que uma vez, para as consultas. Tenho uma ideia muito vaga de ver ruas enormes, árvores, casas velhas, andares altos.

Mas é essa ida ao médico que recordo: não me esqueci do quanto foi dolorosa a experiência.

Desde muito pequenina, sofri de anginas frequentes. Tinha febre muito alta e não conseguia brincar, a cabeça pesava.



Lá vinha a D. Eduarda - a enfermeira e parteira que nos pôs no mundo - dar-me injecções de penicilina, de três em três horas.


Zinaida Serebriakova


A maior parte das vezes, ao fim do dia vinha e passava a noite em nossa casa. Dormia num divã ao lado da minha cama.


Recordo a modorra dos dias, a meia sonolência em que ouvia, febril, os ruídos da rua de forma abafada.


Os miúdos que passavam a brincar com os seus aros de ferro, gritando uns para os outros, ou os carros que buzinavam para assustar os raros peões que se lhes aventuravam na frente.


Ou, pior ainda, se calhava ser domingo, eram os relatos de futebol que o vizinho ouvia na rádio e me davam uma sensação de angústia e solidão tremendas.



Ilka Gede


Dentro de casa as vozes tornavam-se confusas, irreconhecíveis, entre o meu cair num sono pesado, em que os pesadelos eram cheios de imagens de cores suaves, e o acordar, transpirada e vermelha, cheia de sede, a chamar pela minha mãe.


Fomos até Lisboa com certeza no táxi do Senhor Bretanha que era quem fazia todos os serviços de táxi para o meu pai.

Não me lembro da viagem, nem da chegada a Lisboa.
É tudo uma estranha nebulosa.

Resta fixa na memória bem viva ainda hoje a imagem do consultório. Ficava numa rua moderma de que não gostei.

E, também, a do hotel onde ficámos, por ser a minha primeira estadia num hotel...

Recordo o dia da operação, como se fosse ontem.

Vejo-me embrulhada num enorme lençol branco que me cobria até aos pés, sentada ao colo da enfermeira, uma mulher alta e forte que me segurava a cabeça com as duas mãos, para não a mexer.


A lembrança da dor ainda hoje a sinto. O choque foi enorme.

Não havia anestesia naqueles tempos, e senti os puxões com que o médico me arrancou as amígdalas e, logo a seguir, os adenóides que eu nem sabia que existiam!

Mais do que dor, havia espanto dentro de mim, depois de tudo ter passado. Mágoa e espanto.

Por quê uma dor tão grande? Como era possível que me fizessem “aquilo”? Por quê a mim? Por que é que os meus pais não tinham vindo salvar-me daquele sofrimento?

Eles ficaram lá fora, na sala de espera. Não sabiam o que me estavam a fazer? Como o tinham permitido?

Vejo o lençol cheio de pingos de sangue, oiço o ruído dos instrumentos a bater na taça de metal onde o médico os ia pousando, quando tudo terminou.

Não chorei. Não gritei. Não fiz birra. Calei-me.

Uma sombra caiu sobre os momentos que seguiram. Como um bloqueio, uma noite não vivida, mas contínua de dor e pasmo, que só termina quando lembro o hotel, já na manhã seguinte.

Era o velho Hotel Americano, na Rua 1º de Dezembro, naquele tempo um hotel moderno, hoje um hotel de dormidas, com mau aspecto.


O quarto ficava num andar alto, e pelas amplas janelas entravam o sol e os barulhos da rua. O céu azul tinha uma cor diferente e por vezes parecia-me "adivinhar" um cheiro a maresia e imaginava os barcos no rio, se bem que não soubesse muito bem se era o rio ou se era o mar. Imaginava-o da cor do céu, com ondas e os tais barquinhos vogando em cima delas.

Ilke Gede

Chegara a Primavera. Lá fora tudo era ruidoso, sentia-se a agitação, o bulício de uma grande cidade, sensação desconhecida para mim, habituada ao sossego da minha terra de província.

A primeira recordação são os pregões...

Estranhas vozes de mulher que gritam alto, numa voz cantada, apregoando o que trazem para vender.

Vendiam flores? Verduras? Limões?

Traziam à cabeça as canastas das sardinhas - de que fala Cesário Verde?

Era uma melodia desconhecida que me trazia de volta à vida normal e me entretinha enquanto esperava que o tempo passasse e as dores se atenuassem.

Deitada na cama, ficava a ouvir.

Ofendida, magoada, recusava-me a falar fosse com quem fosse. Culpava tudo e todos daquela ofensa.

A minha mãe estaria, com certeza, ao pé de mim, mas não me lembro.

O meu pai voltara para Portalegre.

Vejo-me ali sozinha.
Lá fora havia pessoas felizes, pensava.
Tinha um monte de livros em cima da cama. Não os lia, não me apetecia. Olhava para fora. Ouvia as vozes.

