quinta-feira, 19 de julho de 2012

Ensinar, para quê?

O que é “ensinar”?
É comunicar, claro, é “tentar” dar o que se  sabe, é “tentar” abrir portas e janelas sobre o mundo.
Tudo a partir de qualquer coisa que se sabe – porque se estudou. É um lugar comum, mas digo-o à mesma: ninguém sabe nem pode ensinar sem aprender de “outros”.



"la maestrina", do filme de Comencini

O que é “ensinar”?

Robin Williams, professor do "Clube dos poetas mortos"

a frágil planta...

É uma coisa - não direi efémera mas apenas “frágil”-  que o professor vai entregar a outros, como se passasse para outras mãos o seu saber. 

Penso nas "corridas de estafetas", penso no simbolismo e na simbologia dos Jogos Olímpicos.

Penso até nos versos de Régio tão mal interpretados por vezes. Ele fala da sua loucura e eu peço-lhe o verso emprestado para falar de educação...

Ergo-a como um facho a arder na noite escura..."  e sinto que "entrego" essa luz ao que vem depois de mim, e esse entregará a outros até ao fim dos tempos, saindo das ténebras e da noite escura.

Ensinar é como um “bichinho” bom que entra dentro de nós e que temos que mostrar –revelar?- aos outros. Porque gostamos desse bichinho.

Tenho uma grande alegria quando as minhas antigas alunas se lembram de mim, ou se chegam um pouco mais. Sinto um calor muito bom dentro do peito.
Mas não me vou comover! 

Porque hoje eu venho aqui para "gritar" e para me “solidarizar” com os professores que farão uma “vigília” de protesto contra os desmandos que vão pela “Educação”... Com um E grande!

Como penso que ser professor é uma condição “para sempre”, sinto-me “atingida” sempre que atingem as minhas e os meus colegas, apesar de "retirada" !

E não posso –nem quero!- ficar de parte.

Resta-me a palavra e é com ela que venho dizer que chega!

Penso que muitos não saberão exactamente o que se passa com os professores.
Seres estranhos, há quem pense, que “aturam meninos”, ou que “não aturam meninos”, queixam-se as mães, exaustas, que entregaram os filhos aos professores, porque a vida pesa e o trabalho é muito; pessoas que “ensinam” –ou que não ensinam, queixam-se tantos pais, carregando todas as culpas e frustrações das vidas para cima dos professores...

Não sou pessoa de emoções violentas –pelo menos externas- exteriorizo pouco, mas, por dentro, “ardo” e anseio, como todos...
E a utopia é palavra do meu vocabulário do possível.

Comovo-me sempre, ao ver o filme "Cuore" (1) com a figura da "maestrina dalla penna rossa" que vi em Itália pela primeira vez...

Tudo isto vem a propósito de mais “intervenções” do governo. De desrespeito, de tentativa de “divisão”!

Elas são tantas! 

O horário “0” que vai atingir um grande número de professores significa: não haver trabalho para eles na escola.
O espalhar do sistema dos “agrupamentos”, juntando assim vários estabelecimentos, com “espíritos” tão diferentes, do infantil ao secundário...

outra versão do filme "Cuore"

Tudo isto implica a formação  de turmas de muitos alunos, para preencher bem os horários  já que o mínimo por turma são 24 alunos, mas o máximo por turma não explicam qual é...

 Para uma profissão que não deve ser vista como tendo “horas marcadas”!  
Porque o trabalho de cada professor é “também” as leituras para se actualizar, a correcção de trabalhos e fichas e coisas várias para além dos testes e dos exames – trabalho extenuante.

É a “feitura” das pautas e a arquivação de cada “função” realizada,  no computador, são as novas tecnologias usadas para dar as aulas mas também para a organização de trabalhos, de motivações...

Tudo isto, com as novas “decisões”, significa “deitar abaixo” uma série de postos.  Significa mais desemprego mesmo nos funcionários públicos porque quando uma escola fecha são todos que perdem, a começar pelos alunos (em primeiro lugar, porque estariam bem melhor em turmas mais pequenas).

crianças ciganas, estudando (blog cozinha dos vurdóns)

Porque o próprio “pagamento” da avaliação do professor por outro professor, o pagamento “à peça” (coisa horrível!) tem por detrás uma vez mais a perversa ideia de “dividir”! E é contrária à dignidade e deontologia .

