René Magritte
Yohan Cohen, Yoav Hattab, Philip Braham
libertação dos campos: crianças ainda a sorrir (Mike Lewis)
Não ficaria contente comigo se o não escrevesse, por isso o digo: os bárbaros
chegaram a Paris! Ou os bárbaros estão em todo o mundo? Inútil responder, não íamos a lado nenhum. Mas ter medo, não! Dizer o que se pensa? Sim!De barbaridades está a vida cheia, dirão alguns. Mas não a este nível. Porque desta vez foi perto de nós, na nossa Europa. Nunca esqueci um filme belga terrível que se chamava “C’est arrivé près de chez vous” – o horror se passava na casa ao lado e ninguém sabia de nada, ou não queria saber…
Desta
vez, foi bem à vista! Claro que me refiro também ao jornal Charlie Hebdo e à matança
vergonhosa, ignóbil, chocante. No entanto, não quero esquecer que houve
mais barbaridades que foram menos faladas: a polícia, a jovem martinicana, morta com um tiro pelas
costas – covardia suprema!
E, ainda, a carnificina no supermercado judaico “Hyper-Cacher”: cacher é a palavra para indicar que a comida que ali se vende foi preparada
segundo as regras da cacherout judaica. Assim como também há os super-halal, em que a carne
ou outros alimentos seguem o ritual de abatimento seguido pelos muçulmanos que, por coincidência irónica, é igual ao dos judeus. Porque judeus e muçulmanos vivem juntos e entemdem-se em França.
reféns libertados, no Hyper-Cacher
Ora
nesse super-mercado de judeus, o terrorista (outro, diferente dos dois primeiros do Charlie) depois de ter assassinado a jovem mulher polícia, om calma, depois de perguntar-lhes o
nome, acaba por matar quatro pessoas: judeus todos. Esses mortos foram enterrados, em Jerusalém. Ali repousarão em paz: coisa que a vida lhes não deu...
Diz Esther Muznik num artigo do dia 13, em o Público: "As 4 vítimas judias do atentado em Paris estão a ser enterradas em Jerusalém,
no mesmo cemitério Har Hamenuhot (Monte do Repouso), onde jazem também desde 2012 as crianças e o
professor assassinado por Mohamed Mera, em Toulouse;
Assim como Ilan Halimi (*) assassinado em Paris, três semanas depois de ter sido raptado e torturado.”
Ilan Halimi
Por isso quis
falar deles, porque a memória tem de ser completa e esta foi mais uma acção
bárbara e primitiva contra o sempre “odiado” judeu.
Vi, há dois dias, na Arte/TV, um documentário inesquecível sobre os campos de concentração: filme perdido e
reencontrado -agora que passam os 70 anos da 'libertação' dos campos de concentração.
As bobines com o filme estão hoje no 'War Museum of London'. André Singer, documentarista há mais de 40 anos na BBC. resolveu aceitar a proposta para acabar o projecto de Bernstein. E Emil Weiss entrevista sobreviventes dos campos. O filme-documentário do horror sai.
filmando...(foto in Le Monde 10-01-2015)
Uma amiga, ingénua e ignorante, perguntou-me um dia: “Israel... para que foi preciso
inventar Israel? Só arranjaram sarilhos. Os judeus viviam bem em toda a parte,
nos sítios onde estavam…”
Pois
é, viviam... Mas um dia, ao acordar, os que se tinham inserido e adaptado aos tais sítios -onde tinham
nascido eles, os pais deles e etc-, foram presos, reunidos como gado, metidos em comboios e mandados
para os campos de extermínio: morreram 6 milhões.
Diziam: "Voltar atrás? Onde é a nossa casa - se nos expulsaram do nosso sítio que era a Europa? Voltar mas para onde? Julgámos fazer parte de um mundo europeu e civilizado, e os que julgávamos amigos traíram-nos, entregaram-nos. Enviaram-nos para locais de morte, sofrimento, tortura: quiseram exterminar-nos. Como voltar atrás?"
E muitos quiseram ficar por aqueles sítios horrendos um tempo, para se readaptarem à vida.
Um dia, porém, ouviram falar da Palestina, onde se tinham acolhido muitos judeus, de outras perseguições, dos vários pogroms e ghettos de todo o mundo. E decidiram ir para lá...
Depois, depois foi o que foi: encontraram um sítio! O sítio deles. E será difícil tirá-los de lá. E com razão. Morreram seis milhões sem que ninguém mexesse um braço...
E relembro, pois, o tal documentário extraordinário que vi na Arte/TV: um filme inglês - filmado intencionalmente "para um dia provar que 'aquilo' tinha mesmo existido". Talvez conhecessem bem demais o homem - e previssem o "negacionismo" que surgiu mais tarde...
Imagens insuportáveis de ver! O olhar estupefacto é também o dos repórteres militares ingleses e americanos que filmam o que viram. Daquilo que foi a libertação dos campos.
Filmam os montes de mortos, às centenas, nus, em pilha, de expressões martirizadas, olhos abertos, pele e osso, à espera de serem queimados. Bergen-Belsen, Dachau, Buchenwald, Ebensee, Mathausen.
E todo o filme é uma ansiedade que se sabe necessária mas dolorosa.