Calava-me. Podia falar mas não falava, porque não queria.

A única consolação era poder comer os gelados que quisesse. Magra consolação. Eu que adorava os gelados de tostão que se vendiam na minha rua, tinha perdido por completo a vontade de comer gelados...

Uma manhã o telefone tocou. Era a minha tia, irmã do meu pai, que telefonava de Portalegre.

Estava sozinha e atendi.

Do lado de lá do fio, uma voz perguntava como estava. Tive vergonha de não responder. Falei.

Não reconhecia a minha voz que sentia presa, nasalada, diferente.

Duas ou três frases, e pousei o auscultador. Deitei a cabeça nas almofadas.

Quando a minha mãe chegou, falei-lhe, contei do telefonema, com um ar natural.

Aceitei, contente, o gelado que me trazia da rua.

leitaria de Lisboa



Algumas das pinturas que usei são da pintora Ilka Gedo. Encontrei-as in blog Art Inconnu (Ilka Gedo (1921 - 1985).


A menina com as bonecas é da pintora russa Zinaida Serebriakova - que me deslumbrou há uns anos em Moscovo, na galeria Tretiakova.


http://falcaodejade.blogspot.com/2009/07/uma-vista-de-olhos-pela-pintura-russa.html


Já agora: as fotografias de Lisboa e do Hotel Americano foram tiradas durante a visita das minhas amigas da Cozinha dos Vurdóns, quando nos encontrámos no Café Nicola... A Rua 1º de Dezembro era ali mesmo. Fomos juntas dar um passeio... Lembro-as com saudade.



Sobre os pregões de Lisboa encontrei:




Anat Cohen e o seu Quarteto, hoje no Estoril




Birdland Jazz: Anat Cohen e Duke Heitger e a Louis Amstrong Centennial Band, em 2009



HOJE JAZZ E ANAT COHEN QUARTET

Estoril Jazz 2011
28 Maio 2011, 21H30
Casino do Estoril Auditório, Cascais


Diz a saxofonista Anat Cohen: “O meu primeiro contacto com o Jazz foi através da música de New Orleans”.



Depois interessou-se pela música de Sydney Bechet: “havia tanta paixão e tanto fogo na sua maneira de tocar...”

Sidney Bechet capa do CD com a inesquecível "Petite Fleur"





Anat cresceu em Telavive e a sua primeira experiência foram na banda de “Jaffa Conservatory’s Dixieland band”.


Hoje é uma das mais famosas jazzistas, na cena do jazz moderno, e a influência de Bechet parece já um pouco remota...




Em 1996, Anat Cohen começa os estudos no “Berklee College of Music”, em Boston.
Mais tarde muda-se para New York, onde reside desde 1999.

Dedica-se ao Jazz moderno e ao tradicional, música clássica, “choro” Brasileiro, tango Argentino, e uma mistura de estilos Afro-Cubanos, Anat Cohen estabeleceu-se como uma das vozes da sua geração quer no “tenor saxophone” quer no clarinete.
A sua gravação mais recente, Clarinetwork, é uma sessão “ao vivo” na Village Vanguard.

Celebrava-se nesse momento (2009) o centenário do nascimento de Benny Goodman.

o clarinetista Benny Goodman


http://youtu.be/AAq3zcHTWwA

Há algo de Benny Goodman e do seu "mellow", nessa gravação, no entanto com uma maior agressividade rítmica.

Cada vez mais me sinto apanhada pelo clarinete. Vou-me entregando a ele com suavidade.”


Em 2008, Anat grava o álbum “Notes From the Village”.

Anat Cohen dirige então um quarteto formado por alguns dos mais conhecidos jovens músicos de NewYork - tais como o pianista Jason Lindner, o bassist Omer Avital, o baterista Daniel Freedman, com o acompanhamento do guitarrista Gilad Hekselman.

Tocam juntos também algumas composições escritas por Coltrane ou interpretações próprias de algumas canções de Fats Waller, John Coltrane, ou de Sam Cooke.


Quando me preparo para gravar, o que pretendo é capturar a liberdade, o risco, a qualidade aberta que o grupo consegue quando se apresenta ao vivo."


Ouçamos um pouco de Anat Cohen. Mas antes deixo-vos duas interptetações de Sidney Bechet:


1. Sidney Bechet Creole Blues
http://youtu.be/t7MT3OvivVM




E já agora, ouçam um dos grandes mestres de Anat, Benny Goodman : "O Rei do Swing", "O Professor", como era chamado...

http://youtu.be/ZPQTckQDGAc
http://youtu.be/45Kx4KzfMn0



E, finalmente, mais 3 interpretações de Anat Cohen...



Bom fim de semana!


(Nota: falo do Jazz do Festival do Estoril, mas apesar de estar ao lado mesmo, não vou lá.

Não calhou, não pensei nisso a tempo... Não quero que os meus leitores sejam induzidos em erro!)