quinta-feira, 6 de agosto de 2015

E a vida parou, em Hiroshima. Passam hoje 70 anos!

Foto de Ryoko  Kasai (agosto 2015, FB)


Falar ou não falar de certas coisas? Memória para sofrer? Masoquismo? Para quê?
Não. Não penso isso! É difícil sempre falar até porque há um cansaço e uma forma de desilusão por vermos que as coisas más voltam a acontecer… 
Quando aprenderá o homem a não ser um monstro para outro homem? Quando acabarã o horror?



Para descrever o que se passou em Hiroshima (e quem diz Hiroshima diz Nagasaki) não há palavras adequadas.

Quis ver o documentário do programa “Thémas” da Arte/TV que passou na 3ª feira. Forcei-me porque é importante saber tudo!
Não deixar passar - fingindo que "já" não vale a pena saber e "falar das coisas": saber o que foi um horror, um acto indesculpável sobre civis indefesos! 

O que foi o desaparecimento da face da terra de uma cidade bonita e alegre, numa tranquila manhã de Verão de 1945, em alguns segundos apenas. 

Frente aos olhos desfilam as imagens do horror: a cidade arrasada, os mortos-vivos, os corpos queimados, derretidos, com pedaços a cair. O espanto nos olhos, mais do que a dor que o choque ainda não deixou sentir tavez. E a contensão, o silêncio.
Vários sobreviventes entrevistados: alguns eram crianças, então. Um deles era médico, outra estudante.  Um deles conta, emocionado:
“Estava um dia bonito, eu ia com a minha mãe apanhar o autocarro para a escolaPassava um pouco das oito horas”.

O autocarro desintegra-se em mil pedaços. Ferragens. Corpos são projectados. Lâminas  de aço caem. A mãe morre. Ele sobrevive.
Outro conta: “Muitas crianças tinham sido enviadas para o campo. Esperava-se que algo ia acontecer de terrível, não se imaginava o quê. As famílias voltam para a cidade. No dia 6 de Agosto, milhares de crianças ficam órfãs, sem ninguém para as ir buscar, ou se ocupar delas.”


Uma senhora conta: “Estávamos em casa eu e os meus irmãos. A mãe tinha saído. Um clarão, um ardor. Não percebíamos nada. A mãe so voltou no dia seguinte, arrastando-se como um cão queimado. Não tinha forma humana. Viu-nos e morreu".

pintura de Uemura Shoen



Mais: “Estava no jardim com a minha namorada, junto ao pequeno lago. Era uma manhã belíssima. Ela morreu queimada logo. As minhas orelhas e a pele das costas derreteu. Salvei-me.”
 Uemura Shoen

Outro senhor, que não aguentava as lágrimas, dizia: “Oh! Sim, era um dia lindo de Verão. Estava calor às oito da manhã. As cigarras cantavam, como agora.”


 Parou, olhou em volta e desatou a chorar.
“Sim, as cigarras cantavam como hoje.”

Como escreveu, sabiamente, o poeta Matsuo Bashô:

As cigarras vão morrer
mas no seu canto

nada o anuncia

Não vale a pena acrescentar mais palavras. As radiações que ainda hoje matam? Lembro a senhora Yoko minha amiga que se lamentava: “Dantes a minha família morria de  coração. Hoje morrem todos de cancro…”
 Lutar pela paz? Para que nunca mais aconteça? Sim, claro. De todos os modos. Uma dessas maneiras é falar abertamente das coisas. E censurar o que há a censurar.

"Na asa do vento
Ligeira e longínqua
A andorinha
(Soseki)

Ficam as imagens. E deixo os fogos de artifício, no Japão, homenagem aos mortos de tantas tragédias: tsunamis, tremores de terra, fugas radioactivas. 
Hiroshige

as minhas flores,de Etsuko, para Hiroshima



Hiroshima, a 6 de Agosto de 1945. Nagasaki, três dias depois, a 9 de Agosto: para que as almas possam repousar e ter um pouco de beleza à sua volta.

6 comentários:

  1. Ainda hoje os EUA
    não pediram desculpa ao mundo

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  2. É horrível pensar que tudo isso aconteceu.
    E o mais horrível é saber que guerras horríveis continuam a matar tantos inocentes, no mundo de hoje.

    O poder e o dinheiro continuam a valer mais que milhares de vidas.

    Um beijinho grande e um bom fim-de-semana:)

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  3. Vi ontem o documentário que deu na RTP1.
    Impressionante...

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  4. A Truman atormentou-o no final da vida a ordem dessas duas bombas malditas, embora nunca o reconhecesse oficialmente. Mas o importante é o horror que aconteceu, qualquer frivolização com este tema está fora de lugar.

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  5. Tinha deixado aqui, ontem, um comentário, que pelos vistos não seguiu.

    Acho um bocado ridículo essa coisa de virem pedir desculpa ao mundo (como já aconteceu noutras situações). Não somos culpados pelo que fizeram os nossos antepassados/antecessores; somos é culpados do que estamos a fazer agora!

    É só a minha opinião. Pedir desculpa e não mudar nada, não adianta para nada, seja em que circunstâncias for.
    Há tanta falsidade na política.

    Um beijinho e um bom dia:)

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  6. Gostei muito de ler este registo. Acabei por não trazer este horror para que nunca se varra da memória. Revi um dos filmes sobre o tema, que, ainda hoje, me arrepia: "O Império do Sol" e não é o mais terrível..., embora espelhe o horror que foi.
    Beijinho.

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