Nunca
é de mais falar de Simenon!
Da sua capacidade de criar personagens verdadeiros,
de os pôr a pensar e a sentir diante de nós, como seres vivos, que fazem o bem ou o mal, que se enganam, que tentam emendar-se...
Simenon,
ao contrário dos autores policiais que
procuram intrigas complexas, com escritas barrocas e espirais de sofisticada
astúcia, era um escritor que escolhia normalmente uma intriga simples mas as personagens que desenhava eram
fortes.
Tinham vida mesmo! A começar pela figura de Maigret, claro, e pelos 4 "magníficos" ajudantes: Lucas, Janvier, Torrence e o jovem Lapointe. E continuariamos com os infindáveis personagens das suas histórias...
E continuando pela Madame Maigret, a doce Madame Maigret, com o seu sentido prático e um certo bom senso, mas com um tanto de aventura também... Ela e os seus cozinhados, as suas óptimas receitas!
Existe um livro -que tenho, como é "obrigatório" para uma apaixonada de Maigret e de Simenon- sobre essas apetitosas coisas que ela cozinha...
Tinham vida mesmo! A começar pela figura de Maigret, claro, e pelos 4 "magníficos" ajudantes: Lucas, Janvier, Torrence e o jovem Lapointe. E continuariamos com os infindáveis personagens das suas histórias...
Maigret (Bruno Cremer) e os "quatro magníficos"
Maigret e os 4 (desenho encontrado na net)
Existe um livro -que tenho, como é "obrigatório" para uma apaixonada de Maigret e de Simenon- sobre essas apetitosas coisas que ela cozinha...
O herói (quantas vezes
anti-herói...) era acima de tudo um ser “humano”, obrigado a ir ao fundo da lógica da sua situação e do seu drama.
Explicava Simenon como começavam as suas histórias:
"Um homem qualquer, ou uma mulher, um sítio qualquer. O que poderá acontecer-lhes que os vai obrigar a ir até ao limite de si? Eis a questão. Pode ser por vezes um incidente banal mas que vai transformar as suas existências." (in "L'Âge du Roman", Editions Complexes, 1988)
Explicava Simenon como começavam as suas histórias:
"Um homem qualquer, ou uma mulher, um sítio qualquer. O que poderá acontecer-lhes que os vai obrigar a ir até ao limite de si? Eis a questão. Pode ser por vezes um incidente banal mas que vai transformar as suas existências." (in "L'Âge du Roman", Editions Complexes, 1988)
Mensagens?
Não creio que o escritor se preocupasse muito em deixar “mensagens”, limitava-se a viver intensamente a sua vida e a comunicar, no papel, as suas experiências, ou as coisas que observara nos outros e fizera passar pelo seu próprio "filtro": O seu olhar, o seu interior.
No entanto, dos seus romances
“desprende-se” uma lição: mensagem ambígua e complexa: não há
culpados nem inocentes. Há erros, culpas que se criam e se acumulam por um
nada; culpas que se formam quase sem razão, culpados que até podem ser inocentes...
Quantas
vezes Maigret, o humaníssimo Maigret, perdoa essas faltas e protege o “criminoso”
que não é culpado, afinal, aos seus olhos. Porque tudo poderia ter acontecido
de outro modo. Porque esse criminoso era afinal uma vítima...
E, depois, ele sabia que há sempre os
verdadeiros culpados sobre os quais não caem as culpas, porque protegidos a
alto nível, aparentemente prejudicados ou até inocentes mas que, aos olhos de
Maigret, nunca estarão “inocentes”.
Maigret-Michael Gambon
Aos quais não perdoa e, se puder, castiga, pelo
menos com o seu desprezo.
Os
seus romances são de uma riqueza incrível! Fala dos locais que ama, com uma
emoção especial: onde passou a infância e foi “menino de coro”; onde vinha de
férias e ia comer as ostras, como em la
Rochelle que tanto aparece nos seus romances.
Há
simpatias que se “sentem” logo no início da história. Como sentimos logo a compreensão profunda do comissário Maigret, figura tão
especial dentro do romance policial, pelos desprotegidos da sociedade, pelos
marginais tantas vezes, pelas mulheres da vida, pelos pequenos ladrões...
No fim, uma
simpatia por todos os que têm sentimentos, sofrem, amam, têm paixões...
E
o leitor entra, desde a primeira página, neste clima forte de sentimentos
excessivos. Porque Maigret, o aparentemente suave Maigret, o compreensivo
Maigret (“comprendre et ne pas juger” era o seu lema) pode ser, como o seu criador Simenon, um
homem excessivo! E ser duro e vingativo. Mas sempre humano.
Georges
Simenon escreveu centenas de livros. Diz PierreAssouline, um dos seus seu biógrafos:
“Ele escrevia cinco livros por ano. Tudo nele
é coerente [na desmedida]: nasceu sob o signo do excesso.. Quando fala é
durante horas; quando escreve é um livro de 3 em 3 meses e perde 5 kg por livro;
quando escreve cartas são 10 por dia; quando ganha dinheiro é uma fortuna;
quando é adaptado ao cinema passa a ser o escritor “mais adaptado”...
