sexta-feira, 28 de março de 2014

Easy Rider, de Dennis Hopper e "Its Alright Ma (Im Only Bleeding)"




Há dias comprei o DVD do filme “Easy Rider” que nunca tinha visto - ou teria esquecido?-  e foi um choque. Como todos os choques, acabou por me fazer bem: agitou-me e a agitação move-nos sempre em frente, acho eu. 

É um filme duro, um filme triste: é um filme que faz pensar.

E pensar faz bem! Chega de ver mundos parados! Chega de olhar para o lado a fingir que não vemos. Chega de indiferença e de egocentrismo. Há outros mundos a compreender!


Um filme puro foi o que pensei. Aqueles três, perdidos pelas estradas da Califórnia descendo até ao Mississipi, à procura da liberdade e da América profunda.
Rio Mississipi

Passando junto ao Grande Canyon dos filmes de cowboys,  são quase personagens infantis, na sua alegria da descoberta. A meta deles é complicada: vão ver o Carnaval de Nova Orléans, na Louisiana. 

Billy (Dennis Hopper)- do nome famoso de Billy the Kid, Wyatt (Peter Fonda)- do nome de Earp Wyatt, o sheriff mais famoso do oeste e George Hanson (Jack Nicholson) - o advogado que bebe de mais...



Infelizmente, existe a intolerância que destroi as relações: há mundos estragados em todos os tempos e por toda a parte; há mundos decadentes; há mundos atrasados e ignorantes; há mundos que julgam e que condenam. 

Há mundos que matam os que são diferentes.

Eles querem ser livres! Lá vão, entre um charro e uma conversa, sem perceber que estão já condenados. No fim, dirá Jack Nicholson- George: “Lixámos tudo”. 

Por inconsciência talvez. Por honestidade e ingenuidade? talvez. Vão à procura de algo diferente do que viam. Querem paz, amor, não querem a guerra... 

E o que encontram?

Cedo "se percebe que não há sentido para nada, nem para tentar", "perdes-te e reencontras-te", como diz a canção ("It's all right, Ma, I'm only bleeding" - Tudo bem, Ma, estou apenas a sangrar).


Darkness at the break of noon/eclypses both of sun and moon/ to understand you know to soon/there’s no sense in trying”, canta Bob Dylan. 

"Percebe-se que se é apenas mais uma pessoa que chora".

"You discover that you’d be one more person crying
So don’t fear if you hear
a strange sound to your ear
It’s all right
Ma, I’m only sighing.(…) 

And all the rules
of the road have been lodged
It’s only people’s games that you got to dodge
And it’s all right, Ma, I can make it.

Thinking you’re the one
That can do what’s never be done
That can win what’s never be won
Meantime life outside goes on around you.
You lose yourself, you reappear
You suddenly find you got nothing to fear
Alone you stand with nobody near.

Although the masters make the rules
For the wise men and fools
I got nothing, Ma, to live up.

(…) And if my thought-dreams could been seen
They’d probably put my head in a guillotine
But its’ all right, Ma, It’s life, and love only.”

Canção da banda sonora do filme, tão bela como a Balada de Easy Rider, quase anunciar de uma tragédia que virá, inexorável.


imagens do movimento "hippie" anos 70




Porque o diferente, o que procura outros caminhos pode ser incómodo, porque o diferente é para muitos insuportável porque põe  em questão as suas certezas que são a sua segurança. Ser-se livre é um desafio perigoso frente a essa gente, feita de intolerância e prepotência.
depois do encontro na cadeia...


História banal dos anos 70, dos tempos do “peace and love”, do festival Woodstock, do movimento dos hippies? Muito mais!




Dois amigos decidem partir, nas suas motos potentes, e  atravessar a América porque querem ir ver o Carnaval de New Orleans!

História de loucos, dirão. Não, história da curiosidade, da abertura, e da procura da liberdade a todo o preço, sem olhar às regras estabelecidas.

“Although the masters make the rules/For the wise men and fools/I got nothing, Ma, to live up.”


