Apesar de ter feito uma redução, penso que terão de ser as
duas mãos bem cheias para férias.
Livros, outra vez? Sim, porque acredito que nos livros
encontraremos muito do que um dia seremos – juntamente com o que vivermos,
olharmos e ouvirmos! Mas tudo começa com a leitura.
Desde que dei conta que existia, vejo livros. Na casa onde
passei infância e adolescência havia uma longa estante no corredor e sei que
era um espaço que me atraía.
livros, imagem da internet de Rossella Fumasoni
Lembro-me de estar sentada no chão, a espreitar os
livros, a tirá-los dali, a folheá-los, a cheirá-los - porque gostava do cheiro dos livros velhos- e a ver as imagens - se as tinham. Voltava a
guardá-los, arrumadinhos, depois de escolher um.
Havia ainda os livros novos que me ofereciam, com as páginas
fechadas. E era o encanto e a impaciência misturados, a abri-los com a faca da fruta.
Um dia deram-me uma faca "corta-papéis", do feitio de
uma espada, que tinha também a função de "marcar" as folhas.
Era um cerimonial, até encontrar o "refúgio" onde decidia
instalar-me.
o ratinho Poeta olhanndo para Pushkin, ao pé da "Guerra e Paz" de Tolstoi...
E outros escritores que a Inquérito publicava: “Contos
Húngaros”, “Contos Romenos” - que traziam um pouco de novidade, sempre. Outros
mundos, outras gentes.
E chegaram os americanos: Steinbeck e “O Potro Vermelho”,
Somerset Maugham e as “Histórias do Mares do Sul”, ou “Férias de Natal”, Hemingway
e “As neves do Kilimanjaro”...
A primeira leitura de Agatha Christie foi ali...
Continuei a ler e a viver num mundo de livros, quando me casei.
Renoir, "primeira saída"
Picasso
A minha cópia de Picasso...
Bem, mas hoje quero falar dos livros para férias! Ou para os
que voltaram de férias e têm os fins de semana, ou um pouco da noite, para
ler...
Recordo um livro cuja descoberta me entusiasmou: a “Correspondência”
de George Sand e Flaubert.
Livro magnífico com as cartas de dois seres fora do vulgar, maravilha de humanidade e sensibilidade, de atenção e amizade, de protecção e de ternura!
Procurem-no, vale a pena! Seria mesmo um dos primeiros livros que aconselho, porque faz bem à alma de quem o lê...
Livro magnífico com as cartas de dois seres fora do vulgar, maravilha de humanidade e sensibilidade, de atenção e amizade, de protecção e de ternura!
Procurem-no, vale a pena! Seria mesmo um dos primeiros livros que aconselho, porque faz bem à alma de quem o lê...
A dada altura, diz Georges Sand: “Meu
amigo, o que te posso desejar para o novo ano? Desejo-te tudo! E depois, o resto!”
Assim, leiam "tudo" o que puderem... E depois virá o "resto"!
Começo pelos que leio agora. Ou releio...
“O Bem e o Mal”, de Camilo, por exemplo, num velho exemplar
que o meu pai me ofereceu, numas férias, tinha eu 12 anos.
Hoje releio-o com outro cuidado, mas o encantamento permanece.
“Como
consegue prender uma história de há séculos?”
Dei uma olhadela a um livro de Eça, aliás “apenas” tradução
de Haggarth que no fundo ele “reescreveu” segundo dizem e que não se esquece:
As minas de Salomão”!
Há passagens que -sei lá porquê- me recordam as descrições de “Paraíso Perdido”, de Milton: o Shangrila, o “sítio
perdido”, que desaparece depois da miragem e não mais se encontra.
E imagino os Jogos Olímpicos, com o olhar “crítico” e o humor que o autor tem. E farto-me de rir.
Outro livro bom: “Poesias”, de Emily Dickinson, que leio numa edição
bilingue italiana e é tão bela em inglês como no italiano...
E volto a aconselhar Steinbeck, Steinbeck, Steinbeck: para os
que começam agora, para os que já o leram, para todos.
“Milagre de São Francisco” (o
inesquecível Tortilla Flat!), ou “O Inverno do nosso descontentamento", “A um
deus desconhecido”: são verdadeiras (re)descobertas!
Bernardo Marques, pormenor da capa de "A Lua e seis vinténs"
Dirão: e nada de mais moderno?
A verdade é que pouco tenho encontrado "de interessante" nos “modernos”. E
tenho procurado em vários países, é um momento pouco interessante que parece “repetir”
o que já foi dito, mas numa visão vulgar de déjà vu. Ou sem “déjà vu”, o que
ainda é pior.
Talvez a falha seja minha, que não consigo ver lá nada...
