Nasceu em Brest em 14 de Janeiro de 1878 e estudou
medicina naval em Bordeaux. Viajou muito e viveu na Polinésia de 1903 a 1905 e na China de 1909-1914 e, mais tarde, em 1917. Morreu, acidentalmente e em circunstâncias misteriosas, de causas desconhecidas, em 21 de Maio de 1919 (1).
De facto, depois do seu desaparecimento, durante um passeio normal na floresta de Huelgoat, no Finisterra, foi encontrado morto passado poucos dias. Apresentava apenas uma ferida no calcanhar. Nunca se souberam as causas reais da morte. Contam alguns que tinha pousado, aberto em cima do peito, um exemplar do “Hamlet” de Shakespeare, dizem que no Capítulo III.
Depois
da sua morte, deram o nome de Victor Segalen à “Universidade Victor Segalen II, de
Literatura e Ciências Sociais”, de Bordeaux. No entanto, parece-me bem que, apesar disso, continua um desconhecido por cá.
Recordo algumas informações sobre Victor Segalen. Segundo o tradutor português de A Cidade Proibida, Aníbal Fernandes, Segalen nasceu sob um 'horóscopo' muito complicado:
“Em 1878, quando seis
planetas em signos de terra lhe concertam no céu astrológico um "horror ao
mar" ele que, ironia maior, passa na sua carreira da Marinha.” (2)
Algumas passagens da Introdução ao livro "A Cidade Proibida" (chamada também "René Leys"), na tradução portuguesa, ajudam a perceber o percurso de vida de Segalen:
"Literariamente marginalizado em vida, Victor Segalen é mais tarde uma boa reputação póstuma com direito ao inquérito que apenas consegue dar realce, numa biografia neutra, à mãe autoritária, à miopia forte e à sua morte singular.”
Passa despercebido durante os vinte e cinco anos de vida que correm rápidos.
Sempre solitário, em 1919 instala-se no Finisterra num pequeno albergue situado perto da floresta de “Huelgoat, que é centro mítico do Ciclo do Rei Artur, e, manhã mal nascida, sai de aparente passeio para morrer debaixo de uma árvore com o Hamlet aberto numa cena do III Acto” diz ainda o tradutor português de Segalen. (op.cit)
Da relação entre o etnógrafo e o pintor Paul Gauguin (4) falarei- apoiada noutro livro, “Hommage à Gauguin, l’ insurgé des Marquises” obra de Segalen que foi publicada pela editora Magellan.
Quais as causas da morte?
Quando Segalen desembarca em Papeete, Paul Gauguin morrera três meses antes na ilha de Hiva-Oa, após ter estado na prisão durante três meses devido a uma discussão com um polícia francês. Sofria de sífilis, estava num estado de grande debilidade e morrera com uma overdose de morfina.
Para começar a compreender: quem terá falado a Victor Segalen de Paul Gauguin, o exilado dos mares do Sul?
Em 1903 Victor Segalen parte para o Tahiti, numa missão médica. Tem 25 anos e a cabeça cheia de literatura - mas nunca tinha visto uma pintura ou uma cerâmica do grande Gauguin.
É encarregado de verificar o legado de Paul Gauguin, após a morte do pintor, e nada sabia dele. O que lhe disseram quando desembarcou do navio La Touraine em Tahiti sobre o pintor - personagem “odiada pela colónia” francesa - deve-lhe ter esfriado o entusiasmo:
“Gauguin? Um doido que pinta cavalos cor de rosa!”, disseram-lhe. “Gauguin pertence, com Manet e outros, à família dos pintores malditos”, (isto diz laconicamente André Breton no seu ‘Journal des Iles’, em 1903).
Aproxima-se da figura do grande pintor depois de ver o “legado” estético por ele deixado e de ficar seduzido pela grandeza do pintor e pela sua alma completamente livre. Nessa obra que descobre compreende o génio selvagem do revoltado, “verdadeiramente artista, exilado e solitário...”
Victor Segalen vai participar no leilão das obras do pintor - onde todos os haveres daquele "louco que pintava os cavalos de cor de rosa" são vendidos a preços irrisórios.
No relatório que envia para França, Victor Segalen arrisca-se a tomar uma posição corajosa quando evoca "os tristes restos de um povo com uma vida híbrida de selvagens em vias de perversão civilizada".
Aprendera já com Gauguin “o direito de tudo ousar”? Gauguin fora um "monstro", reconhece Victor Segalen sem outras palavras para o definir, porque o pintor não “entrava em nenhuma das categorias conhecidas que bastam para definir a maior parte dos indivíduos".
O artista colossal e frágil, solar e cheio de desespero; o artista diverso e em tudo excessivo. É esse excesso que dará força à sua obra altiva, dolorosa.
“Gauguin, ex-marinheiro, ex-agente de câmbios, ex-marido, ex-chefe de família, Gauguin que deixou tudo para trás e tudo queimou na vida. Mas se tudo queimava era porque ele também era fogo e ardia”.
E é desse Gauguin "ardente" e rebelde que Victor Segalen vai à procura, ou parte à conquista, numa espécie de peregrinação às raízes, aprendendo com ele o significado de "tudo ousar", quer isso dizer ter a coragem de dizer, pintar, interpretar, simbolizar, imaginar tudo o que achasse importante para a sua arte.
Por essa altura Victor Segalen escrevia em carta ao pintor e amigo de Gauguin, Georges Daniel de Monfreid: "Posso dizer que nada tinha percebido do país e dos seus Maoris, antes de ter visto e quase vivido os desenhos e os 'croquis' de Gauguin."
Quero desejar a todos uma Páscoa Feliz! Que melhor imagem do que este auto-retrato do pintor com o seu "Cristo Amarelo" ?
(2) In Prefácio de A Cidade Proibida, tradução portuguesa de Aníbal Fernandes.
(3) "Hommage à Gauguin, l’ insurgé des Marquises, ed. MAGELLAN and Cie, Collection Traces & Fragments, Paris, 2003.
(4) Paul Gauguin nasceu na Bretanha em Pont d'Aven em 1848 e morreu em Hiva-Ao, nas Îles Marquises (Polinésia Francesa) em 1903. Terra onde, muitos anos mais tarde, viveu e morreu Jacques Brel. Estão enterrados no mesmo cemitério.
(5) Les Immémoriaux, Classiques de Poche, Prefácio de Marie Dollé e Christian Doumet
https://falcaodejade.blogspot.com/2009/11/saga-de-victor-segalen-os-maoris.html
Admiro a obra de Gaugin e conhecia já um pouco da sua biografia, mas não sabia nada de Victor Segalen. Gostei de ficar a saber um pouco mais.
ResponderEliminarum beijinho, obrigada e uma Boa Páscoa
Gaugin é a minha debilidade
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