Viveu no Instituto de Santo Antonio dei Portoghese, na Via dei Portoghesi, em pleno centro histórico onde estava alojada como bolseira. Ficámos amigas porque a Estrela era um amor, uma amiga verdadeira, uma pessoa invulgarmente generosa.
Florença
Lembro-me como me
falou entusiasmada da cidade de Florença, quando voltou de lá. Como tinha apreciado o trabalho de Vittorio Gassman, o grande actor que ela vira actuar durante o tal estágio em Florença. E como se sentia feliz por ter a oportunidade de estar a viver em Itália.
Quantas vezes a Estrela ia a nossa casa e ficava lá o fim de semana ou mais. Vivíamos fora de Roma, na Via Cassia entre La Giustiniana e La Storta.
Campo De’ Fiori
Mas a embaixada não era longe do Instituto e, então, o Manuel combinava encontrar-se com ela no centro – geralmente na Piazza Navona ou no Panthéon e vinham juntos para nossa casa, na Cassia. Outras vezes ia eu ter com eles e almoçávamos num restaurante no Campo De' Fiori. O Manuel adorava o Campo De' Fiori!
A última vez que estivemos os dois no Campo De' Fiori foi com outra grande amiga, a Anna Marra, jovem mulher de muita cultura a quem devo tantas das belas coisas que vi em Roma, as idas ao Teatro e às Exposições.
Nesses anos, quantas vezes fomos todos almoçar ao restaurante Da Mario, na “Piazza delle Copelle”, às vezes com o João de Almeida Santos, outro amigo de tempos tão saudosos.
Quando a Seiva-Trupe pôs em cena a primeira peça do Manuel Poppe, Os amantes voluntários – a Estrelinha estava presente, como sempre esteve na “nossa” vida quando podia para nos dar a companhia dela.
A Seiva-Trupe era - e é- a grande Companhia de Teatro do Porto de que Estrela Novais foi uma das criadoras, com António Reis e Júlio Cardoso.
Estrela Novais era uma
profissional, uma pessoa que fez tudo sozinha, cuja vida nem sempre foi fácil
mas que conseguiu atingir o seu sonho: ser actriz, trabalhar no teatro! Sei que estudou sempre para o conseguir e se dedicou completamente ao teatro.
Foi uma grande actriz - inteligente, sensível, trabalhadora e séria. Por vezes, nessas estadias em nossa casa, ela dizia-me:
“Maria João esta noite vou ficar aqui no sofá da sala, se não te importas. Fico a ver uns filmes, a aprender o italiano.”
Ela queria aprender, vendo. E as televisões privadas passavam filmes durante toda a noite. Como em Itália os filmes eram dobrados (em italiano, claro) era de facto um “mergulho” na língua. Na “bella língua italiana” como ela dizia. Língua que falava perfeitamente passados uns meses.
Na vida passageiros, como folhas mortas, onde tudo ganhamos e tudo perdemos...
Não sabia que estava doente a Estrelinha. Nunca me disse, nunca se queixou, nunca falava dos problemas dela – não porque não tivesse confiança em mim mas porque não queria “incomodar” os outros.
Não interessa dizer mais nada. É uma grande tristeza para todos. Os meus filhos consideravam-na uma amiga, quase da família. Conheceram-na tão pequenos, gostavam dela e a Estrela era muito amiga deles.
Foi, aliás, o meu filho a mandar a notícia à minha filha, também fora de Portugal, para que ela me dissesse. Tudo isto para eu não ter o choque de ver a notícia no telejornal, ou no Facebook, sem estar preparada para isso.A Estrela e eu falámos durante
a doença do marido e vi a dedicação enorme desta mulher que todos os dias
atravessava o Tejo para estar com ele, nem que fosse um bocadinho. Mas nunca nos víamos, porque ela tinha muito trabalho e eu vivia longe. Tenho pena...
A Estrela nunca esquecia uma data festiva - ou triste - sem telefonar. Queria estar presente. No dia 25 de Abril, todos os anos era ela a primeira a telefonar! E nunca esquecia uma data dos anos, nunca um Natal sem uma palavra dela.
Vou ter saudades desse telefonema em Abril...Os Festivais de Teatro em que estivemos, Estrelinha, com os amigos italianos comuns, tudo se mistura na tristeza de hoje - e tenho tantas saudades tuas já, minha querida, minha Estrelinha.
flores selvagens
Se houver um outro
mundo, espero que se encontrem os dois e até o nosso
cão Zac de quem foste amiga. Se não houver, há de certeza uma estrelinha para todos, no meio do céu de Van Gogh!
Acrescento apenas umas palavras: gostei da "despedida" que lhe fizeram os colegas e amigos na página da Companhia Seiva-Trupe:
“A Estrela resolveu ir Voar...Voa, Voa, Voa Estrelinha!”
(1) O dia 8 de Março é considerado o “dia da Mulher”, desde 1908 na América onde numa fábrica morreram 129 operárias. E se revoltaram. Em Itália, o dia da Mulher festeja-se desde 1946. É o dia. Foi decidido nesse data, numa Assembleia da União das Mulheres Italianas de Roma, que fossem celebradas as lutas pela Igualdade das Mulheres. A flor escolhida foi a acácia mimosa – flor delicada mas resistente e, por outro motivo, também: é uma flor simples e bonita e que não é cara!
Lamento, a morte da actriz e da sua amiga.
ResponderEliminarUm post tão bonito para a homenagear.
Beijinhos:))
Obrigada, Isabel. Foi uma grande amiga nossa em Roma onde ela foi bolseira para estudar Teatro em Florença. E continuámos amigas, como conto...
EliminarSinto a morte da tua amiga Estrela. Uma das coisas mais duras da velhice é que vamos perdendo pessoas muito queridas do nosso círculo, as de mais idade já se foram todas há muito tempo. Custa habituarmo-nos à ideia de que já não estão aqui, que se foram embora para sempre. A mim está-me a passar muito, e mais que passará, até que seja a minha vez...A vida é assim, temos que levá-la com filosofia e agarrar-nos a tudo de bom que ainda vamos tendo para aproveitar cada momento. A primavera está a chegar, com toda a sua alegria e esplendor! Beijinhos grandes
ResponderEliminarSei que entendes, ambas sofremos desse mal! Mas cá vou tentando entrar num novo ritmo de vida. De que precisava, eu sei, mas não é tão simples como julgava. A fisoterapia tem-me feito muito bem! já fui a 3 sessões e noto a diferença. Também há dois dias seguidos que vou passar um tempo na praia. A Halyna deixa-me lá e, depois de tratar das coisas dos filhos, passa a buscar-me. Ajuda muito. Beijinhos e esperemos pela Primavera. Este Inverno foi muito duro...
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