Hitckcock não realizou o filme, mas deu-lhe forma, organizou-o. Chamava-se simplesmente German Concentration Camps Factual Survey. Os 'realizadores' foram o sargento Mike Lewis e William Lawrie, ingleses, Arthur Mainzee, americano, e Vorontsov, russo.
O organizador e promotor da ideia do filme em si foi Sidney Bernstein, presidente da Sociedade de Filmes de Londres e produtor e foi ele que convidou Hitchcock.
"Voltar atrás? Onde é a nossa casa - se nos expulsaram do nosso sítio que era a Europa?"
sobrevivente de Bergen-Belsen, 19-20 Abril de 45
Quando, saídos do pasmo e do horror de anos, foram libertados, muitos dos sobreviventes judeus recusaram-se a voltar para "casa". Diziam: "Voltar atrás? Onde é a nossa casa - se nos expulsaram do nosso sítio que era a Europa? Voltar mas para onde? Julgámos fazer parte de um mundo europeu e civilizado, e os que julgávamos amigos traíram-nos, entregaram-nos. Enviaram-nos para locais de morte, sofrimento, tortura: quiseram exterminar-nos. Como voltar atrás?"
E muitos quiseram ficar por aqueles sítios horrendos um tempo, para se readaptarem à vida.
Um dia, porém, ouviram falar da Palestina, onde se tinham acolhido muitos judeus, de outras perseguições, dos vários pogroms e ghettos de todo o mundo. E decidiram ir para lá...
Depois, depois foi o que foi: encontraram um sítio! O sítio deles. E será difícil tirá-los de lá. E com razão. Morreram seis milhões sem que ninguém mexesse um braço...
E relembro, pois, o tal documentário extraordinário que vi na Arte/TV: um filme inglês - filmado intencionalmente "para um dia provar que 'aquilo' tinha mesmo existido". Talvez conhecessem bem demais o homem - e previssem o "negacionismo" que surgiu mais tarde...
Imagens insuportáveis de ver! O olhar estupefacto é também o dos repórteres militares ingleses e americanos que filmam o que viram. Daquilo que foi a libertação dos campos.
Auschwitz, 1945
Algumas cenas são tiradas igualmente de filmagens do exército russo, que libertou Auschwitz- Birkenau. Filmam os montes de mortos, às centenas, nus, em pilha, de expressões martirizadas, olhos abertos, pele e osso, à espera de serem queimados. Bergen-Belsen, Dachau, Buchenwald, Ebensee, Mathausen.
Bergen-Belsen, 1945
Filmam os fornos ainda com ossos; filmam os sacos, bem catalogados, de cabelos de mulheres, de dentaduras, de escovas de unhas (sim! porque os judeus -ingénuos!- julgaram que iam apenas ser movidos para outro lugar, que lhes disseram ser termas, lugares de repouso, e foram com as suas malas de viagem, com os filhos pela mão, viajar...)E todo o filme é uma ansiedade que se sabe necessária mas dolorosa.
Bergen-Belsen
Hitchcock foi contactado por Bernstein para ajudar à montagem do filme, em 1945, em Londres. E um dia confiou a Henri Langlois (fundador da Cinemateca Francesa): "No fim da guerra, realizei um filme visando mostrar o que se passou nos campos de concentração. Atroz. Era ainda mais atroz que os piores filmes de horror. Ninguém o quis ver. Era demasiado insuportável. Mas esse filme nunca mais me abandonou." Hitckcock não realizou o filme, mas deu-lhe forma, organizou-o. Chamava-se simplesmente German Concentration Camps Factual Survey. Os 'realizadores' foram o sargento Mike Lewis e William Lawrie, ingleses, Arthur Mainzee, americano, e Vorontsov, russo.
O organizador e promotor da ideia do filme em si foi Sidney Bernstein, presidente da Sociedade de Filmes de Londres e produtor e foi ele que convidou Hitchcock.
"Voltar atrás? Onde é a nossa casa - se nos expulsaram do nosso sítio que era a Europa?"
Será que o "penar" dos judeus não tem fim? Por que não dizemos todos hoje: "Je suis juif"?
Bem, eu digo: "Sou judeu"!
"Eu sou humano"!
Bem, eu digo: "Sou judeu"!
"Eu sou humano"!
(*) Ilan Halimi foi raptado em 2006 pelo chamado "clan dos bárbaros", em Paris. Foi torturado e, 3 semanas depois, foi morto. Porque era judeu e "devia ter muito dinheiro", disseram os raptores. O atentado à escola judaica de Toulouse foi em 2012.
Como é possível seres humanos fazerem isto a outros seres humanos?
ResponderEliminarTantas barbaridades por esse mundo fora...
Um beijinho e desejo-lhe um bom fim-de-semana:)
A verdade não pode ser ocultada. Nunca. Quem pensa o contrário está redondamente enganado e, mais tarde ou mais cedo, o torcionário, o assassino, o algoz, há de ser descoberto. Mais, Por mais alienado que seja, a pena que a consciência lhe determina nunca mais o vai deixar em paz.
ResponderEliminarO que é trágico é o homem deixar-se instrumentalizar, não querer reconhecer os seus próprios erros, não aprender com eles. E quantas vezes a vítima se transforma em carrasco?
Lembrei-me do livro e do filme Exodus (o filme com o Paul Newman)
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