sábado, 6 de junho de 2015

NATSUME SOSEKI, ESCRITOR JAPONÊS




Natsume Soseki é o pseudónimo de Natsume Kinnosuke (9 Fevereiro 1867- 9 de Dezembro de 1916) que foi um novelista japonês, professor de Literatura Inglesa, novelista e escritor de haikus e de poemas chineses (kanshis*). 
Antologia de Poesia Japonesa (sé.XVIII)

Sôseki pertenceu a uma família de samurais, de Edo -nome antigo do actual Tóquio. Desde criança, começa a estudar literatura chinesa e entra para a Universidade Imperial de Tóquio com 23 anos para estudar literatura inglesa. 
Muito novo, ainda, ensina inglês na Universidade (Universidade Waseda, hoje). 
 Soseki e os escritores Akutagawa e Kukuchi Kan

Escreve e assina os seus textos com o nome Soseki (que, em chinês, quer dizer “incómodo”). Sôseki é um grande escritor da época Meiji. 
Imperador Meiji (1867-1912)
“A poética do haiku baseia-se geralmente no assombro e na emoção que causa no poeta a contemplação da natureza.” 

Estes poemas encontrei-os num livrinho que se intitula apenas “Haikus”. Escolhi alguns haikus de Sôseki para exemplificar a frase acima citada.  Os desenhos são do autor e têm uma delicadeza espantosa. 
Enxame de laranjas
Inclina os braços de oiro
O sábio desconhece a solidão
*
Flor de uma tarde
Efémera e melancólica
Que amanhã não será
 *
Jardim no crepúsculo
Sem pôr luz nem fechar as cortinas
Fico a contemplar as flores
 *
Gostaria de renascer
Se fosse possível
Modesto como a violeta
 *
Na asa do vento
Ligeira e longínqua
A andorinha
 *
Vento de leste vento da Primavera
Se soubesse que me esperavas
Ia-me já embora

Como definir estes poemas que falam do minuto que passa, do átimo de que não damos conta, e nos marca para sempre, do momento de graça efémero?
O livro de que falo é ilustrado com os desenhos que o escritor fazia e que são de uma delicadeza espantosa. No Prefácio -escrito pelo seu editor Akiyama Yutaka- do livro que refiro (publicado em França, nas edições Picquier Pocheencontrei muitas informações sobre ele. Soseki escreveu desde a sua juventude -e até à morte- cerca de 2500  haikus.

Momentos de graça, livre da pressão abafada da vida real, onde o espírito pára no limiar de um poema, numa intensa plenitude”.
Mas o que é exactamente um haiku?, pergunto eu. Sei que há uma questão de 17 sílabas obrigatórias -que não se contam como as nossas sílabas, pois no fundo são 17 "signos" (ou, melhor, caracteres?). Sei que os temas são geralmente a natureza, as estações do ano, uma emoção súbita, um estado de alma. 

Natsume Sôseki –professor de Literatura Inglesa na Universidade de Tóquio- explicava-o de modo simples aos seus alunos. Porque Soseki escrevia -e falava- de modo simples e claro e os alunos apreciavam-no.
É um seu aluno, Terado Torahiko (hoje professor de química de renome) quem conta como ele o definia :


Um ‘haiku’ é, em primeiro lugar, um concentrado de retórica; em segundo lugar é um universo irradiante a partir de um ponto focal – tal como o nó de um leque que permite manter unidas todas as varetas.” 
E Sôseki costumava dar como exemplo do ‘haiku’ perfeito este de Mukai Kyorai que foi discípulo  do famoso Matsuo Bashô (era de Edo):
Bashô

Ó vento do Outono
Do arco em madeira imaculada
a corda estica
Explicando como o arco de madeira branca acabado de cortar e sem enfeites nem envernizado, na sua inicial pureza tal como o instrumento nunca usado antes, em estado natural, respondem ao vento. O vento passa no instante mesmo em que o atirador prepara o arco visando o alvo. 
O poema é, neste caso, a tensão da atmosfera nesse breve instante. O 'haiku' pode, no entanto, mostrar o paroxismo da dorDe facto, Soseki considerava o poema que Basho dedica a um amigo morto como “o paroxismo da dor em 17 sinais”.

