domingo, 7 de dezembro de 2014

"O Sol é grande…"soneto de Sá de Miranda que foi amigo dos humanistas italianos...



O Sol é grande...



"O Sol é grande, caem co’ a calma as aves
Do tempo em tal sazão, que soi ser fria.
Esta água que d’alto cai acordar-me-ia?
Do sono não, mas de cuidados graves


Ó cousas todas vãs, todas mudaves!
Qual é tal coração qu’em vós confia?
Passam os tempos, vai dia trás dia,
Incertos muito mais que ao vento as naves.

Eu vira já aqui sombras, vira flores,
Vi tantas águas, vi tanta verdura,
As aves todas cantavam d’amores.

Tudo é seco e mudo, e de mestura,
Também mudando –m’eu fiz d’outras cores,

E tudo o mais renova isto é sem cura."

Francisco de Sá de Miranda nasceu em Coimbra, possivelmente em 28 de Agosto de 1481, mas com certeza na década de 1480-1490, filho de Gonçalo Mendes de Sá, cónego da Sé Catedral e de Inês de Melo, solteira, de família nobre. O pai perfilhou-o e legitimou-o mais tarde.” 

Assim escreve o Professor José Pina Martins (que foi meu professor de Língua e Literatura Italiana, na Faculdade de Letras de Lisboa,)na Introdução ao volume “Sá de Miranda –Poesias Escolhidas”, Editorial Verbo, Textos Clássicos. É considerado um dos maiores poetas do século XVI - o século de ouro da poesia portuguesa.
Sabe-se que esteve dois anos em Itália e que de lá trouxe a “medida nova” (1) : o “dolce stil nuovo”.

Como o grande poeta do 'Canzoniere' (Petrarca], que tanto havia de influenciá-lo, Sá de Miranda abandona o estudo das Leis e dedica-se  ao cultivo das Letras
 Francesco Petrarca, nascido em Arezzo, 20 de julho de 1304, foi, com Dante, uma das figuras-chave do Renascimento italiano, nas "letras". Foi o introdutor do "soneto". Como Sá de Miranda começou a estudar Leis, por vontade do pai, mas depois escolheu a Literatura Latina.


(…) É provável que enquanto frequentava o curso dos Estudos Gerais, tenha frequentado a corte – talvez datem daí os laços de amizade que o ligaram a Bernardim Ribeiro. São deste período (1510-1515) as primeiras composições em medida velha.”

Bernardim Ribeiro é, com Sá de Miranda, um dos introdutores do Renascimento nas Letras, em Portugal. Ambos estiveram em Itália, frequentando a "corte" literária de Vittoria Colonna, em Roma.
Dante, num fresco de Luca Signorelli

Vittoria, Marquesa de Pescara, estava ligada ao surgimento do "humanismo" e ao "renascimento" iniciados por Dante Alighieri (a quem se deve a expressão "dolce stil nuovo, que aparece na 'Divina Comédia').


Vittoria Colonna, por Michelangelo, com dedicatória

Francesco Petrarca

Petrarca, pintado por Simone Martini

Qual a razão da sua viagem a Itália nos anos 1521-1526?, pergunta Pina Martins:  
Petrarca

“Apenas uma, julgamos: visitar o país cultural e  artisticamente mais prestigioso daquele tempo, onde as letras  tinhas sido restauradas no século XV e onde, naquele momento artistas de talento incomparável (…).

"Eu vi Roma, Veneza, e vi Milão,
Em tempo de Espanhóis e de Franceses.”

E pergunta-se: "(…) terá contactado de verdade a humanista Vittoria Colonna e os letrados do Renascimento de então?”



Vittoria Colonna, por Sebastiano del Piombo (1520)

Como resposta, esta parece-lhe suficiente:
"(…) Baste-nos saber que, da sua viagem ao país mais culto da Europa, lhe ficou o amor daqueles textos poéticos, filosóficos e literários que mais tarde haviam de constituir o encanto dos serões literários do Minho.”

Sá de Miranda morreu no Minho, em 1558, numa quinta à qual se recolheu para se afastar da vida da corte.

Como defende Pina Martins (seguindo Costa Pimpão) a simples razão foi que “preferiu a possibilidade de seguir o seu gosto pessoal, as tendências do seu carácter. O amor da independência – ser livre para poder cumprir-se como homem e como artista."

De si dizia o poeta:


“Homem d’um só parecer,
D’um só rosto e d’uma fé,
D’antes quebrar que volver,
Outra cousa pode ser,
Mas de Corte homem não é.”



(1) Medida nova e  medida velha:  Tendo vivido cinco anos em Itália, Sá de Miranda foi o principal introdutor em Portugal das novas formas poéticas do Renascimento, a que se convencionou chamar “medida nova” : uma medida poética mais exigente, introduzindo o decassílabo, que se conjuga com uma maior complexidade dos conteúdos, em contraste com as formas poéticas tradicionais da Península Ibérica (que a partir de então se passaram a designar "medida velha". (wikipedia)

(2) Francesco Petrarca (Arezzo, 20 de julho de 1304 - Arquà, 19 de Julho de 1374). Foi um intelectual, poeta e humanista italiano. Autor do Canzionere. 
Liszt vai pôr em música Três Sonetos de Petrarca.

Anna Petrovna:
 Horowitz:

(3) Vittoria Colonna, nascida em Marino, em Abril de 1490, morre em Roma, a 25 de Fevereiro de 1547. Era Marquesa de Pescara, e foi uma poetisa e humanista italiana, amiga de Michelangelo que a retratou.


Vittoria Colonna


 (4)  Dante Alighieri nasce em Florença, em 25 de Maio de 1265 e morre em Ravena, 13 ou 14 de Setembro de 1321.

 Dante Alighieri, por Sandro Boticelli

1 comentário:

  1. Gostei muito de ler todo o post.
    Os seus post são sempre ricos em belas pinturas.

    Um beijinho grande e obrigada por me ter dado a oportunidade de aprender um pouco mais.

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