segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O RATINHO E O OURICINHO DISCUTIRAM!

Andei por fora uns tempos... os meus amigos talvez tenham notado a falta (wishful thinking!).
Passei pela “pérfida Albion” – como os franceses denominaram a Inglaterra, sabe-se lá por quê! Ou talvez eles saibam ...
Mas voltei.
Deixei Guildford antes de começar lá a nevar, cheguei e o frio era insuportável!

Vinha preocupada, tinha deixado o ratinho Poeta e o seu amigo Dany sozinhos a tomarem conta da casa.
Foi grande o reboliço logo à chegada.

Vieram à porta os dois em manifestação de grande alegria. Até traziam cartazes!

Não estavam sozinhos, tinham convidado uns amigos e devem ter feito festa todos os dias: o pinguim que só aparece no  Natal, e o cão inglês, o “Dog” que é um “marcador de livros” que conhece as livrarias de Londres, e um burrinho que costuma trazer as minhas chaves.

Penso que ficaram contentes por nos ver de volta. Ou será que se divertiram a valer e viemos estragar tudo?

O ratinho, no entanto, com uma certa ironia insidiosa, disse-me:
- Gostaste de andar por lá? Divertiste-te? Conheceste muita gente?
E acrescentou, olhando-me de lado:
- Dizem que há muitas raposas e esquilinhos nessas paragens da “pérfida Albion”... E carneiros!

Carneiros? Onde é que ele ouviu esta? Será que anda a ler o Oliveira Martins? Ainda ontem encontrei um rebanho tresmalhado para os lados de Colares!

Notei um pouco de censura na voz dele. Percebi que o ratinho se sentira atraiçoado por mim. Não lhe contei dos ratinhos que tinha visto na Loja de Antiguidades, em Farnham, no Moinho...

- Gostei muito. Estava lá o Diogo já sabes, foi por isso que fui...
-Ah! Eu sei, o Diogo... Fizeste bem.

Era sincero desta vez.
- E não tiveste saudades da casa? E do cafèzinho da manhã?


Queria dizer “de mim”, dele, claro. Sempre o mesmo discurso de ciumento inveterado.

- Tive. Muitas saudades da casa e de ti!
Acrescentei logo:
- Bem... E do ouricinho.

Olhei em volta. Estranhava um pouco o silêncio dele. Tinha-se afastado para um canto da sala, amuado. Fingia contemplar um quadro atentamente. O que teria acontecido durante a minha ausência?
De repente notei que o ratinho trazia a tiracolo a bolsa do computador – que era uma mania do ouricinho! Sem ela, Dany parecia despido...


(É verdade que no Natal também o Ratinho teve um computador, para não ter ciúmes do Dany... Até tinham tirado fotografias juntos, a festejar...)

- Mas onde está o computador do ouricinho?

Ele saltou logo do cantinho do sofá, de olhar esperto :
- Aquele é o meu. Ele tirou-mo!
-Emprestaste-mo tu!, disse o ratinho, zangado. O meu avariou-se, bem sabes...
- Emprestei-to e tu nunca mais mo deste!, lamentou-se o ouricinho.
O Ratinho, com a tira bem agarrada ao pescoço, ria-se, talvez a disfarçar algum remorso. E acrescentou, falando baixinho para mim:


- Ele não escrevia nada de jeito. Sem imaginação... Só para dizer que escreve.

“Onde é que eu já ouvira isto?”
- Mas tu, Ratinho, o que escreves? És melhor do que ele?, perguntei suavemente pois não os queria ver incompatibilizados.
- Não sei se sou. Escrevo as minhas poesias. Ponho-as na internet.  Ele ri-se de mim.

"O ratinho na internet?!"
- Ah...
- Sim, tenho amigos que vão ver. Como tu fazes...

Sorri.
- Ora, ora, Ratinho, tu tens razão, mas deves pensar no teu amigo, ele também gosta de escrever.

De facto, percebia-os bem. Um computador para dois numa casa é um grande problema...
Bem tinha dado conta disso eu própria, desde que temos um computador a arranjar há quase três meses. Ou mais?!