Que o túmulo se agite
Não ouves o meu choro
Que o vento do Outono leva

 Insistindo na compreensão desta arte: arte que afasta a expressão directa de um sentimento, que não revela a dor nem a tristeza, nem mesmo a alegria, directamente - como fazê-lo em 17 sílabas apenas?- mas que é, no entanto, é a expressão mesma de um sentimento violento seja ele qual for que "se adivinha" apenas.

Masaoka Shiki

Foi com Masaoka Shiki que Soseki teve lições de composição de haikus. Cresceram juntos e foram amigos. Desde muito cedo que Soseki começa a escrevê-los, sob o ensinamento de Shiki, mas com um toque especial, diferente, que o "mestre" reconhece. 
Dos seus poemas de 1895, escreve Shiki: “Desde o princípio descobri nele uma grande originalidade de invenção.” E cita o poema:

Céu de Outono
A acha corta o espaço de âmbar
Uma criptoméria oscila.

Fala do estado de alma outonal deste haiku: vê-se, simultaneamente, a lâmina da acha, a árvore - um cedro do Japão- que vai ser abatida, o corte, ainda não realizado, a secura do ar e a pureza do azul do céu ligeiramente amarelado como que tocado pela cor âmbar.

Masaoke Shiki (14 de Outubro de1867-19 de Setembro1902) foi um poeta japonês e um critico literário que morre jovem. Considerado como um dos figuras mais importantes do desenvolvimento da moderna poesia de haikusNa sua morte, Soseki escreve:
 susukis em noite de luar

Os susukis voltaram
Ninguém os convidou na terra
Amigo e tu por que não voltas 


 Muito haveria a dizer do "dizível" e do "indizível" do haiku, em que se sente e se comunica, mas nunca directamente, mas sempre intensíssimo.
* * *

Mais sobre a obra do autor. Em 1905, publica Wagahai wa neko de aru (Sou um Gato) que tem muito sucesso. 
Dois anos mais tarde, deixa o ensino e dedica-se apenas a escrever. É colaborador exclusivo no jornal Asahi Shimbun onde vai publicando os seus contos. 
Em 1910, tem a primeira crise de úlcera, com hemorragias que o deixam num estado gravíssimo. De cujas complicações virá a morrer, em 1916.

Devo referir a obra de novelística do autor. Soseki escreveu vários livros entre eles Kokoro (1914), Sanshiro, as Ervas no Caminho
Kokoro significa literalmente “coração” mas a palavra contem nuances de sentido e pode ser traduzida mais completamente por “o coração das coisas” ou “sentimento”. 
Deixou incompleta a última obra Ligh and Darkness, o romance que escreveu até poucos dias antes de morrer. A um aluno disse, numa carta, que a novela se alongava cada vez mais e que tinha receio de não ter tempo de a acabar. 
Um ano mais tarde, Iwanami Shonen publica-a - tal como a deixou. Foi a mais longa novela que escreveu, com cerca de 200 páginas mais do que I Am a Cat e as outras. 
O editor Akiyama Yutaka dirigiu a publicação das suas Obras Completas, em 28 volumes, no Japão, terminada em 1999.

(*) Kanshi- poema chinês, escrito por poetas japoneses.
ihttp://en.wikipedia.org/wiki/Natsume_S%C5%8Dseki


2 comentários:

  1. Gostei muito de ler este post. Esse livro de que fala, com os desenhos, deve ser muito bonito.
    Este tipo de poesia, haiku, só a descobri desde que ando pela blogosfera. Antes disso, posso ter lido alguma coisa, mas não a identificava como tal. Gosto.

    Mais um post interessantíssimo!

    Um beijinho e um bom domingo:)

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  2. Gosto muito de Haiku. Tenho alguns livros. Dois são de poetizas japonesas, o que também é raro.
    O Ivo tem um livro de Haiku mas em Inglês.
    Apreciei muito este registo. Estou cheia de trabalho, por isso apareço pouco.
    Beijinho grato por esta partilha sublime. :))

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