terça-feira, 16 de setembro de 2014

LEITURAS POLICIAIS ... E ONDE APARECEM OS ESCOCESES E OS INGLESES…





Comecei a reler um livro de Dorothy Sayers, escritora inglesa policial,  que se intitula "Qual dos Cinco" (Colecção Vampiro) - The 5 Red Herrings- e é bem verdade que cada nova leitura nos traz novas perplexidades. Ou talvez apenas descubramos coisas que são curiosas, pelo facto de aparecerem num momento especial.





Vai haver, na próxima 5ª feira,  um referendum na Escócia sobre a sua independência -ou não- do Reino Unido. 

 Escócia, Ilha de Skyes


Acontecem estas coisas cada vez mais frequentemente nos dias que correm. Infelizmente, coincidem com o “abandono” de uma terra em relação a outra ou pelo egoísmo da região mais rica que não quer “aguentar” o peso da mais fraca. Mas não vim falar de política, vim falar de gente.´

o actor Edward Petherbridge no papel de Lord Peter Wimsey

Começa assim o livro de Sayers:



"Quem vive em Galloway ou é pintor ou é pescador. Talvez isso não seja rigorosamente assim visto que o pintor, quando não trabalha, passa o tempo a pescar.”


Castelo de Galloway

Galloway é, pois, uma aldeia de pescadores, na Escócia –como veremos adiante- frequentada sobretudo por pintores vindos de toda a parte.

Interessante ver as relações entre escoceses e ingleses - porque o livro é de 1949 e, hoje, em 2014, a Escócia decidiu “expressar” -através de um referendum- o desejo de independência. Uma vez que certa autonomia administrativa já tem...


Parlamento Escocês



E Dorothy Sayers continua a contar:

Lord Peter Wimsey era acolhido sempre com toda a amabilidade e franqueza (…) apesar de ser inglês e estrangeiro, não dava motivo de desagrado. Os Ingleses são tolerados na Escócia desde que não atirem o seu orgulho à cara dos outros.

(Num aparte, digo que Lord Wimsey era um "lorde" detective amador, hedonista e diletante, apreciador da boa vida e das coisas bonitas, dos manuscritos medievais -os incunábulos- e de música clássica, especialmente Bach. Resolve mistérios –sobretudo crimes- mas apenas para seu próprio deleite.)


o actor Edward Petherbridge

Lord Wimsey estava no "pub" McClellar Arms, na noite em que se travou a discussão entre Campbell e Waters. Um escocês, o outro inglês...

Campbell era pintor paisagista e já tinha bebido um copo ou dois a mais. (…) Tornou-se mais embirrante do que é normal para um Escocês. Começou a ressaltar a acção dos Escoceses na Grande Guerra, interrompendo a história para dizer a Waters que os Ingleses eram todos de raça atravessada e que não sabiam pronunciar bem a língua confusa deles. 
Waters era Inglês e de boas famílias e, como todos os Ingleses, estava disposto a admirar e exaltar todos os estrangeiros, excepto os ‘dagos’ (*) e os negros, mas irritava-o ouvir auto-elogios que considerava inconvenientes.” (…)

Mas Campbell, o Escocês, não se calava e prosseguia o seu discurso, dizendo que “(…) todos os lugares administrativos importantes em Londres  eram ocupados por Escoceses, que a  Inglaterra nunca conseguiu conquistar a Escócia e que se a Escócia pretendesse ter autonomia administrativa já a teria obtido.”

Waters, bem educado, apenas retorquiu:
- O vosso mal é a vossa mentalidade inferior.

Claro que isto foi provocar uma série de insultos da parte do Escocês de tal modo que se cria uma batalha campal no “pub”.

Waters perde a fleuma britânica e grita: Parto-lhe o pescoço seu Highlander ordinário!

Os insultos de parte a parte chovem e a cena continua por mais um pouco. Campbell sai furioso e Waters desculpa-se por ter sido indelicado e pede um whisky duplo.

Lord Peter Wimsey responde, ironicamente:

“É assim mesmo, apaga-se o insulto com a bebida do país!”

Engraçado é que aparecem logo uns escoceses a dizerem que o Campbell nem sequer era escocês.

“Toda a gente sabe que é de Glasgow e  a mãe é do Ulster e chama-se Flannagan".


Estava salva a honra da Escócia! A Irlanda, afinal,  é que era a culpada…

Bem, o pior disto tudo é que, na manhã seguinte, Campbell aparece morto, caído nos rochedos. Teria ido pintar de manhãzinha, e teria caído.

Mas Lord Peter Wimsey não acredita nisso e vai provar que foi, de facto, um homicídio!


o actor Ian Carmichael, como Lord Wimsey

Quem quiser, pode já comprar! E ler o livro!

Na Livraria Lumière ‘online’ há muitos livrinhos da Colecção Vampiro! Quem sabe se não haverá algum de Dorothy Sayers?



