sábado, 31 de outubro de 2020

Morreu o actor Sean Connery: James Bond morreu. Sim, "Only diamonds are forever"...

O Agente Secreto mais conhecido da Literatura é James Bond e o seu criador foi Ian Fleming. 

O "pai" do Agente 007 morreu em 1964 - e hoje morreu o que melhor representou a sua "criatura", o actor escocês Sean Connery.

Ian Fleming criou o mais famoso espião da história...

Nasce em 28 de Maio de 1908 em Londres e morreu em 12 de Agosto de 1964 na Cantuária. 

O seu primeiro livro com a sua personagem é "Casino Royale" (1952). São inúmeros os livros que depois publicará com ele.

Nasceu numa família de origem escocesa, estudou em Eton e Sandhurst e seguiu o caminho normal de um herdeiro de família rica. Passou pela Universidade de Genebra e de Munique e segue a carreira de jornalista.

  Na segunda Guerra mundial, Ian Fleming é chamado pelo Almirante John Henry Godfrey para fazer parte da Divisão de Inteligência Naval (Serviços Secretos).

É essa experiência, além da de jornalista, que vai dar ao escritor inspiração para a personagem de James Bond (1).

Escreve inúmeros livros com muito interesse para quem aprecia o estilo. Eu aprecio.

Depois, a sua "criatura", o agente dos Serviços Secretos Britânicos  encarnou sob a figura do actor Sean Connery - e mais nenhum actor conseguiu ficar tão ligado à 'imagem física' do espião. 

O próprio actor britânico Roger Moore -que foi também um James Bond- dizia que nenhum fora tão bom como Sean.

Não se pode dizer que Sean Connery (2) tenha tido uma biografia que se adapte à "personagem" que viveu depois. 

O actor nasce perto de Edinburgh, deixou a escola aos 14 anos e começou a trabalhar como leiteiro na sua terra. Nada havia na sua biografia indicasse que se transformaria no actor-símbolo do espião perfeito em que depois se tornou. 

Em 1948, entrou para a Marinha. Um dia começa a fazer pequenos papéis no teatro, shows televisivos e só mais tarde será escolhido para alguns filmes de importância relativa. 

O primeiro James Bond que representa é no filme  Doctor No”,  realizado por Terence Young, em 1962.

Recordo um dos grandes livros de Ian Fleming (li muitos livros dele quando era mais nova) intitulado  “Diamonds are Forever”.

Talvez fosse pelo título que era bem verdadeiro. Tudo passa, tudo morre, só os diamantes são eternos. Aliás os títulos de Fleming eram sempre  especiais : “You only live twice", “Never say never again”, “Live and let Die” ou "For your eyes only".

Hoje, depois da morte deste actor penso que foi de facto o herói da personagem de Fleming. Infelizmente - e parafraseando o título de Fleming - "só mesmo os diamantes duram para sempre".
Sean Connery, o Escocês, nos USA

Costumava apresentar-se: "My name is Bond, James Bond". Despedimo-nos pois dele para sempre. Boa viagem, James Bond-Sean Connery!

Long and quiete life - in heaven-  to James Bond, 007 Agent ! E para Sean Connery, a sua imagem...

(1) O seu primeiro livro com esta criação é "Casino Royale" (1952) várias vezes levado ao cinema.

(2) Sean Connery nasceu em 1930 na área de Fountainbridge. Morreu hoje dia 31 de Outubro, com 90 anos.

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

TOMAZ DE FIGUEIREDO UM GRANDE ESCRITOR

Quero falar hoje de Tomaz de Figueiredo (1) romancista e contista português excepcional. 

Albertina Fernandes que muito se interessou  pela obra do autor escreveu, em 2013,  "Tomaz de Figueiredo Ensaio Crítico-Biográfico" (2).

Na Dedicatória do citado Livro, a ensaísta cita uns versos de Tomaz de Figueiredo sobre o seu amor à língua portuguesa.

"Ó minha Amada, ó Língua Portuguesa,

Roubaram-me de ti e de te beijar,

de seres a minha carne e o meu sangue.

