Venho falar um pouco de um escritor alentejano de que gosto
muito: Brito Camacho. Tem páginas magníficas sobre o Alentejo, sobre as
vidas difíceis nos montes e povoados, as “casas da malta”, a vida dos ganhões. E retratos e descrições primorosos.
Manuel Brito Camacho nasceu em Aljustrel em 12 de Fevereiro de 1862, vai fazer 152 anos!
Foi médico, formou-se aos 27 anos em Medicina na Escola Médica de Lisboa. Morreu em Lisboa em 1934.
Foi jornalista, director de um jornal republicano, escritor, político...
Terra alentejana (MJF)
Foi médico, formou-se aos 27 anos em Medicina na Escola Médica de Lisboa. Morreu em Lisboa em 1934.
Foi jornalista, director de um jornal republicano, escritor, político...
Brito Camacho (centro), António José de Almeida, Teófilo Braga
“Por Cerros e Vales” é um relato curioso de uma viagem, em
vários episódios, que leva o autor do Algarve a Aljustrel, sua terra natal, acima e abaixo, até ao Terreiro do Paço, em
Lisboa.
O primeiro episódio, “Por barlavento”, fala-nos da beleza de certos lugares do
Algarve, “Pelos campos” – passa pelos Montes do
Alentejo e continuando, por aqui e por ali, "Pelas Beiras", de um lado e
de outro do Mondego, andando, andando e comentando, são páginas magníficas
sobre o nosso país, mas em especial sobre o Alentejo.
Alentejo, sépia
“O Alentejo não é uma província, é um país”, diz, a dada altura, o amigo Dr.
Moura Pinto.
Céu alentejano MJF)
“Mais do que um país” -acrescenta Brito Camacho- “na opinião
de um ignorado autor d’um poema inédito – Cardos
mastigueiros, em que o Alentejo se define assim, quanto aos seu tamanho:
"Tenho de mim para mim,
E até já o vi escrito,
Que o Alentejo é
infinito,
Não tem princípio nem
fim."
As descrições do autor mostram bem o seu conhecimento e o seu
amor pela terra alentejana.
“Céu nublado, calor
húmido, ares de trovoada. As searas em ondas de grande amplitude, dão aos
campos a aparência de um mare magnum (...) Com as excepções do estilo, os
montes da minha infância eram palhotas de taipa batida, cobertas de telha vã,
de forma rectangular. A casa de fora, casa de entrada, era ao mesmo tempo cozinha,
rouparia e casa de jantar.”
Céu nublado e oliveiras
Paro, a páginas 187 do livro, para vos contar a história que ele refere, com humor.
Sabe-se que Nisa e Alpalhão – como tantas terras do Alentejo
e de outras províncias- têm uma rivalidade-quase-ódio, coisa sem explicação.
(Como me lembro de ouvir, em criança, também, que Elvas e Portalegre não tinham
comparação: cada um dos habitantes das duas cidades vizinhas (separadas por 50 kms) privilegiava as “maravilhas” da sua cidade, sentindo-a superior à outra.)
O autor tenta dar uma
explicação divertida dessa antipatia: Nisa e Alpalhão – qual a sua culpa?
“Eu saíra de Lisboa no firme propósito de ser um mediador da
paz entre Nisa e Alpalhão, firmar nas duas povoações, há muito desavindas
(...). Não imagine o leitor que os romanos de Alpalhão tinham raptado as Sabinas
de Nisa. Tal não sucedeu ou pelo menos não o conta a História nem o refere a
tradição.
Alentejo, fotografia de Stego
O caso foi que, num sermão da semana santa, em Nisa, um
façanhudo pregador, ao reboar o estrondo do caixão, fechado com violência,
depois de nele metido o corpo do Senhor, exclamou, com fúria, como quem
denuncia um crime horrível:
'- Ah, cães de
Nisa, que mataram o vosso Deus'.
E a multidão que enchia o templo, una voce,
mulheres, homens e crianças, apavorados como numa antevisão do Inferno, os
olhos afogados em lágrimas, a voz cortada de soluços, gritaram em direcção ao
púlpito:
'- Não fomos nós, foram os de
Alpalhão'."
Tenho de me rir, já me tinha esquecido da explicação! Nisa é concelho, Alpalhão é uma freguesia de Nisa...
E o autor continua, ironicamente:
"A partir desse momento, um ódio de morte atira frequentemente
os habitantes de Alpalhão contra os de Nisa e os de Nisa contra os de Alpalhão,
como se uns fossem guelfos e os outros gibelinos." (p.187, 1ªedição, Livraria
Guimarães e Cª)
E, com esta bela história viva e cheia de humor, me fico...
Alguns dados sobre o
autor: Manuel Brito Camacho nasceu em Aljustrel em 1862. Foi médico, formou-se aos
27 anos em Medicina na Escola Médica de Lisboa (com uma tese sobre a
Higiene e sobre a Hereditariedade).
Foi também militar de carreira –chegou a coronel. Mas foi sobretudo um político e um jornalista importante. Republicano desde a adolescência, em 1888 destaca-se como presidente da associação Académica de Lisboa. A seguir ao Ultimatum inglês (1890) colabora nos jornais a Pátria e no efémero O Intransigente.
Em 1906, dirige o jornal republicano Lucta. Em 1910, com o advento da República, é Ministro do Fomento do Governo Provisório.
Nessa altura, a sua acção
ficou marcada por ter fundado o Instituto Superior Técnico de Lisboa.
Brito Camacho, por Aquilino Ribeiro e F. Mira
Foi também militar de carreira –chegou a coronel. Mas foi sobretudo um político e um jornalista importante. Republicano desde a adolescência, em 1888 destaca-se como presidente da associação Académica de Lisboa. A seguir ao Ultimatum inglês (1890) colabora nos jornais a Pátria e no efémero O Intransigente.
Em 1906, dirige o jornal republicano Lucta. Em 1910, com o advento da República, é Ministro do Fomento do Governo Provisório.
Brito Camacho, 1911
Outros livros do autor:
além de “Por cerros e Vales”, “Gente Rústica”, “Terra de Lendas”, “contos
Selvagens”, “Quadros Alentejanos", "Rescaldo da Guerra" são alguns títulos...
Maria João, muito curiosas estas linhas sobre Brito Camacho!
ResponderEliminarNunca li nada dele, apesar dos seus livros "circularem" por cá...
Um beijinho.:))
Interessante, tudo o que conta!
ResponderEliminarA história das rivalidades é engraçada. Havia muito disso, antigamente, essa rivalidade entre as terras. Por aqui também havia alguma rivalidade entre Castelo Branco, capital do distrito e a Covilhã.
Gostei das suas fotos e os livros devem ser interessantes. Gosto do aspecto deles.
Um beijinho grande :)
Venho matar a saudade.
ResponderEliminarE que coisa mais boa é ler tudo isso, aprender muito e sentir o cheiro da terra, atravês das asas desse falcão admirável.
bjs muitos.