Estas medidas  têm “fracturado” por dentro a solidariedade do professor com o outro professor. Ergueram-se entre eles “barreiras”, incompreensões e concorrências desnecessárias.


Tudo começou antes, eu sei, mas este governo tem o defeito de nem sequer ter feito nada de bom, apenas “acentuou” o mal que já existia e o mal estar enorme desta profissão que tudo “dá”, e se esgota – a profissão que mais percentagem de depressões e esgotamentos e suicídios apresenta...


Por isto tudo, eu hoje estou com os professores que protestam! 


(1) O inesquecível filme "Cuore", série televisiva de Luigi Comencini, tirado do livro de Edmondo de Amicis, com a bela Giuliana De Sio.


(O livro já foi levado ao cinema três vezes!)







17 comentários:

  1. excelente

    ... e não será o último grito

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não! Há sempre uma voz ao nosso lado que não nos deixa calar...

      Eliminar
  2. Excelente!
    É tão bom chegar aqui e ver que há gritos que se espalham. :)
    Beijinho!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O melhor é ouvir o "eco" da voz dos outros... Obrigada, Ana.

      Eliminar
  3. Neste momento e como as leis estão, podemos dizer que ninguém tem o lugar seguro. Esta insegurança é o pior de tudo.

    Um beijinho grande e obrigada pelo excelente post.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É verdade, Isabel! Esta insegurança, a instabilidade que se espalhou é o pior!
      Resta-nos gritar a ver se alguém ouve!
      Beijinhos e bom "finde" (como diz a Maria)...

      Eliminar
  4. Ensinar é tudo... é transmitir, é dar, é entregar, é gostar, é amar...

    O problema é não haver, muitas vezes, condições, modos ou maneiras...

    O ensino devia ser mais amparado e acarinhado! Afinal, estamos a ensinar e a educar as pessoas para o amanhã!

    Gostei muito!

    Beijos e boas férias

    Raul

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É quase uma atitude suicida... O futuro é agora, claro. Mas haverá futuro? Bjs e boas férias!

      Eliminar
  5. Ensinar é dar aos outros os nossos conhecimentos, eu sempre que aprendo algo quero que os meus filhos também o saibam. Ensinar é um gesto altruista, (não tem nada que ver com gostar de luzir cultura para impressionar, que é outra história). Os tempos de repente tornaram-se muito difíceis para todo, e quem sabe se isto não é só o princípio de outra era escurantista como a Idade Média. Todos estamos obrigados a reagir, que "eles" não pensem que lhes vai ser fácil mudar o mundo aos seus interesses. Temos que dizer NÃO todos unidos, a ver se serve para alguma coisa.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Claro que não os vamos deixar levar-nos à obscuridade! Só sobre o nosso cadáver!
      Enfim, acontece tanta coisa por aí, que às vezes desanimo...
      Vale a pena?
      Depois "sinto" um eco, tantos "corações" a dizerem o mesmo... Temos que continuar! TODOS JUNTOS!
      Parabéns aí aos "nuestros hermanos" que lutam e se portam como leões!
      beijos

      Eliminar
  6. Nos últimos anos tem-se assistido a uma tremenda falta de respeito pela classe docente.
    Aqui junto e deixo o meu grito de protesto.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigada, Cláudia! Sei que conto sempre com a sua voz pela justiça!~
      beijinhos e bom week end!

      Eliminar
  7. A defesa da escola pública é um dever de todos nós!
    Os ataques à escola pública têm a mesma origem que os ataques ao Serviço Nacional de Saúde, à Cultura, à Ciência...

    ResponderEliminar
  8. E sem a luz do conhecimento, o que levaria luz ao seres?
    O mundo se apagaria.

    bjs nossos

    ResponderEliminar
  9. Quero agradecer-lhe do fundo do coração o que vai escrevendo sobre os professores (e nem interessa o nível de ensino). São poucas as pessoas que compreendem o que os professores hoje em dia fazem. Nem nós seríamos capazes de descrever o nosso trabalho na íntegra…Há tanto, mas tanto trabalho invisível...
    L.S.

    ResponderEliminar