“Foi,
de facto, um romancista de uma
fecundidade extraordinária: escreveu 192 romances, 158 novelas, além de obras
autobiográficas e numerosos artigos e reportagens sob seu nome e mais 176 romances,
dezenas de novelas, contos e artigos sob 27 pseudónimos diferentes. As tiragens
acumuladas dos seus livros atingem mais de 500 milhões de exemplares. É o autor
belga, e o quarto autor de língua francesa, mais traduzido em todo o mundo.”
encontrei-o publicado em Moscovo, numa colecção de bolso
Só para terminar, tenho que referir uma belíssima e "perfeita" série inglesa: "Maigret", que ando a ver em DVD.
Série da BBC de que não consigo encontrar a "continuação" (só encontrei as 2 primeiras temporadas e elas são 5!)! Com um maravilhoso actor, Michael Gambon, que até nos faz esquecer que é inglês de tal modo entra na pele do comissário, sem falhar nada.
Importante saber que Michael Gambon é um conhecido e respeitado actor de teatro inglês, especializado em Shakespeare, o que me faz admirar mais a sua "simplicidade" em se debruçar sobre Maigret.
Ou, melhor, assinalar a grandeza da personagem de Maigret que atraiu o grande Gambon!
Como nada falham os seus co-actores, nos papéis (difíceis para um inglês, ou, melhor, para um estrangeiro...) dos inspectores dele - de Lucas, a Janvier ao jovem Lapointe que se vestem, comem, respiram como se acabassem de sair de um dos romances de Simenon!
Não quero esquecer outro "grande" Maigret: o actor Bruno Cremer que -de modo bem diferente, com mais secura e distanciamento (aparente) tem uma presença digna da figura que interpreta...
Importante saber que Michael Gambon é um conhecido e respeitado actor de teatro inglês, especializado em Shakespeare, o que me faz admirar mais a sua "simplicidade" em se debruçar sobre Maigret.
Ou, melhor, assinalar a grandeza da personagem de Maigret que atraiu o grande Gambon!
aqui, Gambon no papel do detective cantor, outra série da BBC
Como nada falham os seus co-actores, nos papéis (difíceis para um inglês, ou, melhor, para um estrangeiro...) dos inspectores dele - de Lucas, a Janvier ao jovem Lapointe que se vestem, comem, respiram como se acabassem de sair de um dos romances de Simenon!
Não quero esquecer outro "grande" Maigret: o actor Bruno Cremer que -de modo bem diferente, com mais secura e distanciamento (aparente) tem uma presença digna da figura que interpreta...
Deixo esta biografia breve do
autor (reduzida e retrabalhada por mim sobre tudo o que encontrei na net):
“Simenon nasceu na rua
Leopold, em Liège (Bélgica).
Em 1905, a família
mudou para a rua Pasteur (hoje chamada Rua Georges Simenon). A família é
originária do ‘’Limburgo belga’’, uma região de terras baixas próximo a Meuse,
um corredor de passagem entre a Flandres, a Valónia e os Países Baixos.
Georges começou a
aprendeu a ler aos três anos na escola Sainte-Julienne. A partir de 1908,
começa a escola primária no Instituto Santo André, onde foi, nos seis anos
seguintes, um dos três melhores alunos.
Nesta época, a mãe
começa a alugar quartos para estudantes ou estagiários de várias origens, o que
foi para a criança que ele era uma extraordinária abertura para o mundo.
A partir de 1914, vai
estudar com os jesuítas no Colégio São Luís.
Em Janeiro de 1919, em
conflito aberto com a mãe, começa como repórter no jornal "La Gazette de
Liége", período extraordinário para o jovem de 16 anos, que escreve mais
de 150 artigos com o pseudónimo de "G. Sim.".
Começa a interessar-se
particularmente pelos inquéritos policiais, e assiste a conferências sobre “polícia
científica”, feitos pelo criminalista francês Edmund Locard.
Nesse ano redige o seu
primeiro romance, "Au pont des Arches", publicado, em 1921, com seu
nome de jornalista.
A partir de 1919,
publica o primeiro de cerca de 800
sketchs humorísticos sob o nome de Monsieur Le Coq. Nessa época, os anos
20, aprofunda o seu conhecimento do meio boémio, das prostitutas, dos bêbados,
anarquistas, artistas e mesmo futuros assassinos.
Frequenta um
grupo de artistas chamados "La Caque", onde encontra uma estudante de
Belas-Artes, Regine Renchon, com quem se casa em 1923.
Quando o pai morre,
parte par Paris, com Regine, descobrindo a grande capital que aprende a amar com
suas desordens, seus delírios. E vai à descoberta de seus bistrots, brasseries
e restaurantes, encontrando seus personagens na população parisiense, artesãos,
serviçais, pobres das ruas.
