segunda-feira, 22 de março de 2010

Uma andorinha no Inverno




“Uma andorinha no Inverno”

O nevoeiro começara a subir pela a serra de Marvão, para lá dos telhados vermelhos das casinhas brancas, e o vento cortante parecia entrar nos ossos.


A pequena vila parecia adormecida no fim da tarde de Inverno.
Passaram duas mulheres, iam falando do frio e, de repente, uma apontou para o céu:
- Já chegaram, viste?

Olhei também. Eram as andorinhas que voavam num pequeno bando de quatro ou cinco. Vira-as nessa amanhã, ao acordar.
A outra respondeu, olhando para cima:
- Já vi. Enganaram-se, coitadas... Parecia que vinha aí o calor.

-Julgaram que tinha chegado a Primavera, coitadas. Não vão durar, comentou a primeira.

E continuou:

- Começaram a fazer o ninho ontem no beiral da minha casa, mas não agarrou, caiu, e hoje estavam lá de roda outra vez...
- Pois é...,

E abanou a cabeça, erguendo-a, a indicar o céu escuro.
De facto, enquanto o nevoeiro subia lá de baixo, o céu de um azul esbranquiçado ainda há pouco escurecia a olhos vistos.
A noite caía.
As andorinhas apressavam os voos. Se calhar pensavam o mesmo que nós e, assustadas, agitavam-se como voando às cegas.


A primeira mulher disse, com tristeza:
-Pois é, andam a acabar os ninhos. Mas não vão durar..., repetiu.


A manhã seguinte veio cinzenta de chumbo e o nevoeiro estendia-se já pela vila toda, de uma ponta à outra. Emergiam as ameias do castelo, as guaritas, a torre maior e o velho castanheiro secular.


Nas ruas andávamos como que envolvidos num novelo de lã branca, dava vontade de estender as mãos para afastar os fios.

À noite, os lampiões alumiavam fracamente numa luz amarela leitosa. O nevoeiro em rolos cada vez maiores deslocava-se de lado a lado, deixando por breves momentos luzir uma estrelinha lá no alto, que logo era engolida pela névoa.

O que ia ser das andorinhas e dos ninhos?
Na manhã seguinte, o mau tempo continuou. Olhei os céus à procura delas e não as vi em lado nenhum. Tinham desaparecido...

Hoje, longe da Serra de Marvão, perto do mar, a Primavera chegou.

Mas aqui olho para os céus e não vejo as andorinhas...

3 comentários:

  1. Belo texto.
    Espero que,para além de matar as andorinhas,não estejamos também a matar a Primavera.

    Saudações cordiais,
    mário

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  2. O seu bonito texto faz-me recordar duas poesias espanholas,uma de Rafael Alberti,"Se eqivocó la paloma",e a outra de Adolfo Becquer,"Volverán las oscuras golondrinas".Porque o seu bonito texto fala de buscas e de nostalgias.O seu bonito texto.M.

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  3. Obrigada, Amiga Maria do Mar pelas suas palavras que me deram viva alegria.
    A andorinha é um passarinho que conheço tão bem. Desde miúda iam todos os anos fazer o ninho na casa dos meus pais, a casa amarela de que falo. Uma vez entrarou uma pela janela e "vi-a" de perto e "amei-a" para sempre! Comovo-me sempre ao vê-las chegar... Mas aqui não as vejo nunca...

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