sexta-feira, 11 de outubro de 2013

E O HAITI? AS BIBLIOTECAS TAP-TAP...AH! OS LIVROS!



Li um artigo em Le Monde (5 de Outubro passado), de Hubert Prolongeau, correspondente do jornal, no Haiti.

Escreve, recordando  o sismo que abalou a ilha: 



Aqui, diz-se “12 de Janeiro” como mais ao norte se diz “11 de Setembro”. Foi nesse dia que durante 35 segundos a terra tremeu. E Port-au-Prince, a capital, se desmoronou.

Com tudo o que se passa por este mundo louco, quem se lembra ainda do Haiti??? No entanto, esquecer é ignorar...

A Bienal do Ghetto, no Haiti, reabriu um ano depois do sismo

Carnaval no Haiti, um ano depois do sismo

Sei que somos muitos a lembrar-nos. Sei que este artigo vai trazer novas ideias e esperanças, ideias que podem ser adoptadas noutros lugares, noutras circunstâncias.
Eu não desespero nunca, mesmo desesperando todos os dias: eu acredito que o homem é melhor do que às vezes julgamos...



O artigo fala de uma iniciativa bem positiva: as  BSFBibliotecas Sem Fronteiras- uma ONG que se instalou na capital, na praça frente ao Palácio hoje arrasado, onde se erguem casas-barracas...


Importante esta ideia! Os livros transformam as pessoas. Os livros ajudam a viver. E a sobreviver! 





E a filosofia que a acompanha é simples: “além de simples, é bela: postula que os homens em tempo de catástrofe, precisam tanto de cultura para se reconstruírem, como de comida e roupas.”




A missão é complicada, arrojada! Onde tantas ONGs já fecharam as malas, sem deixar para trás nada que sirva, depois de o dinheiro se ter “evaporado”, esta Biblioteca Sem Fronteiras (1) pensa que o trabalho a fazer “deve ser perene”, ficar para sempre, como diz o seu director Jeremy Lachal.








Apoiando-nos nas estruturas existentes.”

Perceberam que não bastava o envio de livros, num país onde o iletrismo atinge 70% e a delinquência e criminalidade  aumentam. 

País pobre entre os mais pobres, tem uma fome de cultura rara: cafés-filosofia, ateliers de escrita, teatro, sessões de poesia, poetas rebentam por toda a parte.



(...) Tínhamos de agir sobre toda a cadeia do livro: livrarias, casas editoras, bibliotecas.

Estranho fenómeno o que acontece neste país pequenino, onde as ditaduras mais cruéis passaram durante anos: a fome da cultura, a fome do saber! Que importa o paradoxo? 


Prepararam-se bibliotecários, abriram-se outros lugares de aprendizagem. 

Port-au-Prince

Em Port-au -Prince uma biblioteca numérica apresenta à disposição de quem precisar 60 computadores; na Universidade de Estado abriu-se livre o acesso a 22 bases de dados.

Em casa ninguém tem livros, as bibliotecas são de necessidade urgentes

A verdade é que outras bibliotecas se foram abrindo devido ao interesse que esta suscitou!

Esta BSF é itinerante e desloca-se em táxi, é a “biblioteca tap-tap” - que é o nome dos táxis coloridos que vão a toda a parte porque são o único meio de transporte...

Chegam aos bairros afastados do centro, com a música em altos berros. Os animadores desenrolam os tapetes no chão e as crianças das escola aproximam-se. 


A professora pede-lhes que dancem, há risos e brincadeiras, para deixar assinalado o momento mágico. Depois, ela pega num livro. 

O qual vai ser hoje o escolhido?" 

A expectativa é grande. O interesse aumenta. Desta vez, a professora escolheu a história de um burrinho que vai para o mercado. Quando acabam de ouvir a história, a jovem professora dá a cada um um livro, explicando como o usar e guardar esse bem precioso...

Diz o escritor Dany Laferrière, nascido no Haiti,  a viver em Montreal há uns anos: 


"Para um leitor, depois do sismo, a situação era terrificante. Precisávamos de livros. O Haiti é vive por estações: estação sangrenta, estação criadora. Agora vivemos uma Primavera e a BSF acompanha a Primavera.”


Este trabalho da BSF não tem preço. Dá esperança, dá ideias. Já há quem insista na importância de serem distribuídos os livros dos autores haitianos publicados no estrageiro e de difícil acesso aqui porque muito caros. 

Para que não se perca o sentido da própria terra, para que se conheça quem fala sobre ela de dentro... Com o coração.

Para que se “reforce” a magia de viver!

E penso, com tristeza: o que fizeram das nossas bibliotecas itinerantes? A Gulbenkian subsidiava. Já não subsidia?

E quero referir a iniciativa, no Porto, do Hospital de Santo António que está a organizar uma Biblioteca para os doentes, e acompanhantes e pessoal, na qual participam o Bairro dos Livros, com a Cultureprint e as Livrarias como a Livraria Lumière, por exemplo. E com o IKEA.


Biblioteca Universidade 


Cultureprint




Por que não se seguem estas ideias no fim de contas bem simples? Basta um pouco de vontade, alguns livros, muita persistência...



* * * 

(1) Hoje, abre em Paris um Colóquio sobre estas BSF :

Urgence De Lire, Colóquio Internacional, em Paris, na Maison  de l’Amérique Latine, Bv. Saint-Michel, de 11 a 12 de Outubro. 

Podem seguir o colóquio online.



3 comentários:

  1. Interessante!
    E tudo o que diz respeito a espalhar os livros e a cultura é de louvar!
    Os livros oferecem-nos a liberdade.

    Um beijinho grande e bom fim-de-semana! :)

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    1. Tu sabes isso bem, Isabel! Um beijinho e bom fim de semana!

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  2. Maria João,
    Uma opinião de um artigo excelente. Ainda me lembro das bibliotecas itinerantes da Gulbenkian que eu não utilizava porque havia uma biblioteca pública mas que amigas minhas utilizavam. Uma pena que esse serviço tenha morrido.
    Para as crianças que foca e para a professora o desejo de que recebam muitos livros.
    A nossa ditadura não conseguiu felizmente que alguns adormecessem. Os livros liam-se às escondidas e passavam de mãos em mãos, nos que podiam.
    O livro dá-nos asas.
    Beijinho especial. :))

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