quarta-feira, 14 de abril de 2010

Continuando: a viagem à "minha" Russia...

a estação de metropolitano de Kievskaya
Vassilii Kandinsky, "o polegar vermelho"
retrato de Tolstoi, feito pelo pintor russo Repin
Continuo, pois...

Mas antes gostava de mostrar algumas “reacções” ao meu post...
Impressionou-me ver como, dentro de nós, portugueses (e brasileiros), houve –e permanece- esse fascínio enorme pela Literatura Russa e, logo, pela Rússia!
Os Czares! Tolstoi! Pedro o Grande, Dostoievski ...
o escritor Leão Tolstoi
Porque houve uma esperança que durou até morrer.
manifesto revolucionário desenhado por Maïakovsky
Maïakovsky é um exemplo dessa esperança: revolucionário, na arte como na vida, lutador, sincero no que pensava e pintava, acaba por se suicidar quando uma certa desilusão chega, em 1930.

Na noite de 14 de Abril de 1930, Mayakovsky pôs fim à vida, com um tiro. Tem 37 anos...
Faz hoje 80 anos.
Está enterrado no belo Cemitério de Novodevitchi, em Moscovo, onde repousam artistas de todos os tipos e pessoas importantes ou simples actores ou bailarinas...
túmulo de Maïakovsky, no Cemitério Novodevitchi
Na sua nota de suicídio, "The infinished poem", lê-se em parte :

And so they say-
"the incident dissolved"
he love boat smashed up
on the dreary routine.
I'm through with life
and [we] should absolve
from mutual hurts, afflictions and spleen.
Mas a esperança continua : um mundo melhor, um mundo igual para todos, quer dizer, com as mesmas oportunidades...
Essas coisas todas em que queremos acreditar!

E eu lembro outros nomes de grandes russos: Turgueniev, Gogol, Gorki, Biély...


Tolstoi e Gorki
(postal comprado na Ismaïlova, grande feira de Moscovo, espécie de Feira da Ladra...e bilhete de entrada no Kremlin)
retrato do escritor Turgueniev
Ou os pintores Chagall, o genial judeu russo, e Kandinsky, o criador da arte moderna, que se afastaram da Rússia mas são agora -depois da queda da União Soviética- recordados em lugar de honra.

Vassilii Kandinsky, Composição
Em 2005, realizou-se em Moscovo, na "Galeria Tretyakova", uma grande Retrospectiva da Pintura de Chagall. Oitenta e três anos depois de ele ter abandonado a Rússia, a sua pintura voltava à terra natal a recordá-lo.
Intitulava-se:
"Bonjour, la Patrie!"
No Catálogo, a nota biográfica dizia apenas:
Rússia - França- Rússia - 1887-1922
França - USA- França - 1922-1985
Foi um enorme sucesso, filas que não tinham fim, desde manhã até à hora de fechar: de gente paciente que aguardava, como sempre fizera, a sua vez...
Eu esperei também e vi, tive essa sorte, estava lá...
Marc Chagall, um Anjo Azul
O mundo não acabou. A terra treme, treme e sabe-se lá as voltas que este planeta louco e insatisfeito ainda vai dar...
Há a Utopia e a Utopia são os outros. Os que hão-de vir. O futuro.
quadro de Zinaida Serebryakova, retrato dos filhos à mesa
Dizia Mao: “ a grande marcha começa com o primeiro passo...”
Atrás de nós outros vêm, não é?
A marcha é sempre em frente, custe o que custar. Mesmo quando se recuou...volta-se a acertar o passo: e em frente!
Sei o que todos sentimos: a verdade é que tem sido ultimamente uma marcha atrás...

