sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

António Nobre e o nosso mar

“Georges! anda ver meu país de Marinheiros,
O meu país das naus, de esquadras e de frotas!"



O grande poeta António Nobre (1867-1900) nasceu no Porto, matriculando-se em 1888 no curso de Direito na Universidade de Coimbra.
Como os estudos lhe corressem mal, partiu para Paris onde frequentou a Escola Livre de Ciências Políticas, licenciando-se em Ciências Jurídicas.
De regresso a Portugal, tenta entrar na carreira diplomática, mas a tuberculose impede-o. Doente, ocupa o resto dos seus dias em viagens a procurar remédio para o seu mal, da Suíça à Madeira.
Faleceu ainda muito novo na Foz do Douro. Obras poéticas: (publicada em Paris em 1892), Despedidas (1902) e Primeiros Versos (1921), publicados póstumos.
(wikipedia)

Deixo-vos um dos poemas mais belos do poeta, uma espécie de hino de amor à sua terra, ao mar que conhecia e amava, aos pescadores que arriscavam a vida nos barquinhos frágeis, sorrindo pela ingenuidade dos nomes que lhes punham, às rezas simples no meio do perigo, com a morte sempre à espreita:
"as lanchas vão saindo/ (Às vezes, sabe Deus, para não mais entrar)"
O deslumbramento cheio de ternura pela beleza da saída dos barcos para a pesca, pela cor do mar, as ondas:

"Que vista admirável! Que lindo! Que lindo!"

O seu desejo de partir com eles, de ir também nessa aventura. O barco Senhora Nagonia atrai-o:
"Olha acolá!
Que linda vai com seu erro de ortografia...
Quem me dera ir lá!"
Partem nas ondas como se voassem, águias na coragem e na altura:
"Águias a voar, pelo mar dentro dos espaços
Parecem ermidas caiadas por fora..."
São pobres, necessitados, partem à procura do pão no mar, os filhos ainda pequenos vão com eles, toda uma saga infindável de vida, morte e esperança.
"Semos probes!"
Para trás, ficam as mulheres, as povoações, as casas brancas ou coloridas, as ruas com flores, pobres enfeites...
"Adeus! Adeus! Adeus!"


“Georges! anda ver meu país de Marinheiros,
O meu país das naus, de esquadras e de frotas!
Oh as lanchas dos poveiros
A saírem a barra, entre ondas de gaivotas!
Que estranho é!
Fincam o remo na água, até que o remo torça,
À espera de maré,
Que não tarda aí, avista-se lá fora!
E quando a onda vem, fincando-a com toda a forca,
Clamam todas à urra:
«Agora! agora! agora!»
E, a pouco e pouco, as lanchas vão saindo
(Às vezes, sabe Deus, para não mais entrar...)
Que vista admirável!
Que lindo! Que lindo!
Içam a vela, quando já têm mar:
Dá-lhes o Vento e todas, à porfia,
Lá vão soberbas, sob um céu sem manchas,
Rosário de velas, que o vento desfia,
A rezar, a rezar a Ladainha das Lanchas:

Senhora Nagonia!
Olha acolá!
Que linda vai com seu erro de ortografia...
Quem me dera ir lá!
Senhora Daguarda!


(Ao leme vai o Mestre Zé da Leonor)
Parece uma gaivota: aponta-lhe a espingarda
O caçador!


Senhora d'ajuda! Ora pro nobis!


Caluda! Semos probes!
Senhor dos ramos
Istrela do mar!
Cá bamos!


Parecem Nossa Senhora, a andar.


Senhora da Luz!


Parece o Farol...
Maim de Jesus!
É tal e qual ela, se lhe dá o sol!


Senhor dos Passos!
Sinhora da Ora!


Águias a voar, pelo mar dentro dos espaços
Parecem ermidas caiadas por fora...


Senhor dos Navegantes!
Senhor de Matosinhos!

Os mestres ainda são os mesmos dantes
- Lá vai o Bernardo da Silva do Mar,
A mailos quatro filhinhos,
Vasco da Gama, que andam a ensaiar...


Senhora dos aflitos!
Mártir São Sebastião!
Ouvi os nossos gritos!
Deus nos leve pela mão!

Bamos em paz!
O lanchas, Deus vos leve pela mão!
Ide em paz!

Ainda lá vejo o Zé da Clara,
os Remelgados, O Jeques, o Pardal,
na Nam te perdes,
E das vagas, aos ritmos cadenciados,
As lanchas vão traçando, à flor das águas verdes,
«As armas e os varões assinalados...»
Lá sai a derradeira!
Ainda agarra as que vão na dianteira,..
Como ela corre! com que força o Vento a impele:

Bamos com Deus!

Lanchas, ide com Deus! ide e voltai com Ele
Por esse mar de Cristo...
Adeus! adeus! adeus!



3 comentários:

  1. Que bonita homenagem com palavras e imagens!
    Beijinho!

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  2. O Nobre, o Purinho, é a alma da pátria!

    Só Camões e Camilo,

    cada um a seu modo,

    lhe fazem companhia!

    Que bom, vê-lo lembrado!

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  3. Este mar e este país do Nobre, nosso, são lindos. E a forma de os cantar mais bonita ainda!
    Beijinhos
    Helena

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