terça-feira, 20 de novembro de 2012

Lembrando a viagem do Ratinho Poeta e do Ouricinho a Roma


Saímos numa manhã de sol. Antes, eles foram à cozinha ver como estava o tempo.
- Está sol! está lindo!, disse o Ratinho.
- Sim, sol!, gritou ainda mais alto o ouricinho.

E bateram  as palmas. De facto, o sol brilhou naqueles dias, em Roma, e era bom sair à rua.

O espanto do Ratinho quando se viu no meio da cidade aberta enterneceu-me. 

O Ouricinho é sempre mais “natural” nas suas reacções. A facilidade de estar na vida e de aceitá-la com o que vem de bom e de mau é admirável.

Enquanto o Ratinho pasmado olhava à  esquerda e à direita, o Ouricinho sorria, de olhos bem abertos, pronto a absorver tudo, no seu ar feliz e tranquilo de todos os dias. Como se estar em Roma fosse a coisa mais natural do mundo.


O Ratinho mostrava a sua surpresa. Admirava o colorido diferente, a luz suave, cor de âmbar, que batia nas ruas e nas fachadas das casas. Apontava para cima e murmurava:
- Já viste tão lindo? O céu tão azul?...


O Ouricinho Dan sorria e saltitava pela Via del Governo Vecchio abaixo, espreitando em cada porta aberta, ou entrando pelas lojas e pelos cafés dentro.

- Olha aquela casa! E a loja do Pinóquio!

E continuava:
- Cheira tão bem este café! Lavazza! Era o que tomavas cá?


E passava a outra coisa, sem parar, porque gostava de tudo.

Ao final da rua apareceu a estátua do Pasquino. 

Eles já sabiam a história das “estátuas falantes”, e foi o Ouricinho quem disse:
- O jornalista! Este era o dos jornais de parede, não? Disseste que apareciam aqui as críticas todas...

- Ainda hoje aparecem, disse o Ratinho. Não vês ali?

E lá estava de facto um papel, uma queixa, colada numa tábua.
Corriam à minha frente e, de repente, pararam.


- Olha esta antiguidade!
Era o Ratinho que se admirava mais.
E, logo:
- E as  motas!
- Tanta motinha gira, acrescentou o Ouricinho.
- São Vespas, como no filme “Férias em Roma”, não é?

O Ratinho estava sempre mais informado sobre estas coisa culturais. Continuou, a explicar melhor ao amigo:

- Com a Audrey Hepburn... Gosto muito dela!

O Ouricinho não se deixou ficar atrás.

- Férias em Roma, tal como nós agora! Já viste a quantidade de coisas sobre o filme? Olha um avental com a Audrey! 

De facto no quiosque que vendia os jornais vários aventais pendurados com a Audrey e o Gregory estampados a várias cores.

- E tantos postais com ela! Isto é que é mediatização...
- Marketing! Hihihi..., riu-se o Ratinho que adorava estas saídas do amigo.
Ainda quis tirar uma fotografia aos aventais mas eles corriam tanto que lá fui atrás deles.


Tinham parado a ver uma Suzuki. Saltaram lá para cima e deitaram-se no selim,  a ver o céu.

- Bela vista!, gritou o Ouricinho, divertido. Ó Dan, guia tu a mota!

E ria-se às gargalhadas.
- Esqueci-me dos óculos escuros, lamentou-se o Ouricinho. Guia tu!

Continuámos a andar. E de repente, foi como um mergulho na luz e na beleza da Piazza Navona - o que os deixou literalmente sem fala.


- Estão a ver esta maravilha? É a Piazza Navona!, exclamei eu, excitada por lhes poder mostrar aquela praça de sonho.

De boca aberta, giravam a cabeça, olhavam em volta.

- Que fontes tão lindas! Podemos sentar-nos neste caixote, para ver melhor aquela ali no meio?, perguntou o Ratinho.


- Claro que podem. É a Fonte dos Quatro Rios, do Bernini.

Não me ouviram e ali ficaram, a virar-se para todos os lados, empoleirados no caixote.

- Era então assim a “tua” Roma...
O Ratinho Poeta falava, com um ar inspirado.
- Não era bem assim. Muita coisa se modificou nestes anos...
- Preferias como era dantes?
- Não sei...
Fiquei a pensar como era dantes.Vieram-me imagens à memória, pessoas, ruas cheias de mistério hoje sem ninguém. Os turistas invadiam as praças e felizmente deixavam alguns espaços livres.


- Se calhar não queres falar nisso, disse o Ratinho, filosoficamente. Custa-te sempre voltar, não é?


- Ó Ratinho, é tão complicado. Gosto de vir sempre, mas há tanta nostalgia, tanta recordação que me faz doer a alma...


O Ouricinho, curioso como sempre, olhava para a minha expressão.
- Por quê?, perguntou.



- Lembro-me de certas noites na Navona. Oh, muita gente se foi embora daqui.
- Morreram? 

O Ouricinho era mesmo curioso.
- Sim, alguns morreram...

O Ratinho pôs-me a patinha no braço, com ternura.

