sábado, 3 de novembro de 2012

Roma: encontro mágico no Campo de' Fiori... Há mais mundos?


Coisas de bruxas, no Campo de' Fiori?

Em Roma nada me espanta que aconteça, devo dizer. Seja hoje ou ontem pareceu-me que tudo era possível ali.

Coisas de bruxas? E chi lo sà?
Esta história passou-se há dias, em Roma.
Piazza Santa Maria Sopra Minerva e o elefantezinho português

Estava sentada no Campo de’ Fiori, no interior da Vinerìa Reggio – que antes simplesmente se chamava “Vinerìa” e, para nós, era o Bar da Roberta. Roberta e Giorgio Reggio, daí o nome da "vinerìa" hoje.

Campo de' Fiori, no Outono

Modificada, modernizada, diria mesmo “mundializada”? Sim, um pouco. Mas o ambiente por vezes volta  a ser o de há 30 anos. 

Confesso que não ia muito ali, porque preferia andar de um lado para o outro e preferia um cappuccino no Caffè Sant’Eustacchio, ou um espresso  e uma “bomba” (a nossa clássica “bola de Berlim”!), no café Bar d' Angelo na  Via della Croce onde ia muito com a minha filha!
Seria aqui? (foto da internet)

"L'angelo", fotografia de Tim_mimo (internet)



o Caffè Sant'Eustacchio hoje, cheio de pacotinhos de bom café...

o Caffè Camilloni, ali ao lado, a caminho do Panthéon...


Paredes cobertas de garrafas de bebidas variadíssimas, dos “bianchi” todos, “pròsecco”, Marsalas, Portos variadíssimos (que sempre tiveram) e uma grande garrafa de “Absynthe” verde – que me fartei de ver por Roma: estava de moda o absinto este Outono...

Alguns bancos corridos e pequenas mesas de madeira encostadas à paredes-garrafeiras. Lá fora, o fradinho Giordano Bruno pensava talvez no futuro que o esperava. Uma pomba pousara-lhe na cabeça.


Olhava em frente e contemplava a fileira de bebidas por detrás do comprido balcão de madeira, onde os filhos da Roberta atendiam os clientes.

Havia gente que entrava e saía. Luzes, música e, lá dentro, o barulho da televisão: era "la partita"  e o Napoli jogava com o Inter, salvo erro. Alguém na vineria fazia “il tifo” pelo Napoli, percebi depressa.

Entrou uma pessoa mais. Ergui os olhos, era uma mulher jovem e alourada. Ela olhou-me também e foi um verdadeiro ”reconhecimento” quase camiliano:

- Alessandra?!

- Maria João, sei tu?

Chamavam-me "Maria" geralmente em Roma, ou, quando muito,  "Maria Joáu"... Mas ela pronunciou bem o meu nome.

Não a via há mais de 30 anos de certeza!

Era então uma jovenzinha, acabando o curso de Letras, que fora um ano minha aluna. Trabalhou depois como “assistente” da Luciana Stegagno-Picchio. 

Luciana e eu "tanti anni fa..."

Ajudando-a como secretária também – mais a Guya Boni (outra minha aluna)- nas sua tarefas.

Lembrava os seus olhos claros, o sorriso delicado e os cabelos louros bem cortados.
Como podia adivinhar que a ia encontrar ali? Não era possível... 

Lembrei-me dela muitas vezes ao longo destes anos, soube que tinha participado na feitura da foto-biografia da escritora-professora. 

Depois da morte de Luciana, recebi o livrinho com a longa entrevista que lhe dedicara “Una língua altra” – de que aqui falei.

Isso ainda mais me impressionou: há poucas semanas tinha referido o nome de Alessandra Mauro e pensara nela, nesse momento, relendo com atenção o livrinho.

E – de repente- víamo-nos e falávamos?...

Gabriel Rossetti, Raquel e Leah

- Nunca venho ao Campo de’ Fiori, diz-me ela, num espanto sincero. Nunca entrei nesta “vineria” antes...

Então, como foi que nos encontrámos?

quadro do finlandês Simberg

Ah! As bruxas talvez...

Bem dizia Régio que “há mais mundos”... E contou tão bem uma história fantástica: "O Príncipe com Orelhas de Burro".
(1942)

E que vivemos – isto dizia Branquinho da Fonseca – no cruzamento de “zonas” várias de entendimento – ou de percepção?

(1932)



Não vira eu, há pouco, na Piazza Navona, um homem "equilibrar", na mão fechada, outro homem, imponderável este, imóveis os dois, numa concentração que vinha de "outros mundos" de certeza?


Ou um elefantezinho português olhar-nos com ternura - o ingénuo e bom Anone da célebre "Embaixada de D. Manuel ao Papa"?

Até Shakespeare pusera na boca de Hamlet a possibilidade das "coisas" para além da "filosofia" - inútil para as explicar:


Delacroix (1839) Hamlet e Horácio

“Há mais coisa no céu e na terra, Horácio, do que sonha a tua vã filosofia...”

Quer tudo isto dizer que,  no fundo, nos “cruzamos” no tempo e no espaço com outros seres? E por que não? 

Quantas vezes me parece senti-los...

Com os que conhecemos e amámos?  Porque não?, se há mais mundos...

5 comentários:

  1. Tens razão! E são esses outros mundos, esses estranhos encontros, esse sem sentido com sentido que me fazem sorrir, céptico, quando "racionalmente" me explicam a vida... O "racional" tem apenas o tamanho da nossa razão: vive dentro das fronteiras, dos limites do nosso raciocínio... Também ele misterioso: não há nenhum médico, nenhum cientista que não reconheça que ainda não conseguiu explicar o cérebro... Um beijo.

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  2. Eu tenho a certeza de que há mais mundos. Se não por uma razão transcendente, apenas porque este é mau demais!

    Beijinhos

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  3. Uma história incrivel.
    Também acredito nesses "mundos" que sabemos, mas não podemos explicar.
    Deve ter sido um encontro emocionante e bonito.

    Lindas as fotos da "sua" Roma e a pintura de Gabriel Rossetti é lindíssima.
    Um beijinho

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  4. Uma palavra, à Luísa, sim parece mau de mais... só que somos nós que damos cabo dele. Abordado de outra maneira, sem ganância, ódio, ambição absurdo... o paraíso estaria já aqui... Mas, à partida, não acreditamos, repara como se deseja aos mortos... paz e descanso, que, realmente, não há por cá...

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  5. Encontraste a tua amiga, foi maravilhoso, e se te apetece pensar que não foi por acaso...porque não?
    Esta manhã encontrei uma gaveta meio aberta, que nunca se usa.Antes de fechá-la agarrei no relógio do meu pai, que era de corda. Fui direita ao Enrique e disse-lhe excitada: "mira, está parado en las siete (sabes que é o "meu" número), y la aguja del minutero se mueve!!!!"
    Claro, respondeu, ontem dei-lhe corda. Riu-se e acrescentou: já estavas disposta a ver coisa estranhas...
    E eu respondi: "como sempre, deixas as gavetas meio abertas!"
    No fundo tinha gostado que aquilo não tivesse uma explicação lógica...
    Um beijinho

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