quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Poema de José Duro, O meu amigo


Picasso, Le buveur d'absinthe (1903)


O meu amigo

Ele era um doido bom, um doido visionário,
Que andava quase sempre de olhos rasos d’ água,
E, às vezes, costumava a soluçar, com mágua,
A lenda original dum Fado extraordinário…

Entrava na taberna assim que anoitecia,
Bebia só absinto e nunca se fartava;
Daí, quem sabe lá se no absinto achava
Um meio de esquecer a dor que o oprimia…

Amava a cor do luto e odiava a cor o ouro,
E é certo que deixou –estranho tipo aquele!....-
Poemas de nevrose em que só punha Choro…

E eu, que desejo ser o que ninguém deseja,
Julguei-me, por ventura, um doido como ele…
Que um doido já eu sou, embora não no seja!

Picasso, Le bock (1902)


"Fel", O Livro do meu Amigo, Guimarães Editores, 11 edição, 1983

1 comentário:

  1. Muito bonito!
    Os poemas de José Duro são bonitos. Ainda bem que os trouxe até aqui e nos deu a conhecer este poeta.

    Um beijinho grande:)

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