De facto, “Printemps et autres saisons” ou “La Ronde et autres
faits-divers”, "Désert" são histórias que falam de “outras” pessoas, de "outros" mundos,
que fazem parte da mesma humanidade...
A Dom Quixote publicou "Deserto".
A Dom Quixote publicou "Deserto".
E mais?
Flannery O'Connor
- o “calor humano” e a ternura do olhar de Carson McCullers e do seu “O Coração é um caçador solitário” (Editorial Presença);
- a tristeza da sua “A Balada do Café Triste” (Relógio d’Água);
- ou Truman Capote e “Harpa de Ervas”.
Ou, recentemente, Joyce Carol Oates e o romance “Nós éramos os Mulvaney”. Encontrei na internet outros livros dela traduzidos, mas este não.
Existe “Rapariga
negra, rapariga branca”, na Sextante Editores, e “A fé de um escritor”, na Casa
das Letras.
Para os que estão interessados, saiu há pouco o seu último romance “Memórias de uma Viúva”, livro
autobiográfico, que foi já traduzido em Espanha. Por cá, penso que ainda não.
São todos eles livros que nos “reconciliam”
com a humanidade dos homens (passe a redundância) e com a riqueza dos
sentimentos.
Outros livros que me atraem - e leio a toda a hora- são os policiais! Estes contos de Raymond Chandler são uma preciosidade. Muitos deles foram depois "desenvolvidos" em romances.
Patricia Cornwell
Li há pouco um livro terrível de Joyce Carol Oates com o pseudónimo “policial” de Rosamund Smith.
E o incontornável Simenon, que me acompanha há tantos anos e com quem aprendi o meu "francês" coloquial! Desta vez não um livro policial com Maigret,
mas um livro “negro” (ele próprio lhes chamava os seus livros negros) “Ceux de
la soif”- o isolamento de uns numa ilha – as Galápagos- e as explosões de
violência interior, nesse mesmo universo quase concentracionário...
Para deixar uma nota alegre, guardo um livro de Hugo Pratt,
comprado na Livraria Lumière: “A balada do mar salgado”!
(*) A editora Cavalo de Ferro publicou vários livros de
Flannery O’ Connor:
Sobre Carson Mc Cullers:
Sobre Le Clézio:
Sobre Joyce Carol Oates:
Sobre Truman Capote, onde se fala da nova tradução (2012), com o acordo ortográfico... que não vou comprar.
Ler é uma forma de gozar enriquecendo-nos por dentro.
ResponderEliminarPor muito que a gente leia, é sempre mais o que fica por ler, por isso perder o tempo com um livro que não nos aporte nada é uma perca de tempo irrecuperável. (Tu disso sabes mais do que eu, que para isso leste muito mais).
Beijinhos grandes
Que post tao inspirador, MJ! Temos alguns gostos em comum, e também partilho do seu gosto pelos policiais, leitura que associo muito ao período de férias! Há algumas semanas, comprei o último das aventuras do Poirot, "The Curtain", para ler nas férias.
ResponderEliminarBeijinhos e Boas Férias! :-)
Adorei este post.
ResponderEliminarAdorei as fotos das estantes. Que inveja...
Adorei a sua versão do menino com a pomba de Picasso. Tão bonita.
Tenho alguns livros dos que refere e já ficaram aqui apontados outros tantos para comprar. Ando há imenso tempo atrás do "Coração Solitário Caçador" e nunca consegui encontrá-lo e agora vejo com alegria que há uma edição da Presença, que julgo que deve ser nova. Andei a ver na Wook e não encontrei.
É como diz a Maria, "...é sempre mais o que fica para ler." Que aborrecimento!
Um beijinho grande e obrigada por tão lindo post
Acho que vou outra vez de férias, depois destas magníficas sugestões literárias!!... E, as tentações são tantas, tantas...
ResponderEliminarSe viessem acompanhados pelo tempo para lê-los, como já referiu a Isabel!
Beijinhos e parabéns por mais este belo post!
Uma bela viagem
ResponderEliminarQuerida MJ,
ResponderEliminarAdorei esta postagem que interliga os livros com a arte.
Gostei destas escolhas. Algumas minhas conhecidas. Achei graça à escolha do "Fio da Navalha", já o li há uns anos, não sei se está na hora de o reler.
Fiquei como nome de Edna pois nunca li nada dela e a correspondência de Georges Sand com Flaubert porque também ainda não li. Há outras escolhas que aqui apresenta que são interessantes mas estes foram os que mais fixei.
Ai as estantes!!!, cá em casa também há esse problema... Embora agora estejam um pouco melhor.
Beijinhos e obrigada pelas duas mãos cheias de livros. :)))
As fotos estão lindas.