Cavalos Selvagens, de Mane-Katz

Vão para Sul, atravessam estradas e autoestradas infindáveis, terras arenosas, viajam paralelos ao Grande Canyon, passam por campos verdes onde cavalos selvagens andam soltos. Paisagem idílica por vezes. Assustadora na noite.


Simberg, Contos de Fadas, 1887

Param numa comunidade hippie,  e seguem outra vez, livres, à aventura, de cabelos ao vento, para o Sul.

Comunidade "hippie"

As motos vistosas, a maneira de vestir, os cabelos compridos de Billy (Dennis Hopper) a impassibilidade de Wyatt (Peter Fonda), com o seu “joint” sempre na boca, enervam os habitantes das terras por onde passam. 
Bob Dylan

Cabelos compridos? Vadios? Cadeia!

Na cadeia, encontram o 3º elemento do drama, o jovem advogado George Hanson (Jack Nicholson), filho de um senhor da terra, que tem o defeito de beber demais e vai, regularmente, parar à cadeia, onde é muito bem tratado porque paga sempre. E dão-lhe aspirinas para a ressaca inevitável do day after...

Desinteressado da vida que faz, decide ir com eles ver o Carnaval da Louisiana...

E lá continuam, dormindo à luz das estrelas, embrulhados nas mantas, fumam marijuana e riem-se de tudo.

Num restaurante à beira da estrada a recepção, com sheriff e vigilantes e populares, é agressiva.  Insultos, provocações que os levam a desistir de comer e a partir de novo. Nos hotéis, não os recebem, e são obrigados a acampar por ali.

Falando sobre as pessoas que encontraram, George diz: “No fundo eles têm medo de nós. Porque nós somos livres. Eles pregam a liberdade individual, mas não são livres. E não suportam a nossa liberdade.”

É como um aviso. Ou uma premonição. O subdesenvolvimento mental mata. O espírito retrógado é assassino. A intolerância tem de abater o que a contraria, o que é diferente, o que é verdadeiramente – e não hipocritamente- livre.



Billy, espírito mais simples, ingénuo, não entende: “Eles têm medo de nós?” pergunta, espantado, a rir-se. De facto, eles não fariam mal a uma mosca...

O advogado George tinha razão. Os “outros” não perdoam aos que são verdadeiramente livres. Nessa noite, enquanto dormem, um grupo, em “expedição punitiva”, espanca-os tão violentamente que George morre, ferido na cabeça.

Os sonhos acabaram? Decidem que vão continuar até New Orleans, porque seria o modo de homenagear George: ele queria que vissem o Carnaval, mesmo sem ele.

Em New Orleans, a ver o Carnaval...

A "balada" continua, mas o encanto quebrara-se. O carnaval pouco lhes interessou. Alheiam-se de tudo, e vão passar a noite no cemitério, pedrados, com duas prostitutas.
Na manhã seguinte, iniciam o regresso a casa. Mas o destino decidira que não iriam chegar a casa...


o escritor da "beat generation" Allen Ginsberg



Filme de 1969, na linha dos "road movie" (filmes que relatam uma viagem), escrito por Peter Fonda e Dennis Hopper e realizado por Dennis Hopper. 
o escritor Jack Kerouac

Considerado um filme da contracultura, ou cultura alternativa, ou underground, nos EU, cultura essa inspirada pela Beat Generation dos anos 50 - movimento de que participam os escritores Jack Kerouac, William Burroughs e Allen Ginsberg. 


o escritor William Burroughs

Este é o filme de uma geração de "utopias", um filme que fala das tensões de uma América de proporções enormes e de culturas diversas e da ascensão do movimento hippie e da sua queda. 
Wyatt Earp

Os nomes de Billy e Wyatt foram uma escolha intencional - decidida por Fonda e Hopper de  homenagem a Wyatt Earp e Billy the Kid, heróis americanos...
Billy The Kid




2 comentários:

  1. Parece um bom filme!
    Nunca vi.

    Um beijinho e um bom fim-de-semana :

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  2. Adorava ver o filme agora, com todos esses meus ídolos tão jovens! Gostei do teu resumo e das tuas reflexões ao respeito. Bom trabalho.
    Beijos

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