sábado, 21 de setembro de 2013

Desistir? Não, nunca! Temos que continuar a imaginar a Cidade Ideal!



Há  tempos, desiludida, comecei a pensar que não valia a pena falar, escrever ou intervir, nem indignar-me, porque o vazio da resposta à volta era sempre o mesmo. E a cidade ideal quando será real?

E as vozes de algumas sereias a sussurrarem: "Ai, não vale a pena...."

Queria resultados mais rápidos? Claro que queria. 


E dizia para mim: “Não sou eu que vou mudar o mundoPara que me ralo? Mais vale calar-me e deixar andar”, pensava eu, com um pouco de amargura.

O tempo foi passando, entre a desentusiamo com o que se passava em roda e o fingir que não via nem ouvia, num morno desencanto. 


Nada muda do dia para a noite, dir-me-ão. Mas já lá vão muitas noites e o dia nunca mais aparece!

"Talvez seja a culpa do Verão"..., pensei ainda. Talvez, quem sabe?

Depois vieram os amigos, escreveram os amigos e senti-me melhor. 

Conversar do que passou nas nossas vidas, e foi bom, faz bem à alma. Se passarmos a vida a olhar para trás, a pensar só nisso e a sofrer, ah! então só faz mal à alma.


Quero contar-lhes que li uma coisa que me dispôs bem e me deu ânimo.
Perguntarão: "alguma coisa se mexeu na podridão do Reino da Dinamarca?"

Não, no reino da economia e do dinheiro selvagens, na concorrência vergonhosa (desleal já é pouco dizer...), na falta de respeito pelo ser humano cada vez mais fragilizado não se passou nada. 

O ser humano foi jogado ao chão como um boneco que não serve!


Joachin Sollora, Pobreza

Bem, no Reino da Dinamarca  de cá, nada mudou mesmo. O boneco continua no chão... 

Mas ouvir falar do que se protesta noutros reinos já é bom.

Estou farta de ouvir falar dos ricos que enriquecem cada vez mais na crise e na classe média que, de média, passou a baixa, e de baixa passou a pobre; das gentes a quem não deixam dignidade; das pessoas que cada vez mais vão comer a sopa que dantes era dos pobres... 

Como aceitar?!
Pessoas na cidade do Porto, à espera de comida (*)

Ontem mesmo, vi uma imagem no FB que me arrepiou: uma fila de gente (novos, velhos, desempregados, reformados) que esperavam exactamente isso que estão a pensar: a sopa dos pobres. 

No Porto, na cidade-nação de que nos orgulhamos, no Porto industrial (?), do dinheiro (dinheiro de quem?)! É chocante e vergonhoso!


Disfarçando a pobreza, num Carnaval

E as notícias giram, sensaboronas,  à volta do que dá audiências, dos escândalos, das histórias de "maria-não-me-mates-que-sou-tua-mãe" - para adormecer quem vem cansado do trabalho- ou das publicidades enganosas que defendem o dinheiro dos patrões deles... 
Ou a mostrarem os pobres à hora do jantar: à hora em que ninguém vai pensar nisso, entre uma garfada, um olhar de esguelha à TV e uma ida à cozinha buscar a coca-cola.


outros pobres, outras terras (net)

Como suportá-lo?!

Bem, foi no Nouvel Observateur que li a editorial do seu director, Jean Daniel, que leio há anos e que muito admiro pela coerência e equilíbrio dos julgamentos e das suas opiniões bem fundamentadas.

Falava do projecto de um Nouvel Observateur “renovado” -  na modelação das ideias, na preparação dos conteúdos e não no formato - que é o mais fácil. Falaria de um N.O. “revoltado”? Não, porque já há 50 anos que o é.

São apenas necessários "arranjos", acertar algumas "agulhas". No fundo e não na forma... 

E Jean Daniel refere o novo projecto (já em curso, a partir deste número), citando as palavras do chefe de redação, Laurent Joffrin.

O seu projecto? Contra a crueldade da economia, uma sociedade humana. Contra as loucuras do famatsmo, uma sociedade da razão. Contra a confusão mediática, uma sociedade do escrito, seja ele impresso ou numérico (...).”


Respirei fundo. Alguém ainda está a pensar...

E respirei fundo: ele referia a importância da opinião “séria”, medida, pensada, apoiada em documentos. Com jornalistas que escrevam a verdade, e se informem! E recusava o uso da “opinião descartável”, como o papel A4, ou as fraldas...

E eu de acordo com eles, feliz da vida, claro! 
por que razão há cada vez mais ricos?

Porque a verdade é que, quando a informação se torna numa coisa descartável, que caduca e  apodrece em segundos, logo que chega uma nova informação toda fresquinha, por vezes oposta, a sair, incompetentemente feita e descartável logo...
Informação que, tão perecível  como a anterior, porque opinião sem opinião, não fundamentada,  vai  caducar em três tempos - então, temos que voltar à opinião pensada, ao tempo de reflexão. 

Digam-nos coisas sérias! Façam pensar quem não pensa, ilustrem os ignorantes!

a pobreza é fatal como o destino?

Num mundo em que todo o gato tem uma coluna a dar a sua opinião, mesmo sobre aquilo que não sabe (aqui no nosso reinozinho, há tantos!) – é bom que apareça o artigo sereno, preparado e que nos dá tempo a formar a tal opinião nossa, que hoje  anda, vagabunda...

Que nos faça as perguntas certas. Ou nos ajude a encontrar as respostas que não nos dão...

“Quando a informação se torna em produto que perece, abundantemente gratuita, quando o espectáculo dos sons e das imagens se sobrepõe e destrói o sentido, apelamos para o recuo e distanciamento necessários, para o passo atento e reflectido, para a leitura silenciosa longe da cacofonia mediática”.

Uma nova vida?, pergunta Jean Daniel. Pelo menos muitas coisas novas que vão num bom sentido: "acerto, enriquecimento dos assuntos e das opiniões, aperfeiçoamento. Renegar o que se fez? Nunca, porque os ideais nunca se renegam.”

Parabéns pela decisão e pela consciência! Bem, e obrigada! Deu-me um certo alento...


(*)http://entreasbrumasdamemoria.blogspot.pt/2013/09/assim-vamos-na-sopa-dos-pobres.html

5 comentários:

  1. Já nem encontro palavras para o que se está a passar na Europa (com incidência muitíssimo grave na Grécia e em Portugal), mas por este andar, é um comboio descontrolado e desgovernado, que só para quando descarrilar, e o acidente final não vai ser coisa bonita de se ver... tristeza...

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    1. Sim, muito grave. Assusta-nos... Mas não devemos desesperar, sim protestar!
      Abraço

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  2. Às vezes existe mesmo um certo cansaço, por não ver mudar nada, ou mudar para pior, mas depois algo nos dá alento e vontade de continuar a fazer o que é possível: uns escrevendo, outros ensinando nas escolas, outros lutando de outra forma...
    Se acreditamos em algo e procedemos de acordo com isso, alguma diferença há-de fazer!
    Gosto dos seus post! Contagia-nos! É tão bom acreditar!

    Um beijinho grande :)

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    1. Gosto muito de te ouvir dizer isto!

      "vontade de continuar a fazer o que é possível: uns escrevendo, outros ensinando nas escolas, outros lutando de outra forma."

      Com toda a indignação possível e com toda a vontade de que as mesntalidades mudem! E tu estás bem colocada para pores a cabeça dos teus meninos a pensar por eles, depois de te ouvirem! hahaha!
      beijinhos

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  3. Não se indignar, fazer de conta que as coisas não existem é a maior pobreza de todas. As coisas andam e param assim, dentro das nossas casas.
    Lutar amiga é sempre a melhor saída para garantir comida e dignidade nas mesas e nos lares.

    bjs nossos, muitos e sempre

    admiramos você, sabe disso.

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