quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

"A Invenção do selvagem", título da Exposição no Musée du Quai de Branly, em Paris



Invenção do selvagem? Qual selvagem?

Abriu no passado dia 28, em Paris, no Musée du Quai de Branly, uma Exposição que se intitula: “Exibições, a invenção do selvagem” e que durará até ao dia 3 de Junho de 2012.

                 Musée du Quai de Branly

O organizador é nada mais nada menos do que o ex-jogador, ex-estrela da equipa de futebol de França, Lilian Thuram, natural das Antilhas francesas.

Lilian pediu a sua reforma desportiva em 2008, e, como Membro do Conselho Federal da Federaçãp Francesa de Football,  pede a demissão em 2010. 

Criou,  uma fundação, a “Fondation Lilian Thuram, éducation pour le racisme.”

A luta contra o racismo –seja ele de que natureza for- é sempre uma coisa a defender e a divulgar!

Aqui fica pois mais uma mensagem em garrafa...

Já agora: Lilian Thuram nasceu em Pointe- à Pître (Guadalupe), em 1972, e foi viver para França aos 9 anos  de idade.

Colecção Lévi-Strauss, alfinete dos índios Bororo (Brasil)

A ideia da Exposição vem de Pascal Blanchard, co-comissário da "Exhibition", historiador e coordenador do livro: “Os Zoos humanos: no tempo das exibições humanas” (Nicole Bancel, Sandrine Lemaire e Pascal Blanchard, Ed. La Découverte).



http://www.monde-diplomatique.fr/2000/08/BANCEL/14145.html

Parece impossível, não é? Mas até ainda há bem pouco tempo o “diverso”  era mostrado no Circo, nas tendas das feiras e, também, em locais mais sofisticados como o Jardin d'Acclimatation, em Paris.

Nesta entrevista muitas coisas de interesse se surgiram, como não podia deixar de ser. Entre outras, é o próprio Thuram que diz:

“Em 2002, estava eu a jogar no FC de Barcelona quando Pascal Blanchard veio fazer uma conferência sobre os “Zoos humanos”. Fiquei aliviado: percebia finalmente o mecanismo do racismo, o modo como se formaram os imaginários do selvagem. Esta exposição é a terceira que a minha fundação realiza.

A primeira acção  foi a apresentação do meu livro: “As minhas estrelas negras, de Lucy a Barak Obama”; a segunda visou uma aproximação anti-racista nas escolas elementares.”

Philippe Dagen (crítico de Arte) escreve, num pequeno artigo: “ O primeiro assunto é a percepção do outro, nos países ocidentais, desde o Renascimento. Todo o indivíduo considerado ("apercebido como") diferente, inquietante ou apenas pitoresco. Assim, surgem as coisas “bizarras” da natureza: anões, gigantes, obesos, mas também os “homens de cor”. Eu lembro Frantz Fanon e a "negritude"...

Esta exposição faz um inventário dessas figuras da alteridade. A distância tem um lugar considerável: os embaixadores vindos do Sião que o rei Luís XIV recebe; os Iroqueses e Algonquins que chegam à corte de Inglaterra. 

(...) Nas obras que os descrevem, o estupor vai até à incredulidade: “Como podem ter existido na criação divina seres como estes?, perguntavam. Com costumes e hábitos tão diferentes dos “'nossos'?"

Alguns tentam compreender, é certo. Outros, não, é claro... 
“A maior parte -continua Dagen- pensa no lucro, apoderando-se das terras lá longe, organizando a escravatura nas plantações da América. Desde o século XVII que o homem negro é o “escravo” e poucos se indignam com isso na altura...”

Lembra Thuram: “Alguns ainda foram exibidos em jaulas, no Jardin d’Aclimatation em 1931.” 

(Entrevista a Lilian Thuram, em Le Monde de 29 de Novembro de 2011)

A humilhação, o espanto, a dor... Quem fala deles?

Com esta Exibição não se pretende vitimizar ou culpabilizar ninguém, apenas mostrar como, de geração em geração, fomos condicionados por crenças sem fundamento

É importante pôr uma distância entre nós e isso para melhor compreender. Descentralizarmo-nos.”

estatueta da Colômbia, Colecção Lévi-Strauss

No Musée du Quai de Branly existe já a colecção que Levi-Strauss legou antes de morrer e que ainda visitou. Intitula-se "Passeio entre os objectos". 

Levi-Strauss que bem conheceu todo esse mundo incompreendido, desde  "Tristes Tropiques" a "La Pensée Sauvage", livros de riqueza  e ensinamentos inigualáveis para a compreensão do "outro".


http://www.quaibranly.fr/en/collections/tailor-made-walks/claude-levi-strauss-walk-amongst-the-objects.html

Poucos souberam tão bem falar desses “selvagens” inventados como ele. Com tanta inteligência, humanidade e amor...

Deixo algumas imagens das maravilhas que esses “selvagens” fizeram.

6 comentários:

  1. Gostei muito de ler o seu texto.
    A exposição deve ser interessante.
    Sorte de quem a pode ver.

    Um beijinho

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  2. Vamos avançando, mas porquê tão desesperadamente devagar?
    Já cheira a fim de semana, sê feliz!
    Beijinhos

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  3. O racismo, o pior da humanidade. Aterrador pela actualidade também!
    Beijinhos

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  4. Que post interressante Falcão, mais uma trincheira aberta e tem de ser não é? o racismo só mudou de apresentação, entretanto coma crise mundial, voltam as velhas frases. Bom ter vindo aqui e ver tudo isso, as vezes desanimamos um pouco.

    bjs de todas nós

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  5. Racismo que não é só marcado pela cor; cada vez mais o poder do dinheiro e a ganância a mostrarem formas diferentes de racismo e de descriminação.
    Até quando?
    Um texto de alerta e de muita actualidade.
    Obrigado
    Abraço,
    Raul

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  6. Sim, voltam as velhas frases e as velhas "atitudes"...Racismo social subreptício, hipócrita (ou não..) é o que há mais!
    Abraço e bom week end

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