Liliana
tentara brincar com Roberta mas não se sentia à vontade. Ela falava de coisas demasiado sérias.
Pensou que era a luz forte que a
incomodava e semicerrou os olhos. A fonte salpicava tudo à volta.
Alguns turistas estavam sentados nos degraus, virados para o Pantheon.
Cheios de sono, cheios de frio, cansados.
De repente, protestou:
-Acho que já não era capaz de viajar assim...
E
apontava para os turistas.
Os outros estavam abstraídos, possivelmente a pensar no que ela dissera.
-Já
leste sobre a morte da condessa?
Era Michael que mudava a conversa, de propósito. Era muito complicado o problema de Roberta...
-Estás
a falar comigo?, perguntou Roberta.
-Contigo,
claro. A Liliana sei eu que leu. Estamos sempre à procura destas notícias. Adoramos mistérios.
-Ele, não sabes?
É um detective! disse Liliana, que esticava os braços,
espreguiçando os braços nus.
-Ó
detective, então o que pensas desta história misteriosa?, perguntou Roberta, a querer interessar-se.
Pusera-se a rir outra vez. A Roberta de sempre, cheia de vontade de viver.
Não o imaginava como detective, parecia-lhe antes um
grande sonhador.
-Já
tinhas lido?
-Claro
que li! Como toda a gente. Quem é que resiste à atracção do mistério...
Voltou-se para Michael.
- Não tenho as ideias muito claras...
- Tu, não tens ideias?, interrompeu-o Liliana. Não falas se não nisso!
E voltou a encostar-se, de olhos semicerrados.
E voltou a encostar-se, de olhos semicerrados.
Observava-os.
Percebia que gostavam de trocar impressões e que Roberta se sentia bem com
Michael. Assim, retirava-se da cena e deixava-lhes o grande plano.
“É
isso o amor, pensava. Deixar que o objecto do nosso amor se expanda, brilhe...
Será?”
No
fundo, não tinha a certeza, mas, desde que tinha conhecido Michael, começara a
apagar-se diante dele.
“Será
que me acomodei e deixei de desafiar a vida como antes? A anti-conformista, a
rebelde, a teimosa, a exigente conformou-se?”
Enrolou
os cabelos por detrás da orelha direita. Ergueu as sobrancelhas.
“Foi
o que ele amou em mim, a minha rebeldia, a minha diferença, até uma certa
extravagância...”
Deixara
de os ouvir. Ia pensando que ele se preocupava com tudo, tomava conta dela e a
verdade é que se encostara e repousava nele. Lembrava o primeiro encontro no Mahjong, um pequeno restaurante chinês numa rua do Bairro
Alto, em Lisboa.
A simpatia mútua que se criara logo.
Recordava-o a voltar de Inglaterra, e a ir
procurá-la. Vivera uma experiência dolorosa, indescritível, que envolvera o
assassínio da mãe e de pessoas próximas. E a resolução do crime, por ele, sozinho.
“Um
grande detective de facto...” Sorriu.
Voltou
a olhá-los, e sentiu uma ponta de ciúme. Roberta
era uma pessoa bela, viva, cheia de "charme".
“Disparate!
Ele gosta de mim!”, esforçou-se por pensar.
Voltou
a fechar os olhos.
Durante
a conversa, Michael olhara várias vezes para Liliana, mas encontrava a
barreira das pálpebras fechadas, as pestanas negras como um pequeno écran
que a protegiam.
Queria chamá-la, mas não tinha
coragem, julgava que dormia. Ela guardara o mesmo ar fresco e franco que
o encantara. Olhou com ternura os cabelos negros e lisos puxados para o lado.
Como quando a conhecera em Lisboa.
“Ó meu anjo, por que não abres os olhos?! Deixas-me tão sozinho...”
Ela
sentia o olhar dele e não olhava. Mais valia deixá-los falar.
Lembrava-se
de uma amiga que lhe dissera um dia:
“Há
pessoas que só olham quando sabem que os outros não estão a olhar para elas, e
então espreitam-nos, furtivamente, a
medo... Têm medo dos outros? Tu não, tu não tens medo dos outros. É como se nada
te pudesse ferir.”
Seria verdade que não tinha medo de ser magoada? Seria apenas indiferença?
De facto, tanto medo tinham as pessoas umas das outras. Não, ela não tinha medo!
Simberg, O Anjo ferido
Pensou
que queria estar um momento sozinha consigo.
Hoje pareceu-me mais que um policial.
ResponderEliminarFala de sentimentos. Das pessoas.
Eu gostei!
As pinturas também são bonitas.
Um beijinho grande
Obrigada, minha leitora fiel! Beijinhos
EliminarGosto muito da maneira que tens de observar as pessoas, como sabes. A Isabel tem razão, pessoalmente acho que não é o género policial onde tu mostras as tuas habilidades literárias, sinto que podias escrever algo muito intenso, mas que talvez te falta coragem.
ResponderEliminarUm beijinho, vou tentar ter tempo esta manhã para ti, mas o relógio já correu demasiado à pressa, para variar...
Talvez tenhas razão, Maria... Vou escrever sobre o Ratinho...
ResponderEliminarÉ uma ideia genial!
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