Pois é verdade: Wilkie Collins (1824-1889) é um grande escritor. Utilizando elementos da literatura de folhetim, hábito muito comum no século XIX, inventa um novo género.
De repente, veio-me uma dúvida e, logo, a ideia luminosa: por que é que a "Relógio de Água" não publica já a seguir A Mulher de Branco?
Havia esse romance na velha colecção "Romano Torres" mas está "indisponível" em toda a parte.
Existe uma edição relativamente recente da Europa-América, em dois volumes, na colecção Livros de bolso/Série Clube do Crime, mas possivelmente estará esgotada também.
Talvez tenha sido primeiro A Mulher de Branco, e, mais tarde, O Diamante da Lua, assim se chamava na edição saída em 1953, numa velha colecção -da tal editora Romano Torres- que traduzia (bem?, mal?,truncados? Não faço ideia) autores famosos!
Eu adorava os livros daquela colecção! Que deve ser recordada pelo trabalho importante que teve em dar aos jovens -e menos jovens- uma possibilidade de lerem, de forma talvez mais simplificada, a boa literatura -sobretudo a literatura inglesa.
Ainda conservo alguns deles, entre os quais os dois livros deste grande autor inglês talvez um dos precursores do “romance de detective”, inquérito, mistério. E muitos outros cujas capas fui encontrar na internet (site da Biblioteca Nacional) e todos os títulos estão "indisponíveis"...
Havia também Walter Scott, Charles Dickens e o seu divertido e inesqucível Pickwick's Club, Natanael Hawthorne (“A Letra Escarlate”), A Feira das Vaidades, de Thackeray, Jane Austen e Orgulho e Preconceito (Sangue Azul, chamava-se), etc .
Reli os dois romance de Collins há pouco tempo. Desta vez li "The woman in white" em inglês, mas o The Moonstone -o tal Diamante da Lua, hoje publicado como A Pedra da Lua- esse reli-o na velha versão que, desta vez, me pareceu mais fraca, possivelmente pela tal tradução que aos 12 anos não me incomodava nada saber se era boa ou má...
A Mulher de Branco é um livro fantástico! Maravilhoso, empolgante, sem dar um momento de trégua ao leitor que pensa, pensa sem conseguir desvendar o mistério da famosa e desconhecida "mulher de branco"!
Em 1859, Wilkie Collins começa a publicação, em folhetim, do romance The Woman in White (A Mulher de Branco”, publicado depois em 1860).
Romance extremamente fascinante e moderno, penso eu, por muitas razões.
Por exemplo: o autor dá-nos diversas “versões” dos acontecimentos, cada uma apresentada pelos vários protagonistas: numa espécie de “diário” -ou “cartas” por vezes- que revelam aspectos muito diferentes uns dos outros.
Tudo depende da perspectiva, do ponto de vista, da boa-fé em que cada um dos "narradores" se põe; ou conforme a relação afectiva que liga os diversos personagens entre si...
Assim, só o leitor pode “julgar” (e com dificuldade...) essas diversas versões, –conforme as situações- inclinando-se ora para um lado ora para o outro, hesitando, tentando perceber o que há de verdade ou de mentira, ou apenas ocultação dos factos, voluntária ou involuntária, em cada uma delas.
Mas o leitor sabe pouco...
Tudo é contado pouco a pouco, diria a conta-gotas, sempre com grande suspense e, no final de cada capítulo (ou folhetim saído), há sempre a dúvida, a curiosidade, o pasmo.
Quem é a mulher de branco?
Existirá mesmo a mulher de branco?
Por que motivo a imagem da mulher de branco se associa a outra mulher?
De facto, A Mulher de Branco é um romance de mistério, ou então -termo que recebeu na época em que saíu- “romance de sensação”.
Há quem o considere (Edgar Allan Pöe) como o primeiro romance do género (“policial”, série noire, ou giallo italiano, diríamos hoje, conforme as línguas) detectivesco.
Em que consiste a intriga?
O romance inicia-se com a “versão” dos factos contada por Walter Hartrigh, jovem pintor londrino, e do “extraordinário” (sentido literal da palavra “fora do ordinário”) encontro que teve uma noite com uma misteriosa mulher vestida de branco, em Londres.
A mulher misteriosa fugira não se sabe bem de onde: sente-se vítima de perseguição, e Hartright ajuda-a a atravessar as ruas sombrias de Londres até um ponto em que se separa dele e lhe pede que não procure saber dela.
E desaparece, na noite.
Continuando o seu caminho, o destino coloca-o como professor de pintura de duas irmãs órfãs, aliás meias-irmãs, na província inglesa.
A mais velha, Marian Halcombe, é uma figura interessante de mulher mas que nada deve à beleza. O que a grande inteligência permite fazer esquecer a quem com ela se relacione.
Lembra-me a frase de Henry James sobre a escritora George Eliot, em carta à mãe: “é uma mulher muito feia, mas, pouco tempo depois de conversar, é muito fácil apaixonarmo-nos por ela...”
É Marian que escreve a segunda “versão” do que acontece e apresenta novos mistérios, indecifráveis para os personagens e, é claro, ainda mais para o leitor...
A irmã mais nova, Laura Fairlie, pelo contrário é de uma beleza fora do vulgar e de uma sensibilidade e fragilidade enormes.
E Hartwright apaixona-se por ela...
Outras personagens aparecem: Sir Percival Glyde, o tio e tutor, personagem de grande egoísmo, o Conte Fosco e a mulher, personagens ambíguas, e outras figuras. Não adianto a história porque não quero que percam a curiosidade.
Entrego-vos os dois livros...Mas digo só mais uma coisa que lhes pode interessar:
O romance foi adaptado pela BBC (*) para uma série televisiva de grande qualidade –como sempre são as séries inglesas! -e que, segundo dizem, se mantém fiel ao suspense e ao mistério de uma forma que não atraiçoa o espírito do livro.
(*) The Woman in White (1997) do realizador Tim Fywell que também já realizou The Moonstone e, mais recentemente, fez filme tirado da novela magistral de Henry James (**), terrificante, The turn of the screw (de que existe uma bela tradução de João Gaspar Simões, Calafrio, Portugália Editora, 1965, na colecção "O livro de bolso").
Nota:
(**) Outros livros de Henry James: Daisy Miller (procurem, há imensas traduções), Portrait of a Lady, The Author of Beltraffio" ou The Wings of the Dove.
Olá
ResponderEliminarAdorei seu blog e a coleção de livros cujas capas vc expõe [obras escolhidas de autores escolhidos] eu possuo há muitos anos, desde minha adolescência.
Amo a literatura inglesa e todos estes autores são meus ídolos.
Há pouco tempo encontrei as Mini Séries da BBC com alguns destes títulos e estou compartilhando no meu blog de cinema.
Talvez vc se interesse de assistir [eu adorei todos, já que a BBC tem uma marca de qualidade garantida e os atores ingleses são excepcionais].
Parabéns pelo seu blog, foi delicioso encontrar este paraíso literário.
Um beijo
SoniaSRRJ
Eis o link onde postei as Mini Séries no meu blog:
http://soniassrjcinema.blogspot.com/search/label/%5BMINI%20S%C3%89RIE%20BBC%5D