Li um artigo em Le Monde (5 de Outubro passado), de Hubert
Prolongeau, correspondente do jornal, no Haiti.
Escreve, recordando o sismo que abalou a ilha:
“Aqui,
diz-se “12 de Janeiro” como mais ao norte se diz “11 de Setembro”. Foi nesse dia
que durante 35 segundos a terra tremeu. E Port-au-Prince, a capital, se
desmoronou.”
Com tudo o que se passa por este mundo louco, quem se lembra ainda
do Haiti??? No entanto, esquecer é ignorar...
A Bienal do Ghetto, no Haiti, reabriu um ano depois do sismo
Carnaval no Haiti, um ano depois do sismo
Sei que somos muitos a lembrar-nos. Sei que este artigo vai trazer
novas ideias e esperanças, ideias que podem ser adoptadas noutros lugares,
noutras circunstâncias.
Eu não desespero nunca, mesmo desesperando todos os dias: eu
acredito que o homem é melhor do que às vezes julgamos...
O artigo fala de uma iniciativa bem positiva: as BSF – Bibliotecas Sem
Fronteiras- uma ONG que se instalou na capital, na praça frente ao Palácio hoje
arrasado, onde se erguem casas-barracas...
E a filosofia que a acompanha é simples: “além de simples, é bela: postula que os
homens em tempo de catástrofe, precisam tanto de cultura para se reconstruírem,
como de comida e roupas.”
A missão é complicada, arrojada! Onde tantas ONGs já fecharam as malas, sem deixar para trás nada que sirva, depois de o dinheiro se ter “evaporado”, esta Biblioteca Sem Fronteiras (1) pensa que o trabalho a fazer “deve ser perene”, ficar para sempre, como diz o seu director Jeremy Lachal.
“Apoiando-nos nas estruturas existentes.”
Perceberam que não bastava o envio de livros, num país onde o
iletrismo atinge 70% e a delinquência e criminalidade aumentam.
“País pobre entre os mais pobres, tem uma fome de cultura rara: cafés-filosofia, ateliers de escrita, teatro, sessões de poesia, poetas rebentam por toda a parte.
(...) Tínhamos de agir sobre toda a
cadeia do livro: livrarias, casas editoras, bibliotecas.”
Estranho fenómeno o que acontece neste país pequenino, onde as ditaduras mais cruéis passaram durante anos: a fome da cultura, a fome do saber! Que importa o
paradoxo?
Prepararam-se bibliotecários, abriram-se outros lugares de
aprendizagem.
Port-au-Prince
Em Port-au -Prince uma biblioteca numérica apresenta à disposição de quem precisar 60 computadores;
na Universidade de Estado abriu-se livre o acesso a 22 bases de dados.
Em casa ninguém tem livros, as bibliotecas são de necessidade
urgentes
A verdade é que outras bibliotecas se foram abrindo devido ao interesse que esta suscitou!
Esta BSF é itinerante e desloca-se em táxi, é a “biblioteca
tap-tap” - que é o nome dos táxis coloridos que vão a toda a parte porque são o único
meio de transporte...
Chegam aos bairros afastados do centro, com a música em altos berros. Os
animadores desenrolam os tapetes no chão e as crianças das escola aproximam-se.
A professora pede-lhes que dancem, há risos e brincadeiras, para deixar assinalado o momento mágico. Depois, ela pega num livro.
“O qual vai ser hoje o escolhido?"
A expectativa é
grande. O interesse aumenta. Desta vez, a professora escolheu a história de um
burrinho que vai para o mercado. Quando acabam de ouvir a história, a jovem
professora dá a cada um um livro, explicando como o usar e guardar esse bem
precioso...
Diz o escritor Dany Laferrière, nascido no Haiti, a viver em
Montreal há uns anos:
"Para um leitor, depois do sismo, a situação era terrificante.
Precisávamos de livros. O Haiti é vive por estações: estação sangrenta, estação
criadora. Agora vivemos uma Primavera e a BSF acompanha a Primavera.”
Este trabalho da BSF não tem preço. Dá esperança, dá ideias.
Já há quem insista na importância de serem distribuídos os livros dos autores haitianos
publicados no estrageiro e de difícil acesso aqui porque muito caros.
Para que
não se perca o sentido da própria terra, para que se conheça quem fala sobre
ela de dentro... Com o coração.
Para que se “reforce” a magia de viver!
E penso, com tristeza: o que fizeram das nossas bibliotecas itinerantes? A Gulbenkian subsidiava. Já não subsidia?
E quero referir a iniciativa, no Porto, do Hospital de Santo António que está a organizar uma Biblioteca para os doentes, e acompanhantes e pessoal, na qual participam o Bairro dos Livros, com a Cultureprint e as Livrarias como a Livraria Lumière, por exemplo. E com o IKEA.
Por que não se seguem estas ideias no fim de contas bem simples? Basta um pouco de vontade, alguns livros, muita persistência...
E quero referir a iniciativa, no Porto, do Hospital de Santo António que está a organizar uma Biblioteca para os doentes, e acompanhantes e pessoal, na qual participam o Bairro dos Livros, com a Cultureprint e as Livrarias como a Livraria Lumière, por exemplo. E com o IKEA.
Biblioteca Universidade
Cultureprint
Por que não se seguem estas ideias no fim de contas bem simples? Basta um pouco de vontade, alguns livros, muita persistência...
* * *
(1) Hoje, abre em Paris um Colóquio sobre estas BSF :
Urgence De Lire, Colóquio Internacional, em Paris, na Maison de l’Amérique Latine,
Bv. Saint-Michel, de 11 a 12 de Outubro.
Podem seguir o colóquio online.
Podem seguir o colóquio online.
Interessante!
ResponderEliminarE tudo o que diz respeito a espalhar os livros e a cultura é de louvar!
Os livros oferecem-nos a liberdade.
Um beijinho grande e bom fim-de-semana! :)
Tu sabes isso bem, Isabel! Um beijinho e bom fim de semana!
EliminarMaria João,
ResponderEliminarUma opinião de um artigo excelente. Ainda me lembro das bibliotecas itinerantes da Gulbenkian que eu não utilizava porque havia uma biblioteca pública mas que amigas minhas utilizavam. Uma pena que esse serviço tenha morrido.
Para as crianças que foca e para a professora o desejo de que recebam muitos livros.
A nossa ditadura não conseguiu felizmente que alguns adormecessem. Os livros liam-se às escondidas e passavam de mãos em mãos, nos que podiam.
O livro dá-nos asas.
Beijinho especial. :))