quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

O rapaz e o violino

Ontem, manhã de Inverno, fria mas com sol. A vida pode ser riquíssima e não damos por ela, agarrados às nossas queixas e saudades disto ou daquilo que não voltarão mais. Presos dos nossos medos, das nossas raivas, dos ódios e dos desentendimentos menores, não vemos essa riqueza. 
Marc Chagall, Vista da janela 

Tão egotistas somos e tão imbrincados nos envolvemos em problemas, só damos pelo que se passa no nosso centro de vida. E não observamos a vida, lá fora, na sua estranha simplicidade – ou na sua enorme complexidade e com tantas 'sfumature' (palavra italiana que diz muito). No entanto, é ela que nos entrega sem pedir nada em troca momentos fulgurantes de beleza e de poesia. 
Porque, fora de nós, há muita coisa a descobrir. E é bom olhar da nossa janela lá para fora! Ajuda-nos a arejar o que está cá dentro.
Marc Chagall, Saltimbancos na noite 

Ontem aconteceu-me uma coisa do género: um grupo de estudantes do liceu sentara-se na mesa de madeira que, em boa hora, a Câmara aqui pôs, com uns bancos corridos ao comprido.
Três rapazes e uma miúda com um tosto limpinho sorridente e o cabelo puxado para um lado. Um, era africano. Todos vestiam blusões com capuz, iguais a tantos outros. Conversavam, de cotovelos apoiados na mesa. 


De vez em quando, ela ria e afastava os cabelos para o lado. Tinha um casaquinho aos quadrados brancos e pretos e um cachecol e gostei do seu sorriso. 
Marc Chagall, O Violinista Azul 
Em pé, virado para eles, estava o quarto membro do grupo. Segurava um violino. Pousara o casaco no banco. Era um adolescente como tantos outros com borbulhas e tinha o cabelo aos caracóis. Ensaiava uns acordes.  
Marc Chagall, pormenor de "Solidão" 

O violino faz-me sempre pensar em Chagall e nos seus poetas músicos, ou nas cabrinhas que tocam num violino azul ou amarelo e dançam pelo céu...
Marc Chagall, A Aldeia 
O estojo do violino estava pousado em cima da mesa e o miúdo africano mexia-lhe com delicadeza e perguntava coisas ao violinista.
Ele virou-se na nossa direcção e viu-nos. Interrompeu-se. Depois, como se achasse que até gostava desse publico voltou aos seus acordes, tocando a seguir uma musiquinha simples.

O ribeirinho corre, aqui por perto, cheio das últimas chuvadas e ouvia-se o rumor das águas. À volta, os velhos eucaliptos que cresceram durante os anos que cá não vivi. 

Por detrás do muro de pedras, que parece proteger o ribeiro, vêem-se os campos abandonados onde em tempos alguém plantou a sua horta. Têm uma vegetação alta que ora se cobre de florinhas roxas, ora, no Verão, seca, deixando picos que  se nos agarram às saias. 
Agora estão verdes, da frescura das últimas chuvas suaves deste Inverno primaveril.
Durou poucos minutos esta cena, mas foi bom ouvir a música e ver um grupo de  jovens que gostavam de a ouvir. 
De  facto, bem dizia Keats: "Um momento de beleza é uma alegria para sempre!"
Chagall, A Terra e a Lua

8 comentários:

  1. Saudações Mrs Falcão e uma vez mais receba meus sinceros desejos de um ano novo, repleto de paz, saúde e infinitas possibilidades na graça e amor divino. Obrigado pelos comentários e outro sim estaremos juntos outra vez blogando nossas ideias, afinidades e gostos além mares. Meu coração caminha contigo, hojé, sempre e mais um dia se possível. (Mr. Butterfly)

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  2. É verdade, a vida tem coisas tão bonitas. Mas não as vemos quando andamos cá com as nossas preocupações...

    Gosto muito da pintura de Chagall e gostei do post.

    Quando for aí para essas bandas hei-de espreitar o ribeirinho, que nunca vi.

    Um beijinho:)

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  3. Quem leva a beleza na alma, encontra-a em qualquer sítio...

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  4. Simplesmente lindo. Obrigada minha querida professora. bjos

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  5. É verdade, Maria João!
    Por norma, passamos os dias a queixar-nos de tudo e de nada e concentrados nas nossas angústias, nem vemos as coisas bonitas que nos rodeiam e que dão outro colorido aos dias e à vida!
    Um abraço apertado! Beijinho.:))

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  6. Tento, sempre que posso, observar pequenas coisas
    que sejam diferentes e vou, parando aqui e ali
    sempre à espera de me surpreender. Muitas vezes
    isso acontece, e na altura tiro algum prazer desses
    momentos. Ajudam a viver.
    Boa noite.

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  7. ~~~
    Nem todos as manhãs frias de sol,

    temos a sorte de apreciar e sentir

    algo terno que nos aquece o coração.

    ~~~ Beijinhos, MJ. ~~~

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