quinta-feira, 28 de junho de 2018

Perder um amigo o que é?


O que é perder um amigo? Esta fotografia fala-me de uma amiga. Perdi a minha maior amiga. Ontem de manhãzinha cedo. Chamava-se Lívia. 
Conhecíamo-nos desde os anos famosos - e nunca esquecidos- da nossa adolescência: os 14 anos.
Fui com os filhos e os amigos, hoje, despedir-me do seu corpo e da sua vida : "ashes to ashes" dizem os ingleses. Sim, foram cinzas que os filhos levaram para guardar, ou para deitar no mar de que tanto gostava. A noite que desceu há momentos é muito triste hoje.

"Perder" é nunca mais vermos esse amigo ou amiga. É a ausência para sempre. E isso dói. Deixa-nos desorientados. Temos vontade de perguntar: mas haverá outro mundo? E temos medo da resposta.

Nunca mais veremos os amigos que ficaram sempre ao nosso lado, aqueles que estavam sempre quando precisávamos? 
Aqueles para quem bastava uma palavra, um olhar ou um sorriso para nos entenderem? Como pode ser para sempre? 
 Botticelli, Anjo Anunciador

E penso na beleza dos anjos de Botticelli e de Mellozzo da Forlì ou os querubins de Rafaello e desejo que estejam à espera dela! Ela amava a Arte, a Beleza, a Juventude!
Mellozzo da Forlì, Anjo musicante

Os nossos sorrisos juntas? Risos? Ouço as gargalhadas dela que foram iguais desde o primeiro dia em que a vi até hoje.
Sandro Botticelli, Irmãs

Falámos ontem ao telefone, ainda. Estranha que é a vida. Não nos falávamos há muito tempo. Nem eu nem ela gostávamos do telefone, mas quando começávamos nunca mais desligávamos: havia tanta coisa a dizer. 
Rafaello, os anjinhos espreitam...

Este ano que passou foi mau. Para as duas. Mas foi há tão pouco tempo que o telemóvel da Bárbara nos fixou. A rir ? Não, um ligeiro sorriso apenas.
Vimo-nos pouco, mas  neste último mês, duas ou três vezes: fui almoçar a casa dela e, dias mais tarde, almoçámos juntos com toda a miudagem dela, filhos e netos. Faltavam os meus filhos porque os meus filhos não estão por cá. Eu e ela estávamos frente a frente, ao fundo da mesa, junto à janela. 
Bastava olhar uma para a outra e sabíamos o que sentíamos. Ela ria-se para todos, gracejava, mas a mim disse-me baixinho: "Sabes, não estou assim muito bem..."
O mar estava lindo! Mudámos de assunto, e falámos de coisas banais.
Pouco depois, a primeira crise de coração. Esteve muito mal. Voltou para casa com a mesma vivacidade e vontade de viver, de querer tudo, de não desistir de nada, de não querer limites em nada. 
Era uma mulher especial. Eu chamava-lhe a nossa Princesa russa. A Czarina! Lembrava-me uma figura das grandes mulher dos livros russos!!
Hoje uma das filhas disse-me, a chorar: "lá se foi a nossa menina..."
E fiquei a pensar que para mim e para elas a grande Czarina era afinal a "nossa menina", muito mais frágil do que  a sua força de vontade e força moral enormes - e a sua teimosia em mudar o mundo e a vida - queriam mostrar.
Auguste Renoir, Meninas a ler
Vínhamos de terras diversas, de amigos que não eram comuns às duas. No entanto, o nosso encontro foi para a vida inteira.
Tão diferentes que éramos as duas, por que razão fomos amigas? Ela loira, eu de cabelo escuro, ela expansiva (diria, explosiva) eu calada e interiorizada. Quando ríamos, porém, o riso era quase igual: eu ria, ela dava gargalhadas enquanto continuava a falar. 
Por que razão era tão forte a nossa amizade? Diria alguém "parce que c'était elle, parce que c'était moi..." e estava tudo dito.
Auguste Renoir, La première sortie

Tanta coisa importante nos unia desde os tempos do Liceu: a vontade de sermos nós mesmas, de defendermos as nossas escolhas, de lutarmos pelos nossos ideais e sermos boas alunas, sim, mas de nos rebelarmos também.
Portalegre, a "casa amarela"

Vivendo fora de casa, em Castelo Branco, ela porque o pai tinha morrido e estava numa espécie de colégio semi-interno; eu porque não havia 7º ano em Portalegre e tive de mudar de terra e deixar a minha "casa amarela". 
Sandro Botticelli, conversando...

