Quando vivia em São Tomé, íamos muitas vezes a São João dos Angolares que ficava ao Sul da ilha.
Era um belo passeio, muito agradável sobretudo na Gravana, quando o tempo refrescava um pouco e as chuvas paravam.
Durava três curtos meses, nas minhas contas, às vezes chegávamos aos quatro...
barcos e redes na praia MelãoO vento varria as praias, os coqueiros mostravam os troncos descascados, os canaviais secavam. Os caroceiros tinham então enormes folhas vermelhas, douradas e por vezes roxas e à beira-mar na vegetação havia um tom amarelado, que era bonito.
praias em direcção a Sul, durante a Gravana
A luz também era outra, no meu jardim: mais dourada, mais nítida, sem a brumazinha dos dias de chuva.
Era a altura em que o paludismo acalmava porque os mosquitos não tendo águas paradas para se esconder e reproduzir, morriam.
Mas era também a altura em que os são tomenses adoeciam com tosse, se constipavam, tinham frio e se sentiam desconfortáveis, fracos e sem forças.
o meu quintal e a luz dourada da Gravana
Quantas vezes tive de dar xarope ao senhor Semedo, ou à Dáy e pôr gotas nos ouvidos ao Nini!
No entanto, para nós, europeus, a Gravana era um bem de Deus!
- A Gravana são três meses e pouco, dôtôra.
- A dôtôra conta os meses que não têm “r” e, assim, é mais fácil. Temos Maio, Junho, Julho e Agosto!
Ali tudo era aproximativo. Havia a hora “calculada” (a olho...) e a “hora de relógio”, aquela que se respeitava.
Essas idas a Angolares eram divertidas, a paisagem era linda e aguentava-se bem porque a estrada era razoável.
Era fácil “furar” uma ou mesmo duas vezes, nos caminhos escalavrados, mal aplainados, sem alcatrão, entre os pedregulhos e buracos que apareciam a seguir a uma curva quantas vezes!
Era aconselhável levar pelo menos dois - se não três- pneus sobresselentes. São Tomé é uma ilha vulcânica e as estradas eram muitas vezes de pedras negras e aceradas.
Ou então eram ravinas onde a erosão das chuvadas frequentes fazia o seu trabalho de destruição. Entre pedras aguçadas e buracos um a seguir aos outros, era uma espécie de slalom constante.
O senhor Fernandinho era uma pessoa amável e generosa. Tinha ficado depois da independência porque o novo governo o apreciava e até lhe dera a roça onde tinha as suas culturas, o seu óleo de palma, a sua fruta, banana-pão e fruta-pão à vontade, para cozer ou grelhar ou fritar acompanhando o peixe grelhado que naquelas águas havia com fartura.
Servia-nos quase sempre um calulu, prato indefinível, com cheiro e gosto fora de tudo o que se comeu na vida!
Em nossa casa a Milly fazia frequentemente calulu, um calulu especial, bem melhor do que o do senhor Fernandinho ou de qualquer restaurante da ilha – dos poucos que lá havia.
Era dali que o Nézò - que além de pintor era pescador- nos levava a casa peixes fresquíssimos, que eram logo escamados, cortados pelo senhor Semedo e arrumados na arca que lá tinha, pela Milly e pela Nina.
Numa dessas idas a Angolares, acompanhou-nos uma senhora que tinha vindo de Lisboa.
Era uma senhora forte, um pouco tímida, mas que falava muito e seguia, curiosa, toda a viagem, querendo saber tudo.
Era uma senhora forte, um pouco tímida, mas que falava muito e seguia, curiosa, toda a viagem, querendo saber tudo.
em cima: eu, à janela do senhor Fernandinho e em baixo com o Sr. Semedo e a filha dele
Da janela da casa do senhor Fernandinho via-se a bela Praia das Sete Ondas, com os coqueiros delicados e esguios, o mar, a miudagem a brincar à roda do jeep.
- Ó senhor Fernandinho, como se chamam aquelas montanhas?
O senhor Fernandinho olhou, baixou os olhos, com um ar atarefado, a mexer na geleira, e murmurou qualquer coisa.
- Ó senhor Fernandinho, diga-me lá o nome das montanhas. Têm um nome, não têm? Todas têm...
Desta vez o senhor Fernandinho disse bem alto, um pouco impaciente e talvez envergonhado, perante a insistência da senhora:
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dois blogs com belas fotos de São Tomé:
http://www.travel-images.com/sao-tome-principe8.html
http://nalinhadoequador.blogspot.com/2006/05/seleco-de-fotografias.html
Começo hoje uma perquisa sobre esses pratos, arroz de substância é o máximo. Bom ler essa história, muito bom ver as fotos. Povo bonito, simples e que ainda sofre muito com o impaludismo, o mosquito, ledum palustre. Lindo.
ResponderEliminarbjs 5
Recordações que nos enchem o espírito.
ResponderEliminarUm abraço!!
Estive em São Tomé, adorei. Penso que poderia ser Feliz ali, para Sempre!
ResponderEliminarGosto de Si e do seu blog.
Completo!
E gostava de conseguir acreditar em utopias...
Bem haja, voltarei
https://www.youtube.com/watch?v=EvDxSW8mzvU