(...)

Ó Língua Portuguesa, ó meu fantasma,

para o silêncio o nunca-mais da morte,

Muito de ti que ninguém mais sabia.” (Poesia I:174)

É ela ainda que refere uma frase do escritor que condensa a sua estética literária e a sua paixão pela nossa língua:Harmónica, plástica, policroma, sonora, assim a escrita busque o imponderável do pensamento, o inefável do sentimento, o estertorar e o amar”.

Quero lembrar que Tomaz de Figueiredo existe e é um grande escritor, apesar de ninguém falar dele. 

A verdade é que não se fala nada de ninguém. E tantos escritores extraordinários temos na nossa Literatura. Quem o conhece ou quem o lê? Digo apenas que perde muito quem o não tiver lido.

Se “A Toca do Lobo” (1947) é o é o seu romance mais famoso, a sua auto-biografia (3), Tomaz de Figueiredo é, porém e ainda, um extraordinário artista do conto e um mestre da arte de escrever um português riquíssimo e puro.

E os seus contos? Vou-me referir apenas a alguns deles, incluídos nos dois livros, "Vida de Cão" e "A outra Cidade".

Em "Vida de Cão" descobri  há muitos anos “O Muro Amarelo”  que nunca esqueci. (4) É uma história de sentimentos delicados, de um possível mas nunca realizado amor.

História da sua juventude que o autor vai tentar "recuperar" anos mais tarde, na quinta onde existe ainda o tal muro amarelo. História real? Sonhada, afinal?

Sete anos mais tarde a recordação aproxima-se mais de um sonho vivido em certa tarde de Outono em que avistara - ou sonhara, apenas?- uma menina sentada  nesse muro amarelo. Como "reviver" aquilo que não sabe se existiu?

“Naturalmente que tinha sonhado, mas deveria ter sido então sonho muito firme, tão firme que lhe ficava enclavinhado nos sentidos: ilha de manhã de nevoeiro a que jamais o pescador volta a abicar, da qual, até por vergonha nem sequer fala conquanto siga a retina desesperadamente fiel à nascente que lá descobriu.” (op.cit. pg 131)

Imaginara? Fora real essa visão? Tinham conversado mesmo? Ela tinha o cabelo separado em duas partes pelo risco e apanhado atrás. Vestia um vestido preto. Ou tinha apenas imaginado?

Era aquele o portal da casa da vila?! Mas não podia ser? E o muro amarelo onde tinha ficado?! Esse muro amarelo?...” (op.cit.pg.134)
 
Sentimos dentro de nós a nostalgia dele, de um mundo irrecuperável - o da infância e juventude - e, talvez também, a saudade do amor perdido. 

Vida e morte e a passagem entre uma e outra é o destino do humano. Muito se vive, se sofre, se ama, entre esses dois momentos. E o que estará do lado de lá?

O Anjo da Vida, o 'Anjo musicante' de Rosso Fiorentino

O Anjo da Morte, esse que tem de vir, é-nos anunciado por uma suave música íntima e nada tem de assustador e de terrível, pois de asas brancas, embora pela noite caminhe” - escreve Tomaz de Figueiredo em A Outra Cidade" (5). 

Seja o que for o "lado de lá" o poeta acredita que o fim será anunciado por uma música suave. E o Anjo terá umas asas brancas.

Poderia lembrar outros contos cheios de humanidade, incluídos igualmente no livro acima referido, "A Outra Cidade". Por exemplo, "Um senhor triste", "Cova Funda", "Gente de Paz" ou “Histórias de Bichos”.

Outras histórias da vida de pessoas simples, pelas ruas, em cafés, nos bares ou mesmo nos transportes públicos como “Um senhor triste” têm grande sensibilidade humana.

E a esperança onde fica? A esperança está em cada um de nós, mais ou menos funda.  O escritor dá-nos apenas a ideia da passagem obrigatória pela vida. Esperando o dia em que “o Anjo da Morte, esse que tem de vir", nos anuncie o fim com uma suave música.