Encontrei mais estas informações na internet sobre o seu herói:
"O herói de Dorothy Sayers é Lord Peter Death Bredon Wimsey.  É um 'arquétipo' do British gentleman"Não é um profissional, mas pode auxiliar a justiça…"

Ian Carmichael (em 1975) e Edward Petherbridge (em 1987) são dois actores ingleses que "deram o rosto" a Wimsey, em duas séries da BBC.



A figura parece ter sido inspirada pelo poeta e escritor e membro do Balliol College, Roy Ridley (1890-1969). 
Dorothy Sayers, no Brasil


fachada do Balliol College

Em 1940, Dorothy Sayers abandona a sua figura para se dedicar à paixão da sua vida: a Literatura Medieval...


Nota biográfica: “Dorothy L. Sayers (Oxford, 13 de Junho de 1893 - Witham, 17 de Dezembro de 1957) foi uma escritora e romancista britânica, famosa pelos seus renomados romances policiais e thrillers jurídicos.
Dorothy Leigh Sayers, nasceu em Oxford em 13 de Janeiro de 1893, filha do Reverendo Henry Sayers, e Helen Mary Leigh Sayers. Formou-se em literatura medieval na universidade de Oxford, no Sommerville College. Foi uma das primeiras mulheres a licenciarem-se – em 1915- nesta Universidade bastante conservadora.

(*) Nota de rodapé, da autora: "Os ‘dagos’ são, segundo o Oxford Dictionary, uma palavra que refere os italianos, franceses e espanhóis, gente do Sul, portanto…"
Dei-me ao trabalho de ir ver a palavra "dago" nesse mesmo (meu) diccionário e encontrei: "Slang ofensivo. Estrangeiro, Espanhol ou Spaniard, Português ou Italiano."

9 comentários:

  1. Gostei muito do post.
    A Escócia foi independente até à Acta de União de 1707 que criou a Gran Bretanha ( enquanto que a Catalunha só o foi entre 1641 e 1659), e a Escócia foi sempre a irmã pobre, a gata boralheira do império britânico. Agora os políticos ingleses apressuram-se a oferecer-lhe, se não se independiza, o que deveria ter tido sempre. São coisas como estas que nos fazem desprezar cada vez mais a classe política, que o que melhor sabe fazer é roubar o povo em benefício próprio.
    Enfim...Que tenhas um bom dia, malgrés tout!

    ResponderEliminar
  2. Não acredito que se deva desprezar em bloco a classe política... Há que saber escolher, e condicionar os políticos que escolhemos: a democracia ainda é o sistema melhor. Talvez um dia se invente um sistema "ideal", perfeito. Mas isso não é lá muito próprio do homem!
    beijos

    ResponderEliminar
  3. Também gostei muito do post!
    A Maria João com o seu gosto pelos livros policiais consegue contagiar-nos.
    Fico sempre com vontade de ler mais livros policiais, de que até gosto, apesar de não ter lido muitos.

    Na política, tenho um bocado a tendência de também generalizar, tal como a Maria. Para mim é tudo igual. Aparece alguém (como foi por exemplo com este ministro da educação...) que fala bem, em quem vamos colocando esperanças de alguma mudança e depois quando lá estão são todos iguais.
    Os políticos só vêem os interesses deles e dos amigos. Não acredito em nenhum.

    Eu sei que a Maria João não pensa assim...

    Um beijinho grande :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Isabel, tu tens que pensar da tua maneira, claro! Não gosto de generalizar EM NADA...porque tudo é sempre diferente.
      Esperanças temos de ter sempre, perder e renová-las, é um longo trabalho. Mas é proibido desistir de esperar!, dizia o Rabbi Nahman de Breslaw que não era nada parvo!
      Beijinhos

      Eliminar
  4. Não há alternativa aos Partidos nesta democracia

    Que seja o povo a escolher em liberdade
    a sua soberania
    nesta europa
    onde as fronteiras só se redefiniram a leste

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. De acordo, claro: como também não há alternativa à democracia. E foi uma dura conquista tê-la... Muitos ignoram o que isso foi!

      Eliminar
    2. De acordo, claro: como também não há alternativa à democracia. E foi uma dura conquista tê-la... Muitos ignoram o que isso foi!

      Eliminar
  5. Maria João,
    Gostei muito mas entristece-me se o sim ganhar pois faz-me impressão que por causa da riqueza de uma região ela se queira tornar independente.

    Gosto igualmente de policiais mas não conheço esta escritora. Li muitos livros da colecção Vampiro há uns anos atrás.
    Beijinho grato e parabéns pela abordagem de um tema político de uma forma muito fresca.:))

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sim , Ana, penso o mesmo que tu. E afnal houve mais gente que o pensou pois o NÃO é que venceu. Foi importante o protesto e os resutados mostram bem o descontentamento dos escoceses. Agora, toca a Londres tirar uma lição e fazer o necessário nas relações com a Escócia e, talvez, o País de Gales. Se o reino é unido, apesar das diversidades, tem de haver mais igualdade entre as partes...
      Beijinhos
      Lê a Dorothy Sayers. Em inglês, será melhor, nem sempre as traduções sâo boas. Perde-se o "humor" dos ingleses (e dos escoceses....)

      Eliminar