(Aparte:
Li há dias, num livro interessantíssmo do nosso grande Oliveira Martins, bastante esquecido, no livro "A Inglaterra de Hoje" (Cartas de um Viajante), publicadas no "Jornal do Commercio" do Rio de Janeiro, no último trimestre de 1892.
Essas "cartas", depois de revistas pelo autor, saem em livro em Fevereiro de 1893 (Livraria António Maria Pereira).
Vejo o seu entusiasmo com certas conquistas : fala de Thomas Burt -um mineiro que se educou a si próprio, organizou um sindicato e, em 1873, foi eleito deputado pelos mineiros - e lá continua ainda (1892), diz o autor.
Refere-se ao "unionismo novo" que, em 1890, consegue que o Congresso em Liverpool votasse a lei legal de oito horas: as oito horas de trabalho!
Quem trabalha “hoje” só oito horas?
Onde estão as conquistas que se conquistaram? )

Enfin, passons...

Voltemos a Tolstoï –que bem se preocupou com a justiça social e teve a esperança de ver coisas mudar -que, no fundo, o não benefiaciariam a ele, o Conde Tolstoï, instalado na sua casa de Moscovo ou na sua propriedade numa floresta de árvores centenárias - e de lagos com nenúfares- em Iasnaya Polyana (a 90 kms de Moscovo) onde Tolstoi viveu 60 anos e onde está enterrado). Mas, sim, os outros, os seus servos...
vista da casa de Tolstoi, em Iasnaya Polyana e Pavilhão no lago (fotos minhas)
Continuando...

É impressionante ver como nos “marcou”, de facto, essa literatura!
A ponto de não a esquecermos nunca e de falarmos hoje dela com tanto entusiasmo:

Aqui deixo alguns comentários à "minha Rússia":
lago com nenúfares, em Iasnaya Polyana (fotos da autora)

A Rússia! Do Pedro, da Catarina, dos Nicolaus, do Tolstoi, do Lenine. Da sua música tradicional, Os Olhos Negros, Kalinka, Os Barqueiros Do Volga!"
(de Mfonseca)

Do “parceiro” do fantástico blog de jazz -Borboletas de Jade- recebi estas palavras:
Obrigado por dividir esse momento tão maravilhoso de viajar em perspectivas até então imagináveis pra mim.
Bela postagens e fica na paz, parceira.
Li Paz e Guerra no começo de minhas descobertas de literaturas e confesso que aprendi a viver nesta selva de pedra que me cerca através deste livro.”

Outra mensagem da minha, já “amiga”, Maria:

“Também eu de miúda devorei dois livrinhos que havia na minha casa, "Nietotchka" e "Pobres Gentes", e, quando li "Crime e Castigo", já era uma enamorada do Dostoiévski, e da Russia que nunca verei.”
na Casa-Museu Dostoievski, em São Petersburgo (minhas)

Lindas as suas escolhas, Maria: são, para mim, das histórias mais belas e dolorosas de Dostoievski!
Acrescento: "A Doce" (que foi publicada na Inquérito com o nome de "Está Morta!")- que hoje existe em nova tradução na Assírio e Alvim, de que já falei. Se não leu, vá procurar já!
Tchekhov de visita a Tolstoi
Volto aos escritores que pude reviver através das casas onde viveram e que “alguma coisa” deixam sempre deles nelas: Estação de Kazan

Em Moscovo, saía da Rua Bolshaia Spaskaya, perto da "Praça das Três Estações", ia visitar o que podia: a casa de Tchekhov, de Tolstoi, de Pushkin, de Gorki...

Assisti a duas representações muito diferentes de A Gaivota, uma encenação clássica, no Thêatre des Arts, outra, com toque mais moderno, num pequeno teatro.

Com palco circular lembrando um tapete rolante à volta do qual estão sentados os espectadores, quase dentro da cena.

Bons actores, sempre.
o Doutor Tchekhov, com os cães dele
O Tcheckhov que eu adoro! A sua generosidade, a ética, a doçura do Doutor Tchekhov...
Os Contos são inigualáveis de humanidade: pela ternura, dor, solidão, melancolia, amor...
E as peças, quem as não viu e amou? Lembro-me de uma peça da BBC, “As três irmãs”, que nunca mais esqueci.

Desculpem insistir nele...

Muito desse teatro é possível ver. E em Portugal, constantemente, passam A Gaivota, O Tio Vania, O Cerejal...
Vi no Teatro Maly A Floresta, de Ostrovski (que não conhecia), e, num pequeno teatro de ensaio, dramatização, quase futurista, do Doutor Jivago, o romance de Boris Pasternak.
O que me importa é comunicar o que senti: a emoção enorme.
Comovia-me com tudo.
Depois, os Museus foram uma descoberta: a da pintura russa, para mim completamente desconhecida.

Ir à Galeria Tretyakova é um prazer diferente, porque se “vê” o mundo russo lá dentro: as figuras, os retratos, as expressões melancólicas tão próximas de nós...

As paisagens tal como as imaginámos, a partir dos livros, as árvores nas florestas, cheias de ramos e copas fechadas como num túnel, ou os céus de chumbo, de neve, ou azuis-vivo de Isaac Leviatan, as paisagens fortes, a terra quase assustadora e ao mesmo tempo doce de Kuindji, a Primavera que desabrocha de repente, os pássaros (os corvos) que voltam depois do Inverno para os troncos ainda despidos, de Savrassov, a menina dos pêssegos, de Serov...
Os ícones do famoso Andrei Roublev (Rubliov) que viveu entre 1370-1440.

Etc...

E a pintura "histórica", dramática, o "repórter" das Guerras do Cáucaso, chamado o pintor das batalhas, com um nome impossível: Véréchtchaguine; ou o cantor dos contos folclóricos e das lendas russas, Viktor Vasnetsov...

Prometo que vou continuar... com uma ida a S. Petersburgo!

Deixo Poema de Maiakowsky (que não me atrevo a traduzir...), no dia da sua morte, hoje 14 de Abril, 80 anos depois.

Your thoughts,
dreaming on a softened brain,

like an over-fed lackey on a greasy settee,
with my heart's bloody tatters I'll mock again;
impudent and caustic, I'll jeer to superfluity.
Of Grandfatherly gentleness I'm devoid,
there's not a single grey hair in my soul!
Thundering the world with the might of my voice
I go by – handsome,
twenty-two-year-old.

4 comentários:

  1. Obrigado por estes dois posts.

    No universo nada acontece por acaso. O encontrar-me aqui não será um fenómeno tão aleatório como se possa imaginar.

    Parece que foi um tal Carl Yung que falou da existência de um Colectivo Comum.

    MFonseca

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  2. Interessante post o da sua Rússia.É graças aos seus escritores geniais que muitos estamos enamorados desse país,da sua apaixonante história e geografia,das suas gentes heroicas e formosas,cheias de coragem e dignidade.Até os nomes têm um encanto especial!
    Mando-lhe uma reflexâo de Michka Kochevoi:(...)Nada é mais terrivel que o que existe no homem,e nâo é possível penetrá-lo até ao fundo.Agora estou aqui deitado ao teu lado,e nâo conheço os teus pensamentos,nem os conhecerei nunca."O Don Tranquilo"de Cholojov,4ªparte,capº21.Beijinhos

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  3. Conheci a Rússia, noutra perspectiva...politica... Gosto mais da tua, porque na adolescência comecei a conhecer essa rússia de que falas e que me encantava.O meu caminho foi outro por curiosidade e... tb. pensei que podia fazer deste mundo um mundo melhor...provàvelmente por isso eu pense que a utopia está no coração, porque aí encontramos a esperança , o amor e a humanidade, emuitas coisas mais... Tb.naturalmente que isto são ideias de quem pensa já com grande cepticismo de existência...
    Gostei do que escreveste e sabes que sou tua fâ.... Beijitos. Madade

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  4. Lembro-me de me falares da Rua Arbat (ou Praça?) e fui vê-la a pensar em ti, o velho bairro Arbat, a Nova Rua Arbat...
    Sei que continuas a tentar fazer um mundo melhor. Concretamente. No dia a dia e com coisas difíceis!
    Isso é que é o Ideal e a Utopia.
    bjs

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