sábado, 21 de agosto de 2021

EÇA DE QUEIROZ, “ CARTAS DE INGLATERRA”

Uma leitura inesperada no momento que corre: o Afeganistão e as Cartas de Inglaterra” (1), de Eça de Queiroz, actuais como ele o é muitas vezes.

 
Fuga de Kabul, El país

Falar do Afganistão parece ser agora -e como Eça refere no livro - um “humorístico logar comum” do século XVIII em que se afirmava que “A Historia é uma velhota que se repete sem cessar.”

Seja como for, este livrinho foi para mim uma descoberta magnífica porque, além de gostar imenso de ler o Eça, ainda pude descobrir muito do seu humor cáustico ou simples ironia a falar – não apenas do Afeganistão ou da Irlanda e da Índia - como também do eterno nariz empinado dos ingleses. 

Os capítulos do livro são variadíssimos, todos interessantes mas alguns especiais mesmo.

Além do capítulo que refiro, “O Afganistão e a Irlanda”, há muitos outros com assuntos variadíssimos: “Os Inglezes no Egipto”  -dividido em 6 mini-capítulos completíssimos - , “O Brazil e Portugal” e, ainda, “O Inverno em Londres”, “Acerca de livros”, ou, simplesmente, “O Natal” ou “Literatura de Natal”. 

É um pequeno apontamento o que vos deixo “empurrando-os” para um pedaço de literatura ao modo “epistolar” de um escritor riquíssimo com uma mente aberta, crítica, irónica. 

mosaico representa Alexandre o Grande, em Isso
  
Pobre Afeganistão na concupiscência de todo o mundo, desde Alexandre o Grande!

Começa assim o primeiro capítulo do  livro:

 Os inglezes estão experimentando, no seu atribulado império da Índia, a verdade desse humorístico logar comum do século XVIII: “A Historia é uma velhota que se repete sem cessar”.

 

"O Fado ou a Providência, ou a Entidade qualquer que lá de cima dirigiu os episódios da campanha do Afghanistan em 1847, está fazendo simplesmente uma copia servil, revelando assim uma imaginação exhausta."

 
Afeganistão 2001 e a Guerra à vista
 
"Em 1847 os inglezes, “por uma Razão d’ Estado, uma necessidade de fronteiras scientificas, a segurança do império, uma barreira ao domínio russo da Asia...” e outras cousas vagas que os politicos da India rosnam sombriamente, retorcendo os bigodes – invadem o Afghanistan e ahi vão aniquilando tribus seculares, desmantelando villas, assolando searas e vinhas: apossam-se, por fim, da santa cidade de Cabul."
Cabul ou Kabul

"Sacodem do 'serralho' um velho emir apavorado; colocam lá outro de raça mais submissa, que já trazem preparado nas bagagens, com escravas e tapetes; e, logo que os correspondentes dos jornaes têm telegraphado a victoria, o exército, acampando à beira de Arroios e nos vergeis de Cabul, desperta o correame, e fuma o cachimbo da paz... Assim é exactamente em 1880.”(2)

Afeganistão, hoje, imagem de El país


Algumas notas sobre a história do Afeganistão (3):

O Afeganistão foi invadido muitas vezes ao longo da sua história e as suas fronteiras têm sido alvo de disputas e conquistas. O primeiro invasor foi Alexandre o Grande; depois pelos Árabes, sob a dinastia Abássida – causando a conversão da maioria dos seus habitantes ao Islão. 

Gengis Khan (1162-1227)

T
Tamerlão 1336-1405
Mais tarde foi invadida por leste e norte pelos Mongóis (uma vez por Gengis Khan e outra por Tamerlão); depois sucedem-lhes os Cazares Russos, mais tarde a Rússia Soviética. Entretanto meteu-se-lhes pelo meio as várias guerras Anglo-Afegãs –do Império Britânico através da Índia Britânica. 

Mais recentemente os Estados Unidos. Esses interesses podem ter sido devidos à sua situação geográfico-estratégica no meio da Eurásia – para o controle da Ásia Central e dos seus recursos naturais. Historicamente a conquista do Afeganistão pelo Império Britânico teve um importante papel na invasão da Índia pelo Oeste, através do passo Khyber. ”

Não podemos dizer que o Afeganistão tenha tido uma história feliz ou tranquila. O que virá por aí ninguém o sabe. 

Boa leitura! O Eça vale sempre a pena.

(1 )Eça de Queiroz, "Cartas de Inglaterra", Porto, Livraria Chardon de Lello & Irmão – Editores, 1905

(2) Segui a grafia da 1ª edição de 1905 de “Cartas de Inglaterra”, que leio.

(3)

https://pt.wikipedia.org/wiki/Afeganist%C3%A3o

(4) 

 https://pt.wikipedia.org/wiki/Invas%C3%B5es_do_Afeganist%C3%A3o

2 comentários:

  1. As Cartas de Inglaterra, crónicas que o Eça escrevia para a Gazeta de Notícias do Brasil quando era consul em Bristol, são realmente uma delícia, como absolutamente tudo o que saiu da sua pluma priveligiada.
    Feliz semana, cheia de coisas boas!!

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  2. Numa época em que somos invadidos nos jornais nacionais por artigos de opinião sobre a tragédia do Afeganistão, sem qualquer interesse, vai-me saber bem ler este "Eça cronista", que nos oferece neste seu belo post.
    Uma boa semana e obrigado.
    Rui Luís Lima

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