- Se quiseres, fala comigo, diz-me o que sentes. Se preferes, não digas nada, nós compreendemos. Não é, Dan?

- Claro! Não queremos que sofras a lembrar os amigos...

Não sofria. Tinha saudades deles e de mim.

- Esta praça é a tua preferida? É a mais importante para ti na tua memória?

O Ratinho queria mudar a conversa.
- Não sei, Ratinho. Há tantas praças em Roma de que gosto. Tens razão, esta é importante para mim. E tu o que achas?
- É linda... De uma beleza estonteante!

O Ouricinho, no seu discurso mais terra a terra , acrescentou:
- É divertida, tem tanta luz, tanta cor e tantos divertimentos!

Olhava de olho arregalado para o “fakir” (o que poderia chamar-lhe se não isto?) que num braço estendido, impávido, aguentava - como se não tivesse peso- o corpo de um homem, vestido de panos laranja, meditando, imóvel.

- Impressionante! Achas que é só a concentração?, perguntou o Ratinho.



Continuámos, atravessando o Corso Rinascimento, passando perto do Senado, em direcção à Piazza della Rotonda, também chamada Piazza del Panthéon, outra das minhas preferidas.

- Espantosa! Que arquitectura tão bela...

O grito de entusiasmo do Ratinho divertiu-me. Esqueci as tristezas. 
"Os amigos são para isso e há sempre amigos novos!", pensei.

- Amazing!, disse o Ouricinho, que tinha aprendido aquela palavra há uns tempos.
- Ó Dan, mais motas!!! Que loucos estes romanos! Bem dizia o Astérix...

Rimo-nos os três da graça do Ratinho. Entrámos no Panthéon.

- Aquilo é a lua ou é um buraco? 

O Ouricinho, de pescoço esticado, procurava ver através da lucarna do Panthéon, tão alta que nos parecia estar em pleno céu aberto.

- É uma abertura...
- E esta escultura tão bonita com uma pombinhas?, perguntou o amigo Poeta.


- É o túmulo de Rafael,  o pintor ...
- Do Renascimento!

Era o Ratinho, uma vez mais... Aquele Ratinho era uma enciclopédia!

Continuámos a andar, subimos a rua paralela ao Panthéon  e chegámos a Santa Maria Sopra Minerva.

- Ai, o elefantinho que engraçado!, disse o Ouricinho, encantado.

Outro deslumbramento para os dois.
-  Que lindo!
- É o elefante português..., expliquei.
- O quê??
- Português?

Tinham-se virado ao mesmo tempo para mim.

- Sim. A estátua representa o elefante que veio a Roma.
- Quando é que ele veio?, perguntou o Ratinho, desconfiado.
- Eu não percebo é como ele veio ate cá. Num avião não pode ser!

O Ouricinho parecia céptico quanto a essa vinda.
- Foi há muitos anos! Veio numa embaixada do Rei D. Manuel, ao Papa.
- Ah!, disse o Ratinho. Também veio uma pantera, não foi?
- Do Rei?! Ó, isso então foi há séculos...
Entrámos na Igreja.
- Não é bonita?
Para mim era maravilhosa. Mas o Ouricinho parecia desinteressar-se. O Ratinho olhava em volta silencioso. 
Pensei que estavam cansados de andar e andar. Animei-os com uma proposta:
- Vamos comer um gelado?!
O Ratinho, sempre bem educado, respondeu logo:
- Oh, sim. E depois vamos para casa?...
- Sim, Sim! Quero um gelado!...
Ainda quis contar mais coisas...

- O Café Tazza d'Oro... Que saudades!

Mas eles já nem me ouviam bem. Tinha sido um dia muito intenso!

7 comentários:

  1. Que maravilha!
    Continuam o mesmo espanto, estes bichinhos!
    E que Ratinho culto este Poeta!

    Cultura, alegria, ternura...é o que nos trazem estes dois bichinhos encantadores, que já fazem parte dos amigos.

    Nem sei como conseguiu acompanhá-los nesta corrida por Roma! Gelado bem merecido!

    Adoro!Adoro!Adoro, estas histórias!

    Um beijinho grande...bem, um não...três, um para o ouricinho e outro para o Poeta!

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  2. Se puder para o ano volto lá, só estive uma vez, há mil anos e sem olhos de ver.
    Imagino que te tivesse ao meu lado ( ouricinha? ratinha? as duas coisas ou nenhuma?) e que me contasses a "tua" Roma.
    Feliz dia, beijinhos

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    1. Vem comigo, eu conto-te... Sou Ratinho, ouricinho e tudo ao mesmo tempo... E ninguém.
      Beijinhos

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  3. Um dia intenso mas repleto de beleza, de cultura, de recordações, de amizade,... de saudade!
    Que maravilha!!
    Roma vista pelos olhitos destes dois nossos amigos, tem outro encanto!
    E, a MJ é... GENIAL!!
    Uma excelente contadora de histórias; neste caso bem reais.
    Um beijinho grande.

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  4. Gostei muito, muito deste passeio. Obrigada :)
    um beijinho
    Gábi

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