O ratinho poeta, desde que voltámos a casa, parece-me inquieto. Mais calado, pouco expansivo.
Vejo-o absorto de manhãzinha, à janela, ou a olhar para mim, na mesinha de cabeceira, à noite.
- Nada... Estou a pensar na vida, respondeu-me ontem, muito sério.
Hoje, ao entrar no quarto, estava ele de patinhas para o ar em cima da minha almofada indiana. - Ó, ratinho, o que estás a fazer? Podes partir o pescoço!
- Não interessa, agora já estou melhor...
- A fazer yoga.
- Qual menina?
- Não te lembras?
- Não..., disse ele.
- É que eu também gosto de ti...
eu e oZac, na minha varanda de Telavive...
Vejo-o absorto de manhãzinha, à janela, ou a olhar para mim, na mesinha de cabeceira, à noite.
- O que tens, ratinho?
- Nada... Estou a pensar na vida, respondeu-me ontem, muito sério.
E não adiantou mais conversa.
Hoje, ao entrar no quarto, estava ele de patinhas para o ar em cima da minha almofada indiana. - Ó, ratinho, o que estás a fazer? Podes partir o pescoço!
Não respondeu. Mas virou-se e pôs-se de barriga para o ar, a respirar profundamente, ritmicamente, inspirar, expirar...
Sem dar por isso, comecei a contar baixinho para mim: um, dois, um, dois...
De repente, ainda deitado, falou:
- Tenho andado nervoso. Enfim, sinto-me um bocado “desorganizado”...
O ratinho “desorganizado”?!
Lembrei-me logo do Eça e daquela personagem amorosa que era o Craft, o inglês de "Os Maias", a queixar-se daqueles dois "fantásticos", como ele dizia!
- “Desorganizam-me, preciso de ar”, queixava-se ele a Carlos da Maia, a dada altura.
“Eles”, os fantásticos (segundo Craft), eram os portuguesinhos Alencar e Ega...
E imagino-os, antes de irem "por esse Aterro fora", a discutirem encalorados, aos berros e insultando-se - quase chegando “a vias de facto” - e, uns metros mais adiante, abraçados, de lágrima ao canto do olho e lenço na mão, numas pazes à romance russo!
O Craft a olhar e a ouvir, coitado, completamente “desgovernado”...
- Mas desorganizado por quê, ratinho?
- Não interessa, agora já estou melhor...
Estava preocupada.
- O que estavas a fazer ali de cabeça para baixo?, voltei a perguntar.
- A fazer yoga.
E acrescentou:
- É assim que fazem em Mysore.
- Em Mysore?
O que saberá o ratinho de Mysore?
- Então não sabes? É onde vai aquela menina de quem estavas a falar com as tuas amigas...
- Qual menina?
- Não te lembras?
Sim, lembrava-me de uma conversa com umas amigas que me visitaram há dias, mas nunca pensei que o ratinho estivesse ali ao lado, a ouvir...
Este ratinho!...
- Pois é, Mysore. Na Índia.
Este ratinho!...
- Pois é, Mysore. Na Índia.
Deu uma gargalhadinha, coisa que nunca lhe ouvira.
- Naquela terra onde as vacas andam no meio dos automóveis e das motoretas...
Encostado a uma almofada mais pequena, os olhos dele riam. Tive que me rir também.
Mysore... Um dia tenho de ir a Mysore! "E levo o ratinho", pensei ...
As vacas sagradas a atravessar as estradas e os carros a travar bruscamente., As motoretas girando sem controle, às curvas. As buzinas, os ruídos, os cheiros de comida que imaginara, as cores fortes: os laranjas os roxos, os amarelos dourados e os azuis ou verde-esmeralda que vira nas fotografias que “aquela menina” me tinha mandado.
Já estava a imaginar o ratinho com a sua mantinha de yoga a passear-se por Mysore, de motoreta!Continuou:
- E contaste que havia macacos também. No meio da cidade, e a comerem tudo o que encontravam, não te lembras?
O ratinho gosta imenso destas perguntas: não sabes? não te lembras?
Olhou para mim e acrescentou:
- Tu é que gostas de macacos... Tens para ali tanta fotografia.
Será que o ratinho tem ciúmes dos chimpanzés, gorilas e dos sorrisos deles colados nos vidros da janela do meu “studio”?
- Pois gosto.
Ele ficou calado, ao meu lado. Perguntei-lhe:
- Não sabes uma coisa?
- Não..., disse ele.
- É que eu também gosto de ti...
Desta vez, respirou fundo. Vi que tinha ficado contente.
Que bom é este meu amigo silencioso e atento!
Faz-me lembrar o meu amado cão Zac, a quem eu chamava “ hamud sheli” e que morreu em Telavive...
Ratinho atento...
ResponderEliminarE além de poeta é um pensador
...e moderno!
Onde é que já se viu um ratinho a fazer yoga?
Como eu gosto deste ratinho!
Um beijinho
Isabel
Excelente e civilizado diálogo
ResponderEliminarAinda há ratos inteligentes
e donos com afectos
Este ratinho poeta está cada vez mais fixe, ehehehe
ResponderEliminarUma grande companhia.
O Manuel também, o Manuel também.
Carlota Pires Dacosta
Um ratinho inteligente.
ResponderEliminarVamos todos fazer yoga a ver se não caimos da corda bamba.
Cordial abraço,
mário
O ratinho, como diz Mar Arável, é um ratinho de afectos. Contento-me por ele ter falado, pois, tinha saudades. A Índia é um local especial com uma beleza própria. Só estive em Goa, mas adorei.
ResponderEliminarPara o ratinho:
- Quando fores para a janela não fiques pensativamente preocupado. Vê o mar, o azul imenso e agradece cada dia. Está tudo bem, já estás em casa. Beijinho. :)
Beijinhos, MJ!
O ratinho desorganizado?! Hum...
ResponderEliminarAconselho-te a seguir o seu exemplo e fazer yoga também, é estupendo.
Que grande livro, Os Maias! Quem tivesse sempre um Ega à mão para dizer-nos depois de todas as tormentas "Falhámos a vida, menino!", e correr juntos atrás do próximo autocarro.
Feliz Domingo
Gosto muito destes posts com o ratinho poeta.
ResponderEliminarbeijinho
Gábi