No Verão, abriam-se as portas do Cine-Parque, um espaço enorme junto do edifício da Fábrica Real, criada pelo Marquês de Pombal, edifício lindo hoje restaurado e sede da Câmara Municipal.
Havia filas de cadeiras de braços, de lona, cadeiras de madeira nos lugares mais económicos.
E, mesmo atrás de tudo, havia as mesas redondas e as cadeiras de ferro, pintadas de branco. Ao lado, ficava o buffet de onde o empregado nos trazia, numa bandeja de metal, pirolitos, laranjadas e às vezes tremoços e amendoins.
Claro que quando digo “nos” era porque este era o nosso lugar preferido.
Pouco antes do fim, ouvíamos ranger as portadas de madeira que fechavam o tal buffet.
Confesso que às vezes sentia uma certa angústia porque sabia que o filme ia acabar...
As noites eram frescas muitas vezes e quando saíamos, perto da meia-noite, arrepiava-me e vestia então o casaquinho de malha que, desde o princípio, a minha mãe me recomendara que pusesse.
O cinema ficava muito perto da minha casa e, assim, quando não ia ao cinema, podia ficar a sonhar na minha alta janela, escutando as vozes dos actores, os ruídos da selva, os tiros e imaginando o que se passava no écran...
Como fui sempre uma maria-rapaz, preferia os filmes de aventuras, de espadachins, piratas, guerra, cowboys, tiros e murros, etc.
Preferia os policiais aos filmes cor de rosa e ao seu romantismo.
Poderia dizer hoje "estranhos gostos o da dolescência...", mas a verdade é que nem com o tempo a minha preferência mudou...No cinema, a minha actriz preferida era Yvonne de Carlo, a sedutora aventureira por terra e mares, em piratarias várias.
Um dia...
Brincávamos nos baixos da casa que deveria ser uma garagem, mas, como o meu pai nunca quis ter um carro, nem nunca aprendeu a guiar, estava ocupada para arrumações e para as brincadeiras.
Por vezes nos dias escaldantes do Verão, comia-se cá em baixo, numa mesa que a Florinda e a Rosalina traziam de outra sala.
Estava ali também a cadeira de praia onde o meu pai gostava de dormir a sesta, nos dias quentes, e havia umas cadeiras com fundo de palha onde nos sentávamos a ler.
Nessa manhã, andei a brincar “ao circo” e decidi pendurar uma corda da viga de uma antiga porta, com uma tábua equilibrada para me poder baloiçar à vontade, inclinando-me para trás, e mãos soltas da corda.
Tive azar, caí e abri um golpe na cabeça. As minhas irmãs assustaram-se, chamaram a minha mãe porque o sangue corria pelo pescoço e sujava-me a roupa.
O meu susto maior foi pensar que não podia ir ver o filme!
E lá fui assistir ao Ladrão de Bagdad!
Que importava o nome?
(1) Yvonne de Carlo, de seu verdadeiro nome: Margaret Yvonne Middleton, (Vancouver, Colúmbia Britânica), nasce em 1 de Setembro de 1922 — e norre em Los Angeles, em 8 de Janeiro de 2007).
Finalmente sei o nome da actriz que me fez sonhar muita vez durante a adolescência...
ResponderEliminarBeijo
Cine Parque, era eu menino, acabou na minha juventude!
ResponderEliminarGostava muito de conseguir ler o que está escrito, as letras estão minúsculas. sei que vai tentar.
Cumprimentos.
(helder)
Obrigado por me fazer recordar o Cine-Parque!É essa cidade que, aos poucos, vai desaparecendo... Em nome do progresso... Hoje até o Crisfal virou boite...
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