Começa a escrever com
diversos pseudónimos e sua criatividade lhe assegura um rápido sucesso
financeiro.
Em 1928, faz uma longa
viagem de barco, para suas reportagens, descobrindo a água e a navegação, que
aparecem sempre em sua obra. Decide em 1929 fazer uma viagem pela França,
explorando os canais num barco que mandou construir, o ‘’Ostrogoth’’, no qual
viverá até 1931.
Em 1930, numa série de
novelas escritas para a ‘’Detective’’, colecção encomendada por Joseph Kessel,
aparece pela primeira vez o personagem ‘’Comissário Maigret’’.
Em 1932, parte para uma
série de viagens e reportagens na África, na Europa, Rússia e Turquia. Depois
de um longo cruzeiro pelo Mediterrâneo,
embarca para uma volta ao mundo entre 1934 e 1935.
Nas suas escalas,
produz reportagens, encontra numerosos personagens e faz muitas fotos. Não se
furta também de descobrir o prazer com mulheres de todas as latitudes.
Na obra de Simenon,
trinta e quatro romances ou novelas se passam em La Rochelle,
que descobriu em 1927 passando suas férias na ilha de Aix, seguindo a sua paixão
por Josephine Baker. Naquele ano descobriu também uma
paixão pela navegação e por La Rochelle, onde no ‘’Café de la Paix’’, -que
aparece em obras suas e se tornaria seu quartel-general.
Durante toda a guerra,
entre 1940 a 1945, continua vivendo na sua vila da Vendée.
Desse período há vinte
romances, onde o que se sobressai é a região de Vendée, uma
região luminosa, impressionista, onde o mar reencontra a terra.
Em 1945, após o termino
da guerra, vai viver no estado de Connecticut,
nos Estados Unidos da América, percorrendo
nos dez anos seguintes todo esse continente, para saciar sua curiosidade e seu
apetite de viver. Durante esses anos americanos, visita sempre Nova Iorque,
Flórida, Arizona e a Califórnia
e toda a costa Leste, milha a milha, os motéis, as estradas e as paisagens grandiosas.
Ali vai descobrir outra faceta do trabalho policial e da Justiça. E conhecerá ainda sua segunda esposa, a
canadense Denise Quimet, 17 anos mais jovem, com a qual vai viver uma paixão
intensa de sexo, ciúmes, disputas e álcool.
Em 1952, é nomeado para
a academia belga. Volta definitivamente para a Europa em 1955, onde após um
movimentado período na Côte d'Azur se instala em Epalinges,
ao norte de Lausanne,
Suíça,
mandando construir uma grande mansão.
Em 1960, preside o
festival de cinema de Cannes, que aquele ano premiou com a palma de ouro La
dolce vita de Fellini.
Em 1972, Simenon
renuncia ao romance,
mas não havia acabado de explorar os meandros do homem, a começar por ele
mesmo, em uma longa autobiografia com 21 volumes ditada em um pequeno gravador." (wikipedia).
Já aqui falei de Simenon, em 2009, no início destes "trabalhos" do blog...
http://falcaodejade.blogspot.pt/2009/09/georges-simenon-esse-fenomeno-saiu-em.html
Já aqui falei de Simenon, em 2009, no início destes "trabalhos" do blog...
http://falcaodejade.blogspot.pt/2009/09/georges-simenon-esse-fenomeno-saiu-em.html
É Impressionante o que se escreveu sobre Simenon ou sobre a sua personagem Maigret. Inútil repetir-me. Deixo mais duas ideias, na "net" (para mim, incompreensíveis de tão sofisticadamente "técnicas"...
"tese " de Murielle Wenger
Ou a Enciclopédia
Migret, na net
Excelente viagem partilhada
ResponderEliminarNa verdade - a ficção é outra realidade
que nos transporta
São dele, os primeiros policiais que comecei a gostar de ler, talvez ao mesmo tempo ou logo a seguir aos da Agatha Christie e há anos descobri um romance/novela dele que não era um policial e que também adorei, "A Sonsa",na Colecção Miniatura :)
ResponderEliminarum beijinho
Gábi
Gostei muito de ler!
ResponderEliminarTanto que escreveu, tantos pseudónimos!
Assim uma espécie de Fernando Pessoa do policial!(ah!ah!ah!)
Muito interessante!
Vi muitos filmes policiais na televisão, mas li poucos livros. Gostei dos que li...
Um beijinho grande
André Gide considerava-o o maior romancista francês do século XX. E talvez tivesse razão... talvez o grande Proust seja mais um memoralista do que um romancista...
ResponderEliminarSimenon não foi, apenas, um escritor polilial -foi muito mais que isso.
Os seus romances "duros", como lhes chamava, são magistrais -e recordo "Quartier nègre", obra-prima da Grande Literatura.