sábado, 16 de julho de 2011

Os Olhos de Jade, capítulo XIV







Os Olhos de Jade




CAPÍTULO 14



Joan caminhava, apertando a gola do blusão de malha que lhe aquecia o pescoço esguio. Demorou-se no jardim, olhou as árvores e os canteiros de flores em redor da casa, o tronco retorcido e sem folhas da trepadeira de glicínias.

Estava uma manhã de sol fria e as árvores, lavadas pela chuva, tinham os ramos brilhantes.


Pensava que, se tinha razão, e alguém tinha espreitado pela janela no dia anterior, haveria sinais de pegadas debaixo da janela.


Curvou-se, apoiada nos joelhos, e afastou as ervas rasteiras, procurando uma marca, mas o exame cuidadoso nada adiantou, a terra estava empapada das chuvas da noite e as ervas, apenas salpicadas dessa mesma terra molhada.


- Será possível que a minha imaginação me engane duas vezes? Estou a ficar transtornada?


Costumava ser lógica, não se deixava impressionar facilmente.


- De repente, sofro de “alucinações”, tenho pressentimentos, tenho medo! Eu?!


Mary ainda não tinha chegado. Era sábado e costumava vir mais tarde por causa das compras para o fim de semana. Sentiu a falta dela.


- Preciso de falar com alguém!, pensou. Vou acordar o Gabriel...”

Resolveu preparar o pequeno almoço para os dois, mas, quando foi espreitar ao escritório, para lhe perguntar o que queria, não o viu.


A luz estava fechada e a secretária limpa, só o computador continuava ligado. Reparou num envelope comprido que tinha escrito por fora “não abrir”.


Tocou-o, e a curiosidade fê-la girar o envelope tentando perceber o que estava dentro.


- Serão os papéis da mãe?


A ideia dos papéis obcecava-a.


Pela espessura e formato viu que se tratava de uma diskette.


- Deve estar a dormir, coitado. Fez bem. Se calhar não dormiu nada toda a noite.


Bem gostava de saber que papéis eram aqueles.


- Terá encontrado alguma coisa? E a diskette para que servirá?


Na cozinha, pegou no tabuleiro e começou a preparar o pequeno almoço. A manhã passara e ainda não tinha comido. Encheu uma grande taça com leite e corn flakes, fez um café bem forte e foi sentar-se no sofá da sala com o tabuleiro ao colo.


Recostou-se, pôs os pés em cima de um banco e suspirou. Sentia-se deprimida. De repente, tinha perdido o apetite. Limitou-se a tomar o café que, entretanto, arrefecera e fumou o primeiro cigarro do dia.


-Meu Deus, se ao menos o Michael chegasse depressa! Não consigo fazer nada.



Ouviu barulho, pousou o cigarro e foi a correr. Era o carro de Helen.

- Helen! Minha querida! Ainda bem que vieste, parece que adivinhaste como precisava de ti! Estava para aqui sozinha como um cão, a pensar na vida e a sentir-me a última desgraçada do mundo! O Gabriel está a dormir...

Não conseguia parar de falar enquanto ajudava Helen a sair do carro.


- Eu adivinho sempre tudo, querida, já sabes, a tal telepatia... Ao pequeno almoço estava a falar com a Emily sobre a nossa conversa de ontem e apeteceu-me vir dar uma olhadela, ver-te, falar com a Mary, com o vosso jardineiro.


Bateu-lhe no braço, suavemente:

- Enfim, vamos começar uma investigação a sério!


- Tens razão. Preciso de raciocinar em voz alta com alguém que me perceba, que me ajude. Estava a pensar no Michael e apareceste tu!

Olhou para os embrulhos, e disse:


-Não era preciso trazeres comida, a Mary foi às compras, deve vir carregada também...


-Nunca é demais e não te esqueças que vem aí o teu irmão. Vem neste fim de semana, não é?


-Está bem, mas antes de começarmos a investigar, como tu dizes, vamos primeiro tomar um café a sério! Já tomei um, mas não me soube bem, deixei-o arrefecer.

- Sim, minha querida, um café sabe-me sempre bem!

-Podemos tomá-lo na cozinha? Não te importas? Contigo não faço cerimónia e sinto-me bem ali, mais quentinha. Quando era pequena adorava estar na cozinha...

Quando Mary chegou, Helen ajudou-a a arrumar as verduras no frigorífico, enquanto lhe ia fazendo perguntas.


- Mary, diga-me, reparou nalguma coisa fora do comum, antes da morte da senhora? Por exemplo, um telefonema estranho. Ou uma carta? Percebe o que eu quero dizer?

- Sim, percebo...


Pensou um pouco e disse, abanando a cabeça:


- Cartas não houve, só os chocolates e as flores. A senhora adorava chocolates. E telefonemas, claro, isso houve, mas...

- Chocolates? Mas quem é que lhe mandou os chocolates?


- Julguei que tinha sido a senhora, Mrs. Croft...ou a Miss Emily...


- Por amor de Deus, Mary, não me chame Mrs. Croft! Collins, só Collins, Mary! Helen Collins…

- É verdade, esqueço-me sempre que o Mr. Croft...

- Passou à história, é isso. E lembra-se em que dia foi?


- Sei muito bem, então não me lembro? Foi no dia a seguir ao jantar que houve cá em casa. Toda a gente telefonou a agradecer, mandaram flores à senhora e essa caixinha de chocolates, pequenina.

Helen tirou a boquilha da mala preta e acendeu um cigarro. Aspirou com força o fumo, antes de dizer:

- Chocolates!? E quem os trouxe? Como é que vieram?

- Ninguém, quer dizer, vieram normalmente. O carteiro é que os trouxe! Era um embrulho pequeno, assim, normal...

E Mary mostrava com as mãos o tamanho do embrulho.

- De onde é que vinha? Reparou na direcção?

- O carimbo era de Brighton, por isso é que julguei que era das senhoras. Acho que foi o que a senhora pensou...


- Por quê?

- Disse assim: “ Sabe sempre do que eu gosto...”, ou coisa parecida, e riu-se enquanto abria a encomenda. Vi que eram cinco chocolates.


- Só cinco chocolates? Que disparate! Eu não mandei chocolates nenhuns, nem eu nem a Emily!

E num aparte, para Joan:

- Nem nunca mandaria só cinco...Façámos, claro, e mandei-lhe sete rosas vermelhas. Era um hábito nosso...

Virou-se para Joan:

- Quase um código: “Red roses for a blue lady.” A canção, não conheces?


- Sim, tia Helen. Mas por quê só cinco chocolates? Ninguém oferece uma caixa tão insignificante...

Joan ficara a pensar. Helen interrompeu-lhe o pensamento:

- Sabes por quê? Porque cinco chocolates comem-se num instante e o efeito do veneno é concentrado num curto espaço de tempo!


Joan virou-se para Helen, devagar:


-Sim. É isso. Toda a gente sabia que a mãe não resistia aos chocolates! E o Gabriel é alérgico, ainda ontem falámos nisso. E todos sabiam.


-Que horror!, disse Helen. Isso é horrível!


- Oh! Helen, tenho medo!...

3 comentários:

  1. Livro fantástico "Os olhos de Jade"!

    Já comento de visual novo.

    Um beijinho

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  2. Empolgante!
    Vai publicar ou já está publicado?

    Gostei.
    Um beijinho!:)

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  3. Obrigada!

    Publicar? Eu até publicava, está pronto, mas quem o quer???
    Beijinhos para as duas e um bom domingo.
    Belo visual Isabel!

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