Ontem lembrei-me do nosso "cantautore" Vitorino. E dos tempos do LP que se chamava "Leitaria Garrett" em homenagem à antiga Leitaria que tinha já desaparecido.
No Chiado, na Rua Garrett do lado direito, lá estava a Leitaria, coisa que hoje não faz parte do nosso horizonte de hoje. Já nem do de ontem.
"Comprar leite? Isso compra-se no supermercado!", dirão.
Nem sei se ainda há leitarias que vendam leite. Recordo algumas da Ucal...
Tempos atrás, no entanto, os amigos encontravam-se na "leitaria" para tomar um café, ler o jornal, fumar o seu cigarrito (que ainda era permitido porque não havia cancros "conhecidos") e estar na conversa toda a tarde.
Alguns chegavam só depois de comprar o jornal da tarde. E discutia-se e falava-se. Era outro mundo!
Não sou saudosista, sei que o mundo gira todos os dias e traz coisas novas, boas e más, melhores do que a desses tempos umas e piores outras.
Mas não deixo de pensar nas pessoas que ali se reuniam...
Vitorino "recupera" os tempos das leitarias, começando por escrever e cantar a canção "Leitaria Garrett".
Uma pessoa que eu conheço às vezes quase chorava ao ouvi-la, no "exílio" que até era amado. Saudades? Diz que não...
O que daqui tiramos é que a tal "saudade" que não se sabe explicar (não, não vou ao Fernando Pessoa!) a que o grande Camões chamava "gosto amargo de infelizes" é um contraponto da insatisfação e da viagem que é uma componente portuguesa, descendentes de judeus e de árabes.
Poemas de nostalgia, de "desengano", da sensação de não se ter conseguido, de "não ter ido além" - são uma parte da "nossa" atitude mental perante a vida.
Fados e "destino marcado" e a "sina na palma da mão" e as "lágrimas" são aos montes por aqui!
"Ai os modos de ser lágrima":
ttp://youtu.be/MwgnpoVT4Xs
E toda a tragicomédia do "fado", na "Tragédia da Rua das Gáveas" faz-nos rir, no seu drama de "fadinho":
http://youtu.be/MwgnpoVT4Xs
O drama está ali...
Mas há que reagir sem dúvida nenhuma!!!
Fados e "destino marcado" e a "sina na palma da mão" e as "lágrimas" são aos montes por aqui!
"Ai os modos de ser lágrima":
ttp://youtu.be/MwgnpoVT4Xs
E toda a tragicomédia do "fado", na "Tragédia da Rua das Gáveas" faz-nos rir, no seu drama de "fadinho":
"De rosa ao peito sobe a rua airoso
com a cruz ao pescoço
que a Rosinha lhe ofereceu…
...
Vermelhinho, às tantas,
vai parar ao Invejoso.
Bate um fadinho
na rua dos Mouros
mas silêncio é ouro..."
O drama está ali...
Mas há que reagir sem dúvida nenhuma!!!
Quando se parte, sim. E quando se fica também.
Como bom alentejano, porém, Vitorino começa pelas Saias da Vila do Redondo –uma maravilha! E estamos todos salvos!
Como bom alentejano, porém, Vitorino começa pelas Saias da Vila do Redondo –uma maravilha! E estamos todos salvos!
Também
é bem bonita a canção “Andando pela
vida”... Podem ouvir aqui.
Vitorino é um bom poeta e consegue equilibrar tudo isso com a alegria da música e quase uma ponta de ironia na letra. E deixa-nos a esperança...
"Vida dá-me a tua mão/Faz florir sempre o mês de Maio!"
Com outros poetas que o ajudam na sua tarefa: José Bebiano, por exemplo, e António José Forte.
"Vida dá-me a tua mão/Faz florir sempre o mês de Maio!"
Com outros poetas que o ajudam na sua tarefa: José Bebiano, por exemplo, e António José Forte.
CONFISSÕES
"Nunca
fui além
Do
a noitecer em mar de bruma
Ingénua
paz do dia
Deixa
o sobressalto
Sonho
de espuma
E
se a brisa for
Vento
sem Norte a todo o pano
Vai
a bom porto
Vai
barquinho de papel
Do
desengano
Se
este meu braço forte
Não
fraqueja no momento
Espada
cintilante
Acerta
o golpe
Solta
o veneno, cai ferrão
Cobre-me
luz da Lua
(fada
benfazeja)
do
escorpião."
(do disco "Leitaria Garrett")
ANDANDO PELA VIDA
"Passeio-me
pela vida
Sem
lamento
Malmequerem,
bem querendo
Ai
madrugada, não me faltes
Ao
encontro no tempo
Das
margaridas
Desencontros,
despedidas
Tanta
Primavera triste...
Na
boca um gosto
D´Amor
deixado
À
rosa dos Ventos
No
céu estrelado
Coração
não me abandones
Na
rua de andar sozinha
Deixa-me
a força que tinha
Do
esplendor da Estrela d´Alva
Cigarro
não fumado
Copo
no chão,
Vida
dá-me a tua mão
Faz
florir sempre o mês de Maio!"
Pegando na "saudade" e deixando de lado o Vitorino - que também gosto muito de ouvir - tenho para mim que esse sentimento enraizado nos portugueses tem muito a ver com os Descobrimentos e, secundariamente, com a cíclica emigração a que foram obrigados.
ResponderEliminarQuanto à razão primeira, estou em boa companhia: Francisco Manuel de Melo..:-)
Um bom próximo domingo!
Gostei destas 'variações' sobre a Leitaria Garrett, que conheci e onde ainda tomei umas bicas.
ResponderEliminarBom domingo!
Não ouvi a música. Li este registo primeiro que o anterior. Igualmente ao anterior a sensibilidade tocou-me.
ResponderEliminarBeijinho e dias felizes!:))
Vi lá o Vitorino e o Herberto Hélder.
ResponderEliminarEstou convencida de que todos somos influenciáveis, e com uma literatura poética tão saudosista e fatalista, tínhamos que ser tristonhos à força...
ResponderEliminarOs grandes contrapontos à melancolia é o sentido do humor e a acção, rir muito e estar activos sempre.
Saí de Portugal em 1970, estou um pouco "out" das leitarias, e era muito nova para já ter saudades de alguma coisa. Continuo a procurar que "o coração não me abandone na rua de andar sozinha". Bonitos versos.
Beijinho
Como gostei, gostei, gostei tanto de ler!
ResponderEliminarTenho saudades das "leitarias" e adoro Vitorino!