Como o ouricinho, sentia-me às vezes  “sacrificada”...

O que lhes podia dizer?
- Tens que pôr o teu a arranjar...

Num gesto súbito de generosidade, o ratinho tirou a bolsa do computador do pescoço e estendeu-a ao ouricinho Dany.
- Toma lá o teu computador...

Pôs-se a olhar pela janela. Depois virou-se para mim, a ver o que eu achava:
- Estás contente?
- Estou. E tu como vais escrever as tuas poesias?
- Eu espero. Estava a abusar...

E suspirou.
- Gosto tanto de escrever as minhas coisas. Tenho ideias, ideias  a toda a hora...

O Ratinho era um poeta.
Ajudou o ouricinho a segurar aquele peso:
- Tem cuidado, não o deixes cair.
- E tu o que fazes sem ele?, perguntou o ouricinho, preocupado.

Sentou-se em cima do computador, a pensar.

- Olha,  empresto-o outra vez!, disse de repente. Não me apetece escrever nada, não estou inspirado.

Fiquei aliviada. Afinal tudo se resolvera em paz. Agora era outra vez o Ratinho que  trazia o computador!
Custava-me vê-los discutir, por uma banalidade!

- Temos que resolver o problema!

Mas eles já não me ouviam. Tinham deixado o computador e estavam os dois dentro das minhas malas, a ver o que eu trouxera de prendas.

- Isto é para ti. Isto é para mim, dizia o ratinho.

E riam-se às gargalhadas.

"Amigos outra vez", pensei...

É assim o Ratinho Poeta. E o ouricinho está-se a parecer com ele...

10 comentários:

  1. Aparente inocência das coisas sérias da vida...
    Beijinhos e SAUDADES

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  2. Tudo por aí está cada vez melhor, esses dois em casa dão o que falar, pense se eles tivessem viajado???

    bjs aos briguentos, poetas ou não, mas, sempre amigos sinceros.

    bjs enormes.

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    Respostas
    1. Eles são assim...Como toda a gente, afinal...
      beijinhos às 7

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  3. Delicioso...
    Já estava com saudades dos nossos amigos.
    Felizes ou amuados, eles são sempre uns amores.
    Sentiram a falta da MJ e do MP. Claro, quem é que não sentiu?!
    Mas já estão de volta para nos brindarem com as vossas histórias, vivências, amizade, carinho.

    Beijinhos amigos

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  4. O que eu me divirto a ler estas histórias!!

    Mas vamos por partes: bom, isso na sua ausência deve ter sido...! Já algum vizinho se queixou do barulho das festas até altas horas?

    Acho que fez bem não mostrar os ratitos de Inglaterra. Cá para mim, ciumento como ele é, andava para aí uma semana amuado.

    Acha que podia pedir ao ratito poeta para a deixar colocar aqui uma das suas poesias? Não vai deixar?...pronto era só uma ideia...

    Bom, mas felizmente tudo acabou em bem e com o bom exemplo da dona, lá se vão entendendo só com um computador!

    Adoro estas histórias e estava com saudades destes simpáticos bichinhos.

    Um beijinho grande

    (Hoje consigo comentar, mas creio que o problema é outra vez do computador. Ontem nem conseguia trabalhar com a impressora. Não dava sinal no computador. Fico arreliada.)

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  5. E que elegantes as malinhas deles!
    De fazer inveja!

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  6. Gosto muito destes textos com o ratinho e o ouricinho.
    um beijinho
    Gábi

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  7. Faço minhas as palavras da Luisa — com o qual auguro que a história dos teus bonecos de peluche não parará de enlear-se.
    Afinal é com os enredos que as coisas se põem interessantes...
    Roubei-te a foto das ovelhas, chegou-me à alma, há mil anos que não via essas companheiras da minha infância.
    Um beijão

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  8. Querida María! Dou-te as ovelhinha com muito amor! Até te vou mandar mais...
    Beijinhos

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