Quem o leu?, pergunto outra vez. Há uma tão grande poesia nos livros de Tomaz de Figueiredo! Ternura e poesia, dor, cortados muitas vezes por uma ironia corrosiva. Recordações de outros tempos, de outras terras, de outras gentes, de outros amigos. 

E vem a lembrança de Coimbra, dos anos de estudante. Coimbra um dia "revisitada" com um velho amigo. O que resta desses momentos de ouro?

 “Caminhos da minha vida

Não serão os desta rua

Mas só de corpo, que a alma

Em Coimbra continua.”

Teimosa e dolorosa fica a saudade daquilo que passou um dia e não voltará mais.

"A que era de chegar, nunca chegou.

Passaram anos, passou a vida.

Talvez que haja caído, perdida,

Em braços de quem a não amou.” (6)

É importante ler Tomaz de Figueiredo. É um dever e será sem dúvida um grande prazer.

Uma boa notícia é que as suas obras foram reeditadas a partir de 2003 na Imprensa Nacional Casa da Moeda (*). No entanto, é possível encontrá-lo nas 'livrarias de usados' online.

***

(1)    Nasceu em Braga no dia 6 de Julho 1903 e morre em Lisboa a 29 de Abril de 1970. Com poucos meses vai viver para Arcos de Valdevez. Estuda no Colégio Jesuíta em La Guardia, Galiza. Frequenta a Universidade de Coimbra.

(2) Albertina Fernandes nasceu em Arcos de Valdevez. Foi professora do ensino secundário. Licenciada em Filologia Românica, Mestre em Língua  e Literatura Francesas e em Educação Artística ensinou durante muitos anos a disciplina de Português.
Em 2013 sai o seu livro intitulado “Tomaz de Figueiredo Ensaio Crítico-Biográfico”, Ed. Calendário de Letras e apoio do Município de Ponte da Barca.

(3)    A Toca do Lobo” (1947), Prémio Eça de Queirós em 1948

(4)    "O lado de lá" (abertura do conto), A Outra Cidade, pg 187

(5)    "Vida de Cão - Novelas", Editorial Verbo, s/d (1970), pgs 131, 134 

(6)     ibidem", pg 70

 

(*) Obras do Autor reeditadas pelas Edições IN-CM

  • 2002 - Nó Cego
  • 2003 - Teatro. A Rapariga de Lorena - O Visitador Extraordinário - A Barba do Menino Jesus - Os Lírios Brancos ou a Salvação Universal - O Homem do Quiosque* - A Nobre Cauda* - O Embate - Loiros de Morte ou, talvez, Quarto Minguante (fragmento) - O Morto e os Vivos (fragmento)
  •  
  • 2003 - Poesia I. Volumes de poemas: Guitarra - Viagens no Meu Reino - Consumatum Est* - Poço da Noite* - Sangue de Cristo* - Caixa de Música* - Orfeu e Eurídice*
  •  
  • 2003 - Poesia II. Volumes de poemas: Coroa de Ferro* - Moto Contínuo* - Viagem Estática* - Jardim Antigo* - Espada de Fogo* - As Mãos Vazias* - Malho Rodeiro* - Aos Amigos* - Poesia Diversa* - Traduções*: de 21 poemas de Reinhold Schneider; de oito Sonetos Ingleses de Fernando Pessoa; de um poema de Gerard Mauley Hopkins; de um soneto de Lope de Vega; de um poema de Ricarda Huch.
  •  
  • 2005 - A Toca do Lobo - Fim* - Uma Noite na Toca o Lobo
  • 2006 - Novelas e Contos I. Procissão dos Defuntos - Vida de Cão
  • 2006 - Novelas e Contos II. Tiros de Espingarda - A Outra Cidade
  • 2007 - Monólogo em Elsenor I. Noite das Oliveiras - A Má Estrela
  • 2007 - Monólogo em Elsenor II. Túnica de Nesso - Memória de Ariel*

https://pt.wikipedia.org/wiki/Tomaz_de_Figueiredo