segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Uma história policial: "Morte de um Desconhecido"...


 Capítulo I

Edward Hopper, Falcões da Noite

"Erica estava sentada ao lado dele. Tinha envelhecido e perdera a vivacidade do olhar que tanto o impressionara, meses antes. A luz da tarde  descia sobre Roma. Havia uma grande melancolia no olhar daquela mulher.
Tudo começara muitos meses antes: “Sim, naquele dia de Inverno”, pensou Michael Brenner.
Ela dizia-lhe, agora:
- Gosto de o ver!
E sorriu-lhe:
- Se me oferecer um cigarro, desta vez aceito.
- Com muito gosto! Dantes não fumava, pois não? Ou engano-me?
-Tem razão. Hoje, fumo. Sou ao contrário dos outros, teimosa como sabe. Sou teimosa e detesto proibições. Proíbem-nos de fumarem por toda a parte? Então, eu decidi fumar!
Os olhos pareceram animar-se, cheios da costumada ironia. Continuou:
- Com o que se vive nesta vida, passa-nos a vontade dos “ecologismos” e coisas parecidas em que julgámos acreditar. E as ilusões também se vão. Passa tudo, como o vento da Primavera...
- Não acredito que a Erica não guarde as ilusões...
- Lembra-se da Susy? Ela tinha ilusões.
Edward Hopper, Quarto em Brooklyn

- Como posso esquecê-la? Tudo começou por causa dela! Conhecemo-nos por isso mesmo.
- Não consigo falar dela...
Michael pousou-lhe a mão no braço, com ternura, e acrescentou.
- Ainda é cedo. Vamos esperar mais um pouco, não é?
Ficou a olhar para ela, sem falar.
Sim, tudo se passara muito antes, num dia de Inverno, na Piazza della Rotonda
E começou a lembrar-se do modo como entrara naquela história.
Edward Hopper, Café 1927



 Olhava para fora, através dos vidros do restaurante. As pessoas passavam, rápidas, agarradas aos casacos quentinhos. O frio instalara-se, mas o sol continuava a brilhar, intenso. Ouvira falar dos  magníficos dias de Inverno de Roma e estava a vivê-los.
Do lado esquerdo, erguia-se a massa pesada e harmoniosa das colunas do Panthéon.
Piazza della Rotonda, Pantheon

Habituara-se a contá-las.
“Quinze? Seis frontais... As outras...”
Gostava de entrar lá dentro quando a chuva caía, fina, em diagonal, do alto da cúpula aberta.
O restaurante era agradável, tranquilo. Tinham-lhe dito que era o sítio onde se comiam os melhores spaghetti alle vongole de Roma.
Sentado na mesa do canto, podia contemplar um pouco da Piazza e, ao mesmo tempo, ver a sala de jantar. Interessava-o o casal da mesa ao lado. Comiam, em silêncio, como se já tivessem dito tudo um ao outro.
Ao fundo, mais duas ou três mesas ocupadas. Aqueles dois eram conhecidos. Notava-se nos pequenos gestos dos empregados, numa palavra dita em tom mais íntimo.

Foi o homem quem quebrou o silêncio. Falava em inglês e, por isso, por ser a sua língua, Michael pôs-se a ouvi-los, involuntariamente.
E foi aí que tudo começou..."



(Escolhi as imagens sempre expressivas de Edward Hopper)

5 comentários:

  1. E agora?...
    Fico à espera da continuação.
    Gosto imenso das imagens. Gosto de Edward Hopper.

    Um beijinho e até já...no próximo capítulo:)

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  2. A "Morte de um Desconhecido" vai gostar, tens um sexto sentido para as análises psicológicas, para a descrição das pessoas e das coisas. Vou saborear aqui pouco a pouco a tua novela, foi uma boa ideia trazê-la, por fim um pouco da tua alma!!
    As ilustrações, acertadíssimas.
    Beijinho

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  3. Tinha deixado aqui uma mensagem no dia em que colocou o post...:(

    Gostei de ler e espero a continuação...
    Gostei muito das imagens que escolheu.

    Um beijinho grande e bom fim-de-semana:)

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