Alexandre Magno, Getty Museum
Há dias suicidou-se, em Atenas, um reformado, farmacêutico, 77 anos, que se revoltou contra a mise à mort decretada pela Europa à Grécia: “eu não quero ir buscar comida aos caixotes do lixo!”, dizia no bilhete que deixou.
"Não consigo viver nestas condições e por isso prefiro pôr fim à vida."
Suicidou-se simbolicamente na Praça Syntagma, onde durante quase dois anos se manifestaram os jovens - e os menos jovens- Gregos.
"Não consigo viver nestas condições e por isso prefiro pôr fim à vida."
Suicidou-se simbolicamente na Praça Syntagma, onde durante quase dois anos se manifestaram os jovens - e os menos jovens- Gregos.
Milhares de Gregos vieram nesse mesmo dia manifestar-se, na mesma praça contra o governo dos cortes. Traziam anémonas, malmequeres...
A Grécia está pelas horas da morte, pois...
Então todos os estratagemas são bons para “sobreviver”!
Foi vergonhosa a maneira como a Europa tratou a Grécia e a “crise grega”: que era não só da Grécia, mas sim de nós todos.
A Grécia é um "maillon de la chaîne" que “deu de si”, mas nenhum dos outros elos da cadeia está livre de se quebrar.
Culpam os gregos sem saber sequer o que dizem. Chamando-lhes “gastadores”!
Mas quem os empurrou para “gastar”?
Conhecemos bem o que se passou por cá. Por lá deve ter sido o mesmo.
“Ah! Eles não pagavam as taxas!", queixavam-se por cá os “europeus”.
Sim, os restaurantes não pagavam as taxas, não davam recibos, achavam há muito que não deviam ser só eles a pagar a crise.
Depois de dois anos de protesto e manifestações em que lutaram com unhas e dentes para evitar as medidas de cortes violentíssimos (1). Mais chocante ainda quando se "ouve" o Presidente do "Eurogrupo", Jean-Claude Juncker reconhecer, há dias, que "a austeridade imposta à Grécia foi um grave erro. Deveria ter-se, sim, insistido desde o início na dimensão do crescimento"...
A Grécia era uma cultura, era o berço da Antiguidade Clássica e foi tratada como "lixo".
A Grécia era uma cultura, era o berço da Antiguidade Clássica e foi tratada como "lixo".
Os gregos hoje sobrevivem: e todos os estratagemas são bons para “sobreviver”.
Teatro de Epidaurus
A Europa “abandonou” depressa a Grécia que tanto a admirou nos tempos passados! Nos anos 50, a Grécia “adorava” a Europa: “a longínqua, exótica, a fabulosa Europa”, como escreve Yannis Kiourtsakis no seu livro (Le Dicôlon, saído agora em França).
A personagem do seu livro pensava: “A Europa é as luzes, o progresso, a civilização. (...) A nossa pequena Grécia tem ainda muito que caminhar”.
Como foi maltratada a Grécia pela Europa que ela tanto amava!
É, ainda, o escritor, Kiourtsakis que afirma: “mas os Gregos têm algo de precioso que falta aos Europeus “civilizados”: têm a humanidade, um coração de homem e este estado de espírito especial que é a herança da cultura antiga”.
Movimento de protesto "O Topos Mou", num supermercado
De facto, se a Grécia está pelas horas da morte, a verdade é que juntos encontram os estratagemas para sobreviver...
Um deles é a chamada “Guerra da Batata”!
Depois das Guerras do Peloponeso...
E das Guerras Médicas...
Vem a Guerra da Batata -igualmente importante!
Depois das Guerras do Peloponeso...
E das Guerras Médicas...
Vem a Guerra da Batata -igualmente importante!
batata do Brasil ABBA
“Este movimento da batata não é apenas o sinal do empobrecimento do país. É também um novo exemplo de iniciativas de solidariedade que se espalham pela Grécia em crise.”(Le Monde de 13 de Março)Dos pobres aos remediados e às classes “consideradas” médias, os gregos fazem fila para comprar sacas de batata, no bairro chic de Atenas – Kifissia – que vêm em camiões, do Norte, de Navrokopi.
E o seu slogan é: "Keep talking Greece", não esquecer a Grécia...
Alguém que decidiu equilibrar as coisas e pôr um pouco de justiça.
A batata é comprada directamente aos agricultores (com recibo!), e vendida a preço normal, quando nos supermercados subira a preços astronómicos.
Um dos que estão na fila é o jornalista Kostas Ghikes (que está desempregado) que diz ao colega francês: “vão ver o mesmo em breve nos vossos países...”
Um dos que estão na fila é o jornalista Kostas Ghikes (que está desempregado) que diz ao colega francês: “vão ver o mesmo em breve nos vossos países...”
Parece que, depois desta, vai vir a Guerra da Farinha. A seguir a Guerra do Azeite...
Como refere Eric Aeschiman (agora, “Le Nouvel Observateur” de 22/27 de Março): a Grécia de Homero "mexe”, agita-se, protesta. "Há uma ebulição perceptível. Criam-se colectivos, fazem-se petições".
Na Praça Exarchia a juventude organiza conferências, Nos “cafés filosóficos”, os filósofos na moda animam “seminários” e discute-se".
E pensamos nos filósofos da Antiguidade, nos debates na praça pública, na "Apologia de Sócrates" - exemplo de todo o Ocidente!
Platão, "visto" por Rafael (Capela Sistina)
Gérard David, Morte de Sócrates
Nas praças de Atenas, hoje, debatem os temas que preocupam:
“Será que a Grécia foi vítima do seu caso especial? Ou foi apenas uma “amostra” do que é na realidade um “desregulamento Mundial”?(...)
“É urgente desmistificar a insistência racista sobre a especificidade do caso grego (...)”, defendem os filósofos V. Scoumbi e Dimitris Vergetis.
O filósofo Antonis Liakos (Professor formado em História, em Inglaterra) afirma: “Se recusamos os planos de austeridade, por outro lado contestamos igualmente o “cerrar-se” do país num nacionalismo que pode ser perigoso.”
Fala de “capitalismo”:
“É uma política doutrinária e hipócrita. “Crise”, “hipocrisia”, “crítica” são da mesma família. E cria o “jogo de palavras:”
“Hoje a hipocrisia alimenta a crise e só a crítica poderá acabar com ambas.”
Talvez a modernização acelerada da Grécia tenha sido um erro. Uma espécie de “caricatura do homem ocidental: o consumismo, o narcisismo, o dinheiro fácil, o kitsch... Tudo depressa de mais. (...) É uma crise antropológica, que diz respeito ao mundo inteiro”, afirma Yannis Kiourtsakis.
“Hoje a hipocrisia alimenta a crise e só a crítica poderá acabar com ambas.”
Talvez a modernização acelerada da Grécia tenha sido um erro. Uma espécie de “caricatura do homem ocidental: o consumismo, o narcisismo, o dinheiro fácil, o kitsch... Tudo depressa de mais. (...) É uma crise antropológica, que diz respeito ao mundo inteiro”, afirma Yannis Kiourtsakis.
Faz-me pensar no “caso português”...
E fico a admirar os Gregos! Ah! Grandes Gregos!
Alexandre Magno, mosaico, Museu Arqueológico de Nápoles
"Espíritos aventureiros que perseguem um fim difícil de atingir"...
Assim são definidos os Argonautas...
E nós?
Onde estão os nossos heróis?
Na luta do dia a dia...
Na luta do dia a dia...
São tempos muito complicados que precedem a chegada de um mundo novo, que nós talvez já não vejamos. Oxalá seja melhor e mais justo que este, e não deixe pelo caminho demasiada desolação!
ResponderEliminarA nossa História sempre esteve e estará feita de incertezas e muito, muito sofrimento.
Temos que viver a nossa vida o melhor que nos seja possível, enquanto fôr possível. Para nós já é tarde para " lanzarnos al ruedo", assim que a "apurar la copa", que queda muy poco vino...
O passado da Grécia será sempre "o nosso passado", o mais brilhante e transcendente.
No entanto há muitos anos que, juntamente com a España e Portugal, nos tínhamos habituado a ser sempre os últimos da fila, a última carruagem. Volta o nosso triste destino, mas a nível individual temos que procurar ser felizes, o dinheiro é importante, mas não o mais importante.
Uf! que discurso me saiu. Admiro muito a tua capacidade de espraiar-te, eu normalmente sou bastante sintética, quase telegráfica às vezes, mas é tudo por preguiça...
Oxalá tenhas um feliz domingo, apesar da crise e de tudo. Beijinhos grandes
Pois é...Estava a ver que não me vinhas ler! Bom domingo de Páscoa para ti e "meninos"!
ResponderEliminarEu espraio-me demais,quem me dera ter mais síntese - até fiquei espantada de me "reencontrar" no meio daquilo! Andei ali perdida, quase entre Sylla e Caríbdis...
Mas esta realidade tem-me enervado e "enojado".
Pobres Gregos, dizem! Grandes Gregos, dizemos nós!
Beijinhos
Como vai Little Lord D.?
O meu professor, na 2ª classe, há quase 60 anos, dizia-nos: os ricos vão ficar cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais e mais pobres... É a realidade, cada vez mais actual, mas que um dia, será breve?, terá que acabar.
ResponderEliminarImpõe-se um mundo novo, uma nova maneira de olhar os outros, de sermos mais fraternos e solidários nos sentimentos e nas acções.
Os pássaros da foto no Faial são mesmo verdadeiros... belezas do "meu" arquipélago!
Boa Páscoa.
Abraços amigos e fraternos
Raul
MJ,
ResponderEliminarUma tristeza as notícias vindas do berço da civilização.
Gostei muito desta postagem a remeter-nos para o que importa e obrigando-nos a pensar nas palavras do escritor grego Kiourtsakis.
Tanta beleza que recebemos dos gregos para agora asfixiar com o liberalismo económico com a anglo-saxónia a comandar e a Gália a ir atrás da onda.
Não conheço o escritor mas a próxima vez que for à biblioteca procuro-o.
Grata!
Beijinho e bom final de Páscoa!:)
Adoro o teu sentido do humor.
ResponderEliminarSiempre te querré.
Eu gosto de as ler às duas (duas" meninas" muito especiais) e aprendo sempre.
ResponderEliminarBoa semana em família.
Um beijinho grande
Excelente reportagem. Hoje, tal como ontem, somos e seremos gregos. Une-nos o humanismo, o respeito pelo homem e pela sua dignidade.
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