Talvez isso mesmo nos tenha unido. Uniam-nos, também, os grandes ideais de "Liberdade, Igualdade e Fraternidade"; o facto de os nossos pais serem ambos médicos e ambos anti-situacionistas. Queríamos ser “revolucionárias” nas escolhas, mas justas sempre. 
Entre a liberdade e o anarquismo: "Ni Dieu ni Maitre", cantou Léo Ferré. Para nós.
Auguste Renoir, Les amies

Ela fazia Direito, eu estudava Histórico-Filosóficas. Nas aulas de História , éramos as mais novas da classe e estávamos lado a lado. Ela, provocadora e brilhante, eu mais tímida, seguindo a sua voz e o seu desafio constantes, arriscava as minhas opiniões, opunha-me, protestava. E, no fim, ríamo-nos de tudo. E as suas gargalhadas enchiam a sala de aula.
Talvez pensássemos como o Barão, de Branquinho da Fonseca : "A vida é lá coisa para se levar a sério?"

Eu casei cedo, ela casou tarde. Ela a estudar na Universidade em Coimbra e eu  estudar em Lisboa. Trouxe-me um casaquinho de lã, branco, feito por ela, quando a minha primeira filha nasceu. 
Contou-me, muitos anos mais tarde, que tinha chorado abraçada à mãe, quando soube que eu ia casar, porque achava que eu ia perder a minha adolescência e juventude e nunca mais poderia brincar como dantes. Não foi assim, felizmente, continuei a viver a minha juventude - agora a dois...

Nos anos 80, veio ter comigo a Itália, e ao ouvir a voz dela ao telefone emocionei-me: não acreditava! Ela, a Lívia??? Era a voz inconfundível que ela tinha a falar-me já em Roma.
O Panthéon e a Piazza Navona nessa tarde pareceram-me ter uma luz especial - ao cair da tarde.
Anos depois, foi passar umas  férias connosco quando estávamos em São Tomé. Conversávamos a tomar o pequeno almoço no jardim. Nessa altura ainda era possível "frequentar" o jardim à noite: os mosquitos não apareciam nos primeiros anos que ali vivemos! Aqueles dias com ela, foram um oásis de felicidade e divertimento.


Quando foi o casamento da Gui ela foi a minha convidada; os noivos levavam os padrinhos, o Manuel levou um amigo, o maravilhoso Mariano (que noutros tempos o levava às cavalitas a ver a Académica quando cá vinha jogar) -  e eu, claro, levei a minha maior amiga, a Lívia. 
Devo dizer que os meus filhos adoravam-na! Era a única amiga comum a todos.
A Lívia é a Lívia!”, diziam, “é especial, acabou-se”.
Nos momentos difíceis. de doença, ou tristeza, ou de preocupação, ela estava sempre presente. Tantas histórias poderia contar dela e da nossa amizade! Histórias onde fazíamos frente a tudo e estávamos sempre lado a lado.
Ontem, aconteceu algo de estranho: fizemos vários telefonemas desencontrados: ora eu que não ouvia a chamada, ora ela que não respondia. Houve, porém, uma insistência tal por parte das duas que conseguimos falar ao fim da tarde.
E por que terá sido toda essa insistência? O que teremos sentido lá no fundo da alma que não dissemos uma a outra? Que necessidade era essa de nos falarmos? O saber que o tempo foge, que a vida passa cada vez mais depressa como aquela ampulheta que dantes estava cheia e cuja areia nunca se via descer, até ao momento em que o tempo é curto e então a vemos descer de corrida, sem parar?

Sei que foi mais uma das nossas conversas em que falávamos de novos livros amados, das novas descobertas, ou desilusões. Insultámos os bandidos desta terra, começando por Trump e indignando-nos com o novo governo popular-fascista da Itália que tanto amávamos? 

Eram as nossas conversas, sem meio nem princípio, a que chamávamos “malucas” e que ninguém percebia porque nos divertiam tanto.

Nada dissemos de especial, protestámos uma vez mais com o absurdo de viver, de ter de morrer, como de costume - mas o sentimento que nos unia era tão forte que acabámos a chamada a dizer as duas ao mesmo tempo:

“Temos que nos ver! Temos que falar! Telefonas tu ou telefono eu!"
 E desligámos a dizer isto… Foi a última conversa.

Não acredito em pressentimentos, mas o final da conversa deixou-me agitada, com uma sensação de melancolia forte. 

Senti qualquer coisa na ansiedade dela? Dizia-se irritada com tudo: médicos, pessoas, conversas de velhos! Desligava o telefone durante muitas horas para não ouvir ninguém. 
Queria ler, ter silêncio, música. "E escreves ainda?", perguntei. Há muito tempo que escrevia no computador o seu livro. Disse-me que já não escrevia  nada desde a primeira crise. 
Nunca mais nada será como antes, isso eu sei. Ela está dentro de mim e aqui estará até ao fim dos meus dias. Existirá sempre até eu morrer: ela é a minha melhor amiga!  
(Mesmo que afinal não existam os anjos de Botticelli e que nunca mais nos encontremos!)

domingo, 24 de junho de 2018

CESÁRIA ÉVORA UMA VOZ DE SEMPRE: "SODADE"...

na sua casa do Mindelo

 Quem pensa em Cesária Évora lembra "Sodade"...Talvez nunca se tenham dado ao trabalho de ver a letra. Muitos pensam talvez: "Ah! Saudades de Sâo Tomé!
Nada mais errado: saudades da terra sua, amada, a Ilha de São Nicolau, "nha terra", de Cabo Verde.
Quem mostra’ bo, ess caminho longe, 
Quem mostra’ bo, ess caminho longe, 
esse caminho pá São Tomé (…) 
Sodade sodade, 
Sodade dessa nha terra São Nicolau (…)”
Canta o lamento do que parte e deixa para trás a terra amada…
A “sodade” é, sim, da terra natal, São Nicolau, em Cabo Verde, de onde partiam os escravos – os serviçais - para irem trabalhar nas “roças”, em São Tomé.
Canção que imortalizou a cantora cabo-verdeana, Cesária Évora, uma das mais belas vozes de Cabo Verde e do mundo.
Nasceu em 1941, em 27 de Agosto, no Mindelo, na ilha de São Vicente, em Cabo Verde.
O pai era tocador de cavaquinho e violão e a paixão da sua vida foi sempre Dona Joana, mãe da cantora e de outros filhos.
Mindelo, São Vicente

Quando o pai morre, começa uma vida difícil, aprende com um primo poeta e paralítico a cantar as canções de Cabo Verde: a “morna”, uma melodia repetitiva e melancólica, tanto pela letra como pela música. 
Canto que fala de dor e de solidão, de mar e de lua, de amores e de saudades e de melancolia. 
"Não é alegre nem triste, é uma canção", dizia ela.
Tem uma voz especial suave e baixa e gosta de ir com os amigos “de serenata em serenata”, muitas vezes, apesar da sua juventude, já com um “grogue” ou dois a mais, de saída de um bar.
Depois um dia chega o sucesso. Primeiro em Portugal quando já nem era nova, depois Paris. 

E de Paris…o mundo inteiro, mas descalça. Cantando sempre descalça.
Camille Pissarro, Boulevard Montmartre
Em 2009, recebe “La Légion d’ Honneur” entregue pela ministra da Cultura Francesa, Christine Albanel.
Em 17 de Dezembro de 2011 morre a Diva da Morna. Deixando consternado o seu país e todos os amadores da sua música. 

O enterro é um momento de reunião dos amigos e de tristeza. Fora-se embora para sempre a Diva de pés descalços...



Sodade - Cesaria Evora & Bonga



"L’ invité" - Hommage à Cesária Évora

Rita Mitsouko e Cesária Évora (France)

quarta-feira, 20 de junho de 2018

Quando o mar é uma companhia...

“Dádivas do Mar”, de Anne Morrow Lindbergh, é como certos livros que ensinar escolhas, atitudes e nos fazem companhia em momentos especiais.
Lembro-me de ter lido “Dádivas do Mar”(*) num período bastante difícil da minha vida.
Oferecera-mo, anos antes, uma amiga, psicóloga, mas não me apeteceu ler nessa altura. Um dia, num daqueles dias que o destino traz e para os quais nunca nos sentimos preparados, adoeci. Foi um momento de grande solidão comigo mesma - apesar de rodeada de amor e de amigos.  
Quando abri o livro, deixei-me embalar pelo ritmo tranquilo das palavras que traziam consolação mas sobretudo ajudava a um impulso, mudança de atitude, interrogações e esperança. O encontro connosco, nos pequenos gestos, que nos permitem continuar a querer ajudar outras pessoa.
O livro tem uma capa de cores suaves, sobre o azul, em todas as traduções. Na edição portuguesa vemos um búzio em tons de azuis e prata e o brilho das ondas. Foi publicado numa Editora só de mulheres, a Livros de Seda (*).
A autora, Anne Morrow Lindbergh, foi mulher do conhecido aviador Charles Lindbergh. Com ele participou em alguns voos - considerada ela própria uma pioneira e uma heroína da aviação.
Anne e Charles Lindbergh 
Quando lembramos este casal, pensamos inevitavelmente no drama que os atingiu: o primeiro filho ainda bebé foi raptado e depois tragicamente assassinado. (**)
Charles Lindbergh 
Anne Morrow nasce em 1906, em Englewood, é uma criança  normal, com pais que lhe dão uma boa educação. Era filha de um senador americano e da poeta feminista, Elisabeth Cutter Morrow, que participou nas primeiras lutas feministas nos USA. 
Anne estuda, aplicadamente, e conclui o bacharelato em Artes. Anos mais tarde, receberá três doutoramentos ‘honoris causa’ em diversas universidades conceituadas.
Anne Morrow em 1918

Apesar de um casamento feliz (e do nascimento de mais cinco filhos depois da morte do bebé), a dada altura da vida, refugia-se numa ilha instalada, numa simples casa de praia - quase uma barraca -  sem conforto. 
Anne era uma mulher forte com certeza, mas o desaparecimento e a morte violenta do filho, golpe inexorável e inesperado, traz-lhe muita amargura e desorientação. Talvez pela escrita tenha recuperado um pouco o equilíbrio perdido. 
***
Não é da vida dela que vou falar, mas sim do livro "Dádivas do Mar". Durante a leitura senti o som constante do mar distante, companhia - na recordação e pelas imagens que descreve.
Não só “ouvimos” o mar como “vemos” os búzios e as conchas nacaradas de que fala, enquanto vai pensando.
Englewood
Ali, sente a necessidade de simplificar a vida e deixar para trás tudo o que é inútil. Cansada da 'pressão' que existe nas cidades, no trabalho, na pressa com que se vive, na ausência de um repouso nosso e do silêncio em que possamos ouvir a nossa voz, pensar connosco.
O mar de Luís A. Tinoco
Apanhar um búzio, num dia de sol, com um céu e um mar brilhantes de azul e cor de prata, ver as estrias, a cor rosada pode encher o dia. O nácar da concha e, lá dentro, uma escada de caracol por onde ela espreita como se fosse a linha do seu pensamento.
E no perder-se dentro de um búzio, sente que dá oportunidade a si própria de respirar e viver de outro modo, lentamente, com tempo. Isso permite-lhe sossegar e parar, no presente. Como o movimento do mar, igual, a ondular, a chegada e partida das marés, as ondas de encontro às rochas, ou desfazendo-se devagarinho na areia. Sem tempo. Sem pressa. Deixar correr a areia do búzio... a ouvir o mar.
Na procura da harmonia interior, essencialmente espiritual que possa traduzir-se numa harmonia exterior”, escreve a autora.
Na vida de todos os dias, com um marido e cinco filhos, não é tarefa fácil.
Há muitos modos de conseguir essa harmonia interior e exterior”, explica. Lembra Sócrates,  no Diálogo “Fedro”"Fazei com que o interior e o exterior se harmonizem.” 
Há vários caminhos a seguir. A simplificação é um deles.
Mas a simplificação no dia a dia não é simples, reconhece. E queixa-se:
Há as exigências familiares, nacionais, internacionais, a preocupação de se ser um bom cidadão, há as pressões socioculturais, jornais, revistas, rádio (e televisão!, acrescento eu), as campanhas políticas (…)”
É uma vida não de simplicidade mas, sim, de ‘multiplicidade’. Sinto vertigens com tanta pressão”.

Na vida do ser humano, sobretudo na da mulher, uma série de ‘distracções’ (chamemos-lhe assim) que “destroem a alma”, diz. E que a impedem de se encontrar, de estar bem consigo.
A insatisfação constante, a vontade de fazer mais; de querer isto e aquilo; o orgulho de se ter uma casa assim, ou assado, limpa, com belos objectos; há, ainda, a hipocrisia (involuntária ou voluntária) das relações humanas. No fundo, as armadilhas da modernidade.
Nas breves férias na casa da praia, sem objectos que a distraiam de si - a não ser as suas conchas, entende que é possível viver sem o supérfluo, sem um especial conforto, como na concha vazia de um búzio - em silêncio e concentrada no que é essencial para viver. Trata-se de uma longa meditação, sem dúvida.

É um livro talvez mais dedicado à mulher que, apesar de igual do homem em direitos e deveres (quando isso existe), tem de ir buscar em si, na solidão de um momento, de um dia, de uma semana – ou apenas de uma hora – aquilo de que necessita para poder continuar a dar. E o equilíbrio.
E pode ser, apenas, a realização de pequenas coisas que cria; no pensamento que divaga; na página que escreve; no livro que lê; no jardim que cuida; no arranjo das flores de uma jarra.
A leitura, Berthe Morisot
Naquilo, enfim, que é essencial: onde vai buscar novas forças: naquilo que é o encontro consigo, e que é uma dádiva a si mesma para continuar a “dar”.
Todos os momentos são diferentes e incomparáveis. Não existe o incomparável tout court: existem momentos únicos e incomparáveis.
E a escritora continua na insistência da auto-observação, do auto-conhecimento - e no conhecimento dos outros - através das conchas, da simplicidade e beleza delas. 
Conchas cheias de areia que deixa escorrer pelas mãos nuas e que, vazias, são perfeitas. Cada uma dessas conchas é símbolo de uma coisa diversa. 
A concha da ostra e a pérola simbolizará o absoluto, dentro de nós, ironizo eu.
A mente liberta-se, concentrada, por momentos, no que lhe parece essencial: viver numa concha da qual pode sair.
O tempo passa, então, mais lentamente, e ela prepara o regresso à casa, à cidade barulhenta, à vida quotidiana. Traz consigo, porém, um conhecimento novo pois, tendo aprendido a simplificação, trouxe com ela a vontade de buscar nas coisas simples e essenciais a vida.
 A simplificação da existência pode ajudar a uma verdadeira compreensão da vida: procurar um trabalho sem pressão, ter um espaço para si, conquistar um tempo para a necessária solidão consigo, para a beleza e para a dádiva. 
O livro que Anne Lindbergh escreve é uma conversa lúcida, poética, bem escrita.
No fundo, basta uma meia dúzia de conchas” diz ela, "para se ter tudo". Para se ter paz, sobretudo, e poder compreender e amar.

(*) “Dádivas do Mar”, de Anne Morrow Lindbergh, editora Livros de Seda, tradução de Luís Coimbra, 2007.
(**) Anne Morrow Lindbergh nasceu em 22 de Junho de 1906,  em Englewood, no New Jersey (USA) e morreu em 7 de Fevereiro de 2001, em Vermont (USA)
um Vermont outonal
(***) Sobre  o aviador Charles Lindberg,  Billy Wilder, em 1957, realiza o filme "A águia solitária", com James Stewart. E, em 1976, Buzz Kulik realiza "O caso do rapto do bebé Lindbergh", com Anthony Hopkins e Joseph Cotten.