“O chá é uma das principais cortesias com que se agasalha o
hóspede (...), nesta importante arte puseram estas nações muito do seu primor e
cortesia.” (decidi "actualizar" a grafia, para facilitar).
Assim fala João Rodrigues, padre jesuíta e escritor -autor da História da Igreja do Japão- citado por Armando Martins Janeira no seu interessante livro: "O Impacte português sobre a civilização japonesa" (pg. 254).
Assim fala João Rodrigues, padre jesuíta e escritor -autor da História da Igreja do Japão- citado por Armando Martins Janeira no seu interessante livro: "O Impacte português sobre a civilização japonesa" (pg. 254).
Antes, Luís Fróis, outro intelectual jesuíta, falara da
importância da cerimónia do chá na sua História
do Japão, descrevendo-a, brevemente.
Mas João Rodrigues debruça-se com mais pormenores,
interessando-se não só pelos utensílios usados, as qualidades do chá, o ritual, as
escolas e teorias sobre o modo de fazer o chá mas igualmente pela filosofia que
está por detrás da cerimónia e que “inspira –como diz Martins Janeira- esta
arte rara que, depois de compreendida, permite mais do que qualquer outra
penetrar na profunda formação mental dos
Japoneses e na natureza específica da sua sociabilidade.”
"A arte do chá – cha-no-yu, ou, melhor, cha-do - como outras
artes, veio da China. Nela estão combinados elementos das duas mais antigas e
brilhantes civilizações asiáticas, a indiana e a chinesa (...) Na combinação
harmoniosa dos elementos estrangeiros, interveio o génio japonês: do amor da
simplicidade e da modéstia, do gosto refinado que suprime a ostentação (...)
compôs o Japonês um rito social que ensina a beleza pura da vida e a “geometria
moral” que situa o homem no seu próprio lugar num harmonioso universo” (Martins
Janeira, oc.p.253)
Explica João Rodrigues: “(...) o banquete não é de excessos e
demasia, comendo cada um e bebendo sobriamente (...) e só falam se necessário,
havendo em tudo grande modéstia e sossego”.
Mais, insiste: “um modo sem fausto, retirado e solitário à
imitação dos solitários do ermo que, afastados do trato mundano (...) se dão à contemplação
das coisas naturais”.
E João Rodrigues fala de uma certa rusticidade dos materiais, em terracota simples.
E João Rodrigues fala de uma certa rusticidade dos materiais, em terracota simples.
Esta filosofia de vida leva a procurar a maior pureza na cerimónia e uma forma quase meditativa na atitude.
Segundo Martins Janeira, o primeiro “mestre do chá” japonês –que
definiu nos seu moldes definitivos essa
arte, foi Sen no Rikyu (1522-1591).
Era um monge budista Zen, nascido em Osaka, e vai "codificar" a cerimónia. Foi mestre do chá do shogun Oda Nobunaga e, depois, de Toyotomi Hideyoshi.
Era um monge budista Zen, nascido em Osaka, e vai "codificar" a cerimónia. Foi mestre do chá do shogun Oda Nobunaga e, depois, de Toyotomi Hideyoshi.
shogun Oda Nobunaga
Toyotomi Hideyoshi (1610)
Era a época em que os Portugueses andavam pelo Japão, e a
arte do chá interessa os jesuítas: era um modo mais de “entrar” (compreender para evangelizar) no espírito
japonês.
biombo em estilo "namban"
“Perceberam os astutos jesuítas que este ritual era um meio
imprescindível de convívio que o chá implicava.”- escreve Martins Janeira.
Assim se explica que, no cristianismo nascente, surgisse a adaptação de tais rituais- e que no Japão houvesse influências mútuas.
A cerimónia do chá teria influenciado a liturgia da igreja e, ao
mesmo tempo, o ritual do chá japonês “ganhou” alguns aspectos formais da
liturgia católica. (oc. pgs. 258, 259)
Ginkakuji (1473) talvez a primeira casa de chá
“ A semelhança de certos gestos é tal que não pode deixar de se notar à primeira vista. Fróis conta como So-i Antão convida um padre a celebrar a missa na sua casa de chá, que os Japoneses olham com a maior reverência, pois têm a sua pureza como o maior consolo na terra.”
shogun Tokugawa Hidetada
Um dos mais conhecidos mestres do chá foi um "cristão" da família Takeida que, além de entendido nesta arte também se entendia em espadas. O shogun Tokugawa Hidetada premiou-o pelas duas artes...
Hideyoshi Yoshi, shogun trepador e lua
Muitos “mestres de chá” eram, pois, cristãos – ou tinham simpatias por essa
religião...
Takeyama Ukon, o guerreiro cristão (morre em Manila, em)
(Nota: Quando os missionários portugueses são expulsos em 1587, refugia-se em casa de amigos cristãos, mas, quando a religião krishinita é proibida no Japão por Tukugawa Ieyasu (1614) acaba por fugir para Manila (onde morre, em 1615), procurando refúgio junto dos jesuítas espanhóis.)
o shogun Tokugawa Ieyasu
O próprio Sen no Rikyu
terá sofrido a influência de São Francisco Xavier, Fróis e outros, segundo diz
Martins Janeira.
Parece, aliás, ter sido por ter descoberto uma ligação entre
ele e um grupo de cristãos rebeldes, a razão pela qual o shogun Hideyoshi o
mandou fazer hara-kiri, aos 71 anos...
o que resta hoje da casa de Sen no Rikyu, em Osaka
Nem tudo eram rosas, nesta arte, pelos vistos...
Resta-nos a beleza, a simplicidade e a pureza da cerimónia do chá. E a admiração que os portugueses sentiram por ela quando a descobriram.
Resta-nos a beleza, a simplicidade e a pureza da cerimónia do chá. E a admiração que os portugueses sentiram por ela quando a descobriram.
MJ,
ResponderEliminarQue beleza de post. Sou fã de chá e de tudo que vem do Oriente. A arte é bela, as palavras são belas. Uma felicidade vir até aqui.
beijinho. :))
Bela viagem.
ResponderEliminarGosto de chá, agora gosto ainda mais...
Saudações
Lindíssimo, a importâncis dos gestos, que só sabemos quando já estão socialmente perdidos. Todos os rituais escondem uma filosofia de vida,
ResponderEliminarmaravilhosa a cerimónia do chá, refinada e simples ao mesmo tempo — " rito social que ensina a beleza pura da vida e a geometria moral que situa o homem no seu próprio lugar num harmonioso Universo".
Este post dá paz!
Muitos beijinhos