O escritor finlandês Frans Eemil Sillanpää (1), que suponho pouca gente hoje saiba quem foi, nasceu na Finlândia, em Hämeenkyrö. A Finlândia pertencia ainda nessa altura ao Império Russo.
Este escritor ganhou o Prémio Nobel de Literatura em 1939. Os pais eram agricultores camponeses na aldeia de Hämeenkyrö. Embora a grande pobreza em que viviam, conseguiram que o filho fosse estudar na escola de Tampere. Quando, terminados os estudos, volta à terra vai encontrar os pais na mesma miséria esquálida e sente um grande choque.
Na capital conhece pintores como Eero Jämefelt e Pekka Halonen, os compositores Jean Sibelius e o jornalista e escritor Juhani Aho e os seus gostos afirmaram-se pelo conhecimento e cultura na grande cidade e contacto com esses intelectuais.
Cinco anos mais tarde (1913) deixa Helsínquia e volta para a terra natal. Em 1914, conhece a futura mulher, Sigrid Maria Salomäki, com quem casará em 1916. Adapta-se bem e sente-se feliz por estar na sua terra. De volta à aldeia, começa logo a escrever. Primeiro escreve artigos para o jornal diário, Uusi Suometar, um jornal importante que se publicava em Helsínquia e que mais tarde se vai chamar Uusi Suomi (A Nova Finlândia)e se publicará de 1919 a 1991 (2).
Sillanpää era uma pessoa tranquila que criticava todas as formas de violência e acreditava na evolução optimista da Ciência. O seu livro mais famoso foi o romance “Silja”, traduzido em inglês com o título de “The Maid Silja”, em 1931.
É traduzido em português com o título "Silja" (3). Através desse livro vai ser mundialmente conhecido e, em 1939, é-lhe atribuído o Prémio Nobel de Literatura.
O livro começa assim: "Jussi ou Juhá “era um pobre diabo de aspecto repugnante”. E mais adiante dirá o autor: “Jussi Toivolá não era, entretanto, nenhum louco – apesar do aspecto; no seu cérebro, posto que bastante anémico, reinava perfeito equilíbrio.” (o.cit. Pg.14)
O pai do herói, Penjami Nikkila, pertencia à classe dos camponeses. Tinha umas terras alugadas, tinha uns empregados. A mãe de Jussi, Maija, a terceira mulher de Penjami, era de uma classe mais inferior e sofria por isso. Ter um filho varão foi para ela um triunfo, uma vez que as mulheres eram pouco consideradas - apesar de fazerem a maior parte do trabalho na casa, nos campos, nas colheitas, nos trabalhos pesados, a empurrar os trenós carregados.
Quando Sillänpä, no Capítulo 1, começa a falar da “biografia e infância” de Jussi, Majia
está a dar à luz o seu menino. Sobre esta vinda ao mundo diz o autor: “Nasceu
na aldeia de Harjakangas, herdade de Nikkila, em 1887, numa sexta-feira à noite, véspera do dia de São Miguel." (pg.18)
Penjami Nikkila, o pai, era o senhor - e mandava. Estava sempre fora de casa, na quinta dos amigos, a beber e sempre à volta de outras mulheres. Quando voltava vinha carregado de bebida - o que acontecerá igualmente no dia do nascimento de Jussi, vai voltar de madrugada, embriagado.
Jussa nasce, criança pouco saudável, desenvolvendo-se devagar, pobre ser frágil e desprotegido que luta pela vida sem perceber o que é - um ser por quem os pais não mostram qualquer afecto. O seu lugar é na cozinha com as filhas que o pai tivera das outras mulheres.
A vida sucede-se num círculo
inquebrável e as estações são marcadas pelo imprevisível. O
seu destino será funesto e a
vida sempre madrasta. Não vou adiantar a história da sua vida – mas o
leitor
acompanhará essa história com sentimentos de compaixão e de pena e por
vezes
acabrunhado com as desgraças deste pobre diabo. Arranja amigos, mas nunca faz parte de nenhum grupo, sobe às árvores, olha em redor as florestas luminosas.
“Vidas são vidas” é o título de um dos volumes extraordinários do romance "A Velha Casa" de José Régio. E a Jussi foi-lhe imposta uma vida que não podia ter outro desfecho.
O pai, alcoolizado, deixa de se preocupar com a quinta e vai por ali abaixo, cheio de dívidas, sem produzir nada. Quando morre, a família já não tinha quinta para vender nem dinheiro para comida.
É quando Majia decide fugir com o filho num trenó carregado com o que resta em direcção à cidade. E a luta pela vida começa. O seu destino será funesto e a vida sempre madrasta. Não vou adiantar a história da vida – mas o leitor acompanhará essa história com sentimentos de compaixão e de pena e por vezes acabrunhado com as desgraças deste pobre homem.
No ano em que ganhou o Prémio Nobel, Sillanpää tem, porém, um grande desgosto: a mulher que ama morre deixando-o com oito filhos. Casa, por necessidade, com a secretária, Anna Von Hertzen, mas pouco dura.
Começara a beber e tem de ser internado num hospital por alcoolismo e outras doenças que exigiam cuidados hospitalares. Sai do hospital em 1943 e volta à vida pública, participando de vários Projectos para as crianças.
Vai aparecer muitas vezes nos lugares onde estão crianças que adoram ver aquelas barbas brancas de um senhor que lembra o Pai Natal. Participa em emissões da rádio sobretudo na altura do Natal.
Na Finlândia o escritor é e foi tão amado, ao ponto de ter saído um selo dos correios com a sua cara e também serem feitas em 2013 duas moedas: de 1 euro e 2 euros. Já agora, por curiosidade, existe um asteróide descoberto em 26 de Janeiro de 1938 que tem o seu nome: é o asteróide 1446 Sillanpää (5).
(1) Nasce na Finlândia, em Hämeenkyrö, no dia 16 de Setembro de 1888 e morre em Helsínquia em 3 de Junho de 1964.
(2) O jornal fora fundado em 1847 com o nome de Suometar e publicava-se na capital. Mais tarde, a partir de 1919, vai chamar-se Uusi Suomi (A Nova Finlândia) e continuará a publicação até 1991
(3) Em Portugal foi publicado pela Editorial Inquérito com o título de “Silja”.
(4) “Santa Miséria” foi publicado também pela Editorial Inquérito, na colecção “Os Melhores Romances dos Melhores Romancistas”, traduzido por José Marinho (1904-1975), com uma com um “Prefácio” dos Editores.
(5) Este asteróide que faz parte da “cintura de asteróides” foi descoberto por Yrjö Väisälä, em 26 de Janeiro de 1938, no Observatório de Isso-Heikkilä, na Finlândia.
https://en.wikipedia.org/wiki/Frans_Eemil_Sillanp%C3%A4%C3%A4
https://tvpenedo.com.br/noticia/1056213/colonia-finlandesa-rj-frans-eemil-sillanp
Que interessante! Gosto sempre de ler o que nos traz.
ResponderEliminarE o Ratinho e o Ouricinho e amigos, por onde andam?...Tenho saudades deles e das suas histórias😊
Beijinhos e uma boa semana:))
Não o li ainda, mas reconheci o livro Santa Miséria, está numa estante na casa dos meus pais, não sei se foi comprado e lido pelo meu pai ou pelo meu avô. Vou colocá-lo na lista de próximas leituras
ResponderEliminarum beijinho e uma boa noite
Uma vida dura, como tantíssimas. Ter sido Prémio Nobel de Literatura e um personagem glorioso para sempre no seu país, é um bálsamo para qualquer miséria. Custa a compreender que tenha caído na alcoolismo, talvez por genética ou problemas psicológicos por resolver, cada pessoa é um mundo.Beijos
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