domingo, 24 de março de 2013

Domingo de Ramos e alecrim...há tantos anos!



Um pintarroxo e um ramo de alecrim


Eu tinha uns sete, oito ou nove anos e, nesse tempo, vivia intensamente todas as festas do calendário.
um bolo de Natal, feito pela Mané

Era o Natal, antes de tudo o mais, e a expectativa das prendas no sapatinho que ia procurar, embrulhada num cobertor quentinho, numa manhã fria de Dezembro.


Era o Carnaval e os saquinhos de tecidos variados cosidos à máquina pela Hermínia que era a nossa costureira e que nós enchíamos de feijões frades ou de grão de bico. Eram as máscaras e as serpentinas, os bandos de mascarados e os papelinhos de todas as cores!

Depois, era o momento da Páscoa e da primavera... A Páscoa e os folares de bolo finto, com ovos cozidos e pintados, enterrados lá dentro e enfeitados com tiras de massa do bolo cruzada, em feitios variados. A Florinda, de surpresa,  fazia-nos uns lagartos com uma amêndoa na boca.

Lembro-me de estar a pintar os ovos, depois de cozidos em águas coloridas. 


ovos pintados (Internet)

O meu desenho preferido era um chinês, num ovo que tinha sido bem fervido em água com açafrão o que lhe dava uma bela cor amarela. 

Desenhava-lhe uns olhos rasgados, uns bigodes caídos (que hoje comparo aos do meu Ratinho Poeta...) e colava-lhe no alto da cabeça um chapéu  de cartão triangular, geralmente azul-turquesa. E ia espetar o ovo num dos folares dentro do forno.


E lá chegava o domingo de Ramos. Aproximava-se a Páscoa.

pormenor da "Última Ceia", de Leonardo da Vinci

Lembro-me bem desses domingos porque era nesse dia que devíamos pedir as amêndoas. Para isso, tínhamos de ter raminhos de alecrim e, com eles, “prendíamos” quem viesse visitar-nos lá a casa.

alecrim com flor

O primeiro era logo o meu pai que ficava com três raminhos na lapela do casaco, logo de manhã, presos com alfinetes. O perfume era tão bom! Por vezes havia umas florinhas pequeninas azuladas...

Depois era a vez do Avô que aparecia por lá, ao serão. Com sorte, ainda apanhávamos o Tio Fausto alguma vez...

Eram só os homens que prendíamos. No fundo, as mulheres nesse tempo não tinham um emprego e, logo, não tinham dinheiro delas...
Ficavam todos “presos, enquanto cantávamos, deliciadas:

“Verde é
Verde cheira
Fica preso
Até à quinta-feira!”


Era na quinta-feira seguinte que esperávamos receber os saquinhos de amêndoas... Nessa noite, talvez a avó nos explicasse que o Cristo tinha entrado nesse dia em Jerusalém. Ou talvez não. A minha avó gostava muito do Cristo da paixão. …Sim. Talvez nos contasse:

“Ele é justo e traz a salvação; ele é pobre e vem montado num jumento; vem sobre um potrozinho filho de uma jumenta “ (Zacarias, 9.9)
Começava a Paixão de Cristo...


11 comentários:

  1. Gostei de tudo!
    É bom as crianças terem oportunidade de ficar com tão bonitas recordações. Hoje em dia parece que não se vivem as coisas com tanta alegria e tanta intensidade.
    Gostei muito das imagens - há tempos que não viamos por aqui o Ratinho Poeta e o Ouricinho!

    Um beijinho grande

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  2. Mais uma bela memória registada. :)
    Também me lembro de em pequena ir à missa do Domingo de Ramos. Do meu pai nos fazer os ramos e de oferecermos à madrinha no Domingo de Páscoa. Nunca fui a uma missa da Páscoa porque esperávamos ansiosas a vinda do padre e da cruz que entrava em nossa casa e na casa dos nossos tios. Era uma correria para estarmos sempre à espera da cruz em casa de toda a família,
    Lembro-me das amêndoas e dos doces que nos esperavam em cada casa. Tempos em que os ponteiros do relógio andavam mais lentamente.
    Beijinhos e obrigada pela partilha e pelo cheirinho a alecrim. :))

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    1. É verdade... Coisas que não se esquecem! Boa Páscoa, minha querida!

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  3. Sem dúvida, magníficas recordações!!
    Tempos em que os ponteiros do relógio andavam mais lentamente, como escreveu a Maria e, tudo era vivido com mais alegria e intensidade, como escreveu a Isabel.

    Os nossos amiguinhos também estão com a expressão de quem está à espera das amêndoas!!
    Ha, ha, ha!!

    Um beijinho grande, MJ!:))

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    1. Vivia-se com mais intensidade...porque tínhamos o tal tempo que agora foge mais depressa, Cláudia!

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  4. Gosto muito de recordar contigo. Acho que nunca o faço, não sei porquê, por isso voltar a essas coisas tão bonitas graças a ti, é como voltar a uma grande festa. Lembras-te das coroas e colares que fazíamos com as flores dos lilases? No meu quintal havia um branco e outro lilás, ainda hoje adoro essa flor. E os brincos de cerejas, e os colares de pinhões! Está-me a dar a saudade para a bijouteria...
    Sabes, tenho a impressão de que se recordamos o passado em solidão, não dá prazer, antes pelo contrário, sentimo-nos mais sózinhos e velhos. É imprescindível poder fazer a pergunta: "Lembras-te quando...?
    Lembras-te quando ainda tudo era possível?
    Um beijinho

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    1. Bem, vamos pensar que "ainda é possível muita coisa"!... Tudo, nunca é.Nunca foi. Nunca será. Por isso: "lembras-te de quando?????" Claro que me lembro! Estávamos lá as duas...

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  5. É verdade, Maria: As recordações só são boas quando partilhadas... a escrevê-las e a pensar que não estás só, que alguém (talvez!) te vá ler.
    Agradeço às minhas leitoras amigas!!!!Boa companhia me fazem!

    Os amiguinhos estavam com vontade de vir para a rua! tenho que os segurar!


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  6. Não os segures, vai para a rua detrás deles!! Deixa que te levem onde tu queiras ir.
    Beijinho

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  7. Sempre me emocionam as suas recordações! Obrigada pela partilha.
    Beijinhos